Escritor israelense Amos Oz que lanca o livro 'Mais de Uma Luz' posa na Fundacao Ema Klabin
Foto: Daniel Teixeira/Estadão
Escritor israelense esteve no Brasil para lançar seu novo livro 'Mais de Uma Luz'
O escritor israelense Amós Oz acredita no poder da palavra – não
apenas pelo dever de ofício, mas principalmente por ter nisso a
principal arma disponível pelo seu povo em muitos anos de luta. Ele
fundou o movimento Paz Agora, mas, antes de se definir como um
pacifista, prefere ser chamado de “peacenick”: “o pacifista acredita que
a guerra é o pior dos males, e que deve ser evitada a qualquer custo.
Já o peacenick sustenta que o pior dos males é a agressão, e que, por
vezes, ela tem que ser repelida pela força”, sustenta. São argumentos
como esse que inspiram os três ensaios contidos em Mais de Uma Luz, lançado agora pela Companhia das Letras.
Dos textos, o mais impactante é justamente o primeiro, Caro Fanático,
em que Oz (que significa “coragem” em hebraico) detalha a perigosa
proliferação dos fanáticos pelos países, lembrando que o simples fato de
alguém impor uma ideia a outro, por mais inocente que seja, já é um ato
perigoso. “Um fanático é um ponto de exclamação ambulante que não
escuta, só fala. Um ser humano desesperado e mais interessado em você do
que nele, porque não tem vida própria. A síndrome deste início de
século não é o choque entre muçulmanos e cristãos, Ocidente e Oriente,
Europa e mundo árabe, mas, sim, entre fanáticos e nós. E eles estão em
todos os lugares e em todas as culturas. Vejo isso no dia a dia, quando
uma pessoa quer mudar a outra ‘para o bem dela’”, escreve.
Em junho, Oz esteve em
São Paulo, onde participou do projeto Fronteiras do Pensamento. Durante
sua passagem, conversou com o Aliás na Fundação Ema Klabin, local
escolhido por ele, que queria conhecer o belo acervo montado pela
empresária e mecenas, morta em 1994. A seguir, os principais trechos da
conversa.
Qual é o trabalho de pensar o mundo, como o senhor costuma fazer em seus artigos?
Não sou especialista em nada – talvez, um especialista em
especialistas. Mas observo com cuidado o que acontece, a ponto de
preservar minha independência de pensamento. Talvez meu segredo seja o
de olhar mais de um lado de cada problema. Sou cético, mas não
pessimista. Eu me preocupo muito com a condição humana em geral.
Por que o mundo está cada vez mais complicado?
Quanto mais o mundo se complica, mais as pessoas se agarram a respostas
simples. Uma espécie de slogans, algo que explique tudo de forma
simplista: “isso é provocado por causa do sionismo, da globalização, da
esquerda, dos patrões.” Todos têm uma resposta direta e definitiva para o
que acontece com o fanatismo. A essência do fanatismo está baseado em
respostas rápidas. Muitas vezes, o diagnóstico para problemas do Oriente
Médio pode não funcionar para o Brasil, da mesma forma que a medicina
que é útil na África seja útil também na Palestina, e assim por diante.
É, como o senhor afirma em seu livro, o eterno confronto entre o certo e o certo.
Exato, todos têm razão. Isso explica, de certo modo, o conflito entre
Israel e Palestina: o combate entre o certo e o certo. Nos últimos anos,
tem sido o embate entre injustiçados. Essa é a definição de nossa
tragédia. Nos filmes de faroeste de Hollywood, há sempre uma divisão
clara entre os mocinhos e os vilões e algumas pessoas, incluindo
intelectuais, seguem o mesmo raciocínio ao apontar, no conflito entre
israelenses e palestinos, quem é o vilão e quem é o protagonista. Como
se isso fosse fácil, como se mundo se parecesse com um filme
hollywoodiano. Não é assim. Conflitos anteriores eram analisados pelo
relativismo, ou seja, eram até fáceis de se entender, como a Guerra do
Vietnã, o apartheid, colonialismo, mas o mesmo não acontece com o
conflito entre palestinos e israelenses.
O senhor acredita no poder da palavra?
Como não acreditar se são apenas de palavras que disponho? Também era o
que tiveram os judeus durante centenas de anos, época em que viveram sem
armas, sem exército, sem sua terra, apenas com a força de sua palavra.
Acredito que as palavras podem ajudar, mas não acredito em fórmulas para
redenção. Não acredito em salvação, mas em soluções pensadas.
Muitos dos líderes mundiais de hoje são contestados
mundialmente, como Trump e Putin, para ficar em apenas dois. O que o
senhor diz disso?
Sim, entendo o que você quer dizer,
mas lembro que nasci em uma época em que o mundo era controlado por
Hitler, Mussolini, Franco, Stalin. Impossível de se esquecer. Há
diferentes graus de maldade. E um dos piores erros morais é colocar
todos os tipos de maldade num mesmo cesto. É o que fazem intelectuais
preguiçosos, para quem capitalismo, sexismo, sionismo, globalização,
todos estão também num mesmo cesto. Há diferentes variações, é
necessário que isso seja notado. O que me preocupa é que isso também
norteia muitas pessoas em uma eleição, pois distinguem apenas o melhor e
o pior candidato.
E o que dizer do governo de Barack Obama?
Bem, ele causou menos estragos que seus antecessores. Obama colocou a
economia dos EUA e mesmo a do mundo em um certo controle – lutando
contra a crise criada por outros governantes. Também evitou promover
guerras, ao ponto que, durante seu governo, houve uma expressiva queda
no número de covas sendo abertas para soldados ante a administração
Clinton ou Bush. Seu sistema de saúde era imperfeito, mas ainda assim
uma opção melhor que a disponível para os americanos. Enfim, ainda que
marcada por vários defeitos, acredito que Obama foi um dos melhores
administradores do mundo nos últimos anos.
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Reportagem por Ubiratan Brasil,
O Estado de S. Paulo 08 Julho 2017
Fonte: http://alias.estadao.com.br/noticias/geral,fanatismo-esta-baseado-em-respostas-rapidas-analisa-amos-oz,70001881018
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