Cemitério de animais de Casa Rosa (Itália). ALBERTO PIZZOLI/AFP/Getty Images
Às vezes, o impacto provocado pela morte de um animal é comparável ao luto por um ser humano
Quando Ada Menéndez perdeu seu gato
Rodolfo depois de uma longa convalescença, tomou a decisão de procurar
ajuda psicológica para lidar com a ausência do animal de estimação com o
qual viveu por quase 12 anos. Depois de se despedir dele e de guardar
suas cinzas, Menéndez foi ao Espacio Ítaca, um centro espanhol onde psicólogos e terapeutas ajudam aqueles que acabaram de perder um animal de estimação.
“Eu fiquei muito mal porque o Rodolfo ficou comigo durante toda a vida
dele, vivemos só nós dois durante muito tempo e tínhamos uma relação
muito especial”, conta Menéndez ao Verne. “Para mim, não era apenas um
animal de estimação, era parte da minha família”.
Durante
cerca de quatro meses, Menéndez fez terapia duas vezes por semana até
que conseguiu integrar a morte do seu gato. “Fiquei deprimida,
muito afetada, e como é algo que muitas pessoas não entendem, não se
pode falar disso no trabalho ou com os amigos”, acrescenta Menéndez. “Me
ajudou muito falar disso com a psicóloga, porque fora dali não havia
lugar para desabafar e chorar”.
Às vezes, o impacto provocado pela a morte de um animal é
comparável ao processo de luto que se vive depois de perder um amigo ou
parente. Em 1988, Sandra B. Barker, atual diretora do Center for Human-Animal Interaction
da Faculdade de Medicina da Virginia, realizou um estudo que mostrou
como algumas pessoas percebiam a relação com seu animal de estimação de
da maneira mais próxima do que o vínculo com seus parentes. Os
indivíduos tinham de representar a família
por símbolos e muitos deles colocaram o cachorro mais perto deles.
“Identificamos que não havia diferença entre a proximidade com a família
e com um animal de estimação”, explica Barker ao EL PAÍS por telefone.
Uma década depois, em 1998, outro estudo revelou que a teoria do apego
desenvolvida por John Bowlby (que define o fenômeno pelo qual os bebês
estabelecem um vínculo com seu cuidador como instinto de sobrevivência)
podia ser aplicada à relação animal de estimação-ser humano.
“Quando você introduz um animal em casa e convive com ele
muitas horas por dia, ele faz parte de sua rotina e do seu dia a dia”,
diz Sandra Sánchez, a psicóloga que tratou Menéndez. “As famílias
mudaram e agora podemos ver vários modelos em que o animal se integra
como mais um membro”, afirma.
“Nos ocupamos principalmente de casos de cães e gatos.
Mortes inesperadas e casos de mortes de longa duração e doenças
degenerativas. Também somos procurados por muita gente que precisa tomar
a decisão de por um fim à vida do seu animal de estimação”, explica
sobre sua experiência. “Nas sessões, trabalhamos a canalização
emocional, técnicas de relaxamento... Em alguns casos, depois de poucas
sessões as pessoas já conseguem seguir seu rumo, mas outras levam mais
tempo. Há pessoas que precisam talvez de um ano”.
Um luto menos aceito socialmente
Segundo um estudo realizado pelo Canadian Veterinary Journal,
50% das pessoas que perderam seu animal de estimação dizem que a
sociedade não avalia que essa morte seja digna de um processo de luto.
“Nem todo mundo tem um animal de estimação e isso dificulta que as
pessoas tenham empatia em relação a esses casos, e também porque se
subestima o vínculo emocional que a pessoa pode ter com o animal”,
acrescenta Sánchez.
A veterinária Mercedes González tem a mesma visão. “Como não
é socialmente aceito que uma pessoa possa estar triste pela perda do
cachorro, não se passa por todas as frases de luto e aí pode aparecer o
problema. Por um lado, porque as pessoas ao seu redor não entendem e
porque você mesmo não se permite estar triste”.
O que fazer e o que não fazer quando seu animal de estimação morre
Normalizar a tristeza e se permitir sofrer pela perda é um
dos principais conselhos de Moira Anderson Allen, educadora
especializada nesse tipo de luto. “Algumas pessoas acham útil expressar
seus sentimentos e memórias através de poemas, histórias ou cartas para o
animal de estimação”, diz Anderson Allen em seu site. “Outra estratégia
é reorganizar sua agenda para preencher com outras atividades os
momentos do dia que você costumava passar com o animal de estimação”,
acrescenta a educadora.
“As formas de apoio variam muito, dependendo da pessoa”, diz
Sandra Barker. “Um dos nossos pacientes tinha de aprovar a eutanásia do
cachorro, mas antes de fazer isso, como último desejo, o levou para a
praia e para comer hambúrgueres, passatempos favoritos do animal”.
Uma reação comum é adotar outro animal logo após a perda. No
entanto, introduzir um novo membro animal na família só costuma ser
aconselhável uma vez que o luto tenha sido superado. “Tivemos pessoas
que já estavam pensando adotar outro animal, ou que queriam colocar o
mesmo nome, e dizemos que isso é muito negativo e que não devem
fazê-lo”, diz Sánchez.
“Não se deve buscar uma substituição para evitar a dor”,
acrescenta Barker. “Vimos pessoas que acabaram decepcionadas porque o
novo animal não era da mesma raça ou porque se comportava como o animal
de estimação anterior”.
Outra coisa fundamental é usar a terminologia adequada. “Nós
também dizemos às pessoas para tirar a palavra sacrifício do
vocabulário, porque tem uma conotação muito negativa”, diz Sánchez. “Com
um ser humano nunca chamaríamos dessa forma. É preferível dizer ‘morte
digna’ ou eutanásia. Com essa terminologia o luto pode melhorar”.
A psicóloga Sandra Sánchez compartilha um conselho: “Quando
um paciente me diz que nunca vai superar a perda, eu sempre conto essa
história: ‘Imagine que eu disse que esse calor é insuportável, que o
inverno nunca voltará’. Certamente ele responderia que é absurdo dizer
algo assim, que o inverno sempre chega’. Com o luto é a mesma coisa. É
preciso de tempo”.
Como ajudar as crianças a superar a perda
“Os menores não entendem o conceito de morte”, diz Barker,
“e muitos podem se sentir culpados porque pensam que não cuidaram
suficientemente do animal”. Nos casos com crianças, os especialistas
recomendam evitar eufemismos. “Se você disser a eles que o cachorro
morreu durante o sono, talvez possam ter medo na hora de deitar”,
acrescenta Barker. A especialista norte-americana encoraja as famílias a
envolver as crianças nas homenagens ao animal de estimação, porque “as
crianças são muito boas fazendo cerimônias e desenhos”.
A veterinária Mercedes González ressalta que a atitude em
relação às crianças deve ser a mesma que com a perda de um parente
próximo. “Você tem de explicar a elas o que aconteceu e às vezes isso
não é feito da mesma maneira porque não se dá importância”, explica. “Os
pais talvez não tivessem muito apreço pelo hamster, por exemplo, mas é
preciso levar em conta que a criança pode ter criado um vínculo mais
forte com o animal e pode ser mais doloroso para ela”. Em primeiro
lugar, paciência.
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Reportagem por Mónica Parga
Fonte: https://brasil.elpais.com/brasil/2017/07/04/ciencia/1499163248_507694.html
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