sexta-feira, 23 de junho de 2017

A linguagem secreta da moda, símbolo de fragilidade

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As modas têm algo estúpido e devastador. Se você perguntar a um jovem porque usa seu cabelo raspado no lado e espetado sobre a cabeça como uma cestinha, ele vai dizer que todos usam assim. Mas você sabia que essa moda da raspagem lateral quer expressar uma raiva militaresca e foi lançada por Kim Jong, o pequeno gordo cruel ditador da Coreia do Norte? A resposta é um 'dar de ombros' de 'tanto faz como fez'.

Também causam assombro aqueles que compram, por um alto preço, calças jeans cheias de rasgos que imitam uma falsa pobreza que agrada principalmente aqueles que não são pobres. E o que dizer da moda de sapatos de bico fino, (por nossa sorte, já passada) que causa deformações aos pés? O mito do pé pequeno nasceu na China, do desejo de mostrar que uma menina nobre e rica não precisava caminhar. Andar a pé era coisa de camponesa, por isso deformavam seus pés para torná-los inutilizáveis. Mesmo os sapatos de ponta fina e saltos altos de hoje são prejudiciais ao pé de uma mulher que quer caminhar, correr, subir e descer escadas.

Mas se a moda exige...

E o que dizer sobre a barba comprida, muitas vezes grisalha, que os adultos, especialmente os intelectuais, carregam com desenvoltura? Foram os fanáticos religiosos que começaram com isso. Para eles, a barba é um símbolo de austeridade e rigor moral. O paradoxo é que, mesmo aqueles que se declaram laicos e combatem os fanatismos, deixam crescer a barba.

É a moda, não há nada a fazer, cara amiga.

Quem é que sabe que as tatuagem nasceram nas prisões, como uma linguagem da pele aprisionada? Foram os analfabetos, os pobres escravos que não sabiam ler nem escrever que começaram a falar com as imagens de seu corpo. A tatuagem mais repetida era a da borboleta (lembram-se de Papillon?) ou da gaivota, que expressava o desejo de atravessar as grades e voar no céu aberto. Mesmo as figuras femininas ou os barcos a velas enfunadas falavam da liberdade perdida. O corpo tornava-se o papel em que se escreviam as mensagens de um recluso infeliz e sozinho. Como é que, hoje, meninos e meninas, que nunca estiveram em uma prisão, deixam espetar agulhas em sua pele para imitar, sem saber, aqueles desesperados segregados nas prisões de séculos passados?

A moda alimenta-se de linguagens secretas e memórias perdidas, e conta uma fragilidade sem remédio. A arrogância está em repetir um rito sem saber a sua origem, por cega alusão a um sofrimento que não é próprio, como o crucifixo brilhante no pescoço de uma mulher, como a argola presa a uma pálpebra ou ao lábio como lembrança de uma distante escravidão.
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O comentário é de Dacia Maraini, escritora e poetisa italiana, autora do roteiro, entre outros, do filme Storia di Piera, publicado por Corriere della Sera, 20-06-2017. A tradução é de Luisa Rabolini. 
Fonte: http://www.ihu.unisinos.br/568948-a-linguagem-secreta-simbolo-de-fragilidade 23/06/2017

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