quarta-feira, 13 de abril de 2016

Alegria do Evangelho e alegria do amor

Juan Masiá Clavel* 
Durante estes anos de discernimento eclesial sobre a família nos Sínodos dos Bispos, comentei neste blog sobre as quatro classes de posturas entre os Padres Sinodais:
1ª)a tradicional intransigente;
2ª)a revolucionária;
3ª)a diplomática conciliadora e
4ª)a reformadora mediante o discernimento.

Por esta quarta via vemos caminhar, coerentemente, o bispo de Roma [papa].

Não à primeira via, imobilista; não à segunda, demolidora. O imobilismo das condenações inquisitoriais da Igreja e o radicalismo de manifestos progressistas são duas caras da mesma moeda dogmatizante (semelhante na política, extrema direita e extrema esquerda, que nem dialoga nem discerne).

Francisco diz não à terceira via. A quarta via não é um acordo compactuado, mas um consenso transformador e aberto. Não é um consenso diplomático (entre a direita eclesial mais conservadora e a esquerda mais radical). É antes, um consenso regenerador e refundacional, que possibilita o centro-direita e o centro-esquerda caminharem juntos pela quarta via de uma transformação mútua, para a meta mais distante no tempo de uma reforma criativa.

No documento pós-sinodal A Alegria do Amor [Amoris Laetitia], Francisco respeita as propostas do Sínodo, cujas citações literais ocupam mais de três quartos da presente exortação. Estas propostas sinodais se situam, frequentemente, naquilo que chamamos a terceira via [diplomática conciliadora], com fracas insinuações que convidam Francisco a explicitar sua quarta via.

Porém, tampouco, deixa de mencionar, como parte dos dados para o discernimento, inclusive algumas propostas que pareceriam provir das que chamamos primeira e segunda via. Sobre esta pluralidade de pareceres no Sínodo, diz Francisco, certamente com bom humor, que lhe sugere «um belo poliedro, composto de muitas preocupações legítimas e perguntas honestas e sinceras». Porém, não se limita a constatá-lo e citá-lo, mas diz que quer «acrescentar outras considerações que possam orientar a reflexão, o diálogo e a práxis pastoral».

Essas considerações que o papa acrescenta não as ouvimos pela primeira vez. Ele já as havia dito em sua exortação A Alegria do Evangelho (Evangelii gaudium), da qual cita muito especialmente nas notas de rodapé as passagens referentes à:
a)necessidade de descentralização na administração eclesiástica e no magistério eclesial ( n. 16 e 32);
b) necessidade de discernir as situações na hora de julgar e decidir em questões de ética, moral e pastoral (n. 35, 44-49);
c)necessidade de discernir os conflitos por meio do caminho do diálogo de transformação mútua (tanto em termos de política da cidadania na sociedade, como na pastoral do pluralismo na Igreja (n. 69, 117, 270ss; cf. 222ss: o tempo superior ao espaço).
 
JUAN MASIÁ CLAVEL
Teólogo Moral Jesuíta
Para a hermenêutica [interpretação] de Amoris Laetitia me parece importantíssimo constatar as citações que Francisco faz de sua anterior exortação Evangelii gaudium [A alegria do Evangelho]. Nestas citações se vê claramente qual é seu próprio parecer sobre estes temas:
* o discernimento ético,
* o discernimento social e
* o discernimento eclesial.

Sobre este último – discernimento da Igreja – chama a atenção seu extremo cuidado em não impor sua opinião, mas abrir o caminho para que amadureça o juízo comunitário através da descentralização. O contrário seria dogmatizar a partir da esquerda como antes se dogmatizava a partir da direita, tal como vemos que fazem, frequentemente, alguns políticos.

Limito-me, hoje, a constatar este estilo de Francisco, coerentemente discernidor, e desenvolverei nas publicações seguintes sua aplicação aos diversos temas tratados em Amoris laetitia.

Traduzido do espanhol por Telmo José Amaral de Figueiredo.

* JUAN MASIÁ CLAVEL, nasceu em 1941, em Murcia, Espanha. É padre, teólogo e escritor jesuíta. A sua especialidade é moral sexual e bioética. Foi diretor do Departamento de Bioética no Instituto de Ciências da Vida da Universidade de Sofia, no Japão, e professor de Bioética e Antropologia da Faculdade de Teologia na mesma universidade. Ele foi professor convidado de Antropologia Filosófica 1988-1998 na Pontifícia Universidade de Comillas e dirigiu o Departamento de Bioética da mesma universidade de 2004 a 2006. Hoje é coadjutor na paróquia de Rokko, dos jesuítas, em Kobe (Japão) e professor de Bioética da Universidade Católica Santo Tomás, da diocese de Osaka. É também um colaborador em Tóquio da Comissão Católica de Justiça e Paz e da seção japonesa da Conferência Mundial das Religiões para a Paz.
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Fonte: Religión Digital – Vivir y pensar en la frontera – Juan Masiá – Segunda-feira, 11 de abril de 2016 – 06h03 – Internet: clique aqui.

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