Manifestantes anti-vacina se reúnem em Nova York, em 2021, para protestar contra o 'novo normal' da pandemia ' Foto: David 'Dee' Delgado/Reuters
O século 21 não trouxe apenas tecnologia: nos trouxe crises políticas, uma pandemia e guerras parecidas com as do século passado
Até pouco tempo atrás, 2016 era o candidato mais claro: ano do Brexit (em 23 de junho); e a eleição de Donald Trump (em 8 de novembro) foi o ponto de partida de uma nova onda de populismo, polarização e pós-verdade que ameaça acabar com a democracia em muitos países.
Mas também ocupa um lugar importante na lista de datas históricas aquele fatídico 13 de março de 2020, no qual o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA declarou oficialmente que estamos sendo atacados pela covid. Será esta pandemia a precursora de muitas outras? Será o começo de um planeta permanentemente sacudido por algum tipo de pandemia? Pode ser.
Outra data que simboliza as mudanças revolucionárias que se apresentam é do Prêmio Nobel em química de 2020 outorgado a Emmanuelle Charpentier e Jennifer Doudna por elas terem desenvolvido a tecnologia de modificação de genoma chamada CRISPR-Cas9.
A manipulação dos nossos genes utilizando esta nova técnica não apenas promete enormes progressos no sentido da cura de doenças até agora letais, mas também cria graves ameaças. O CRISPR em mãos erradas é uma ameaça para a humanidade.
Assim como o desenvolvimento e disseminação das novas técnicas de inteligência artificial. Em 30 de novembro de 2022, a empresa OpenAI lançou seu ChatGPT, uma tecnologia que finalmente passa no Teste de Turing: um robô que pronuncia o idioma natural com tal fluidez que suas respostas são indistinguíveis das de um ser humano. É isso que o fundador da computação moderna, Alan Turing, definiu como “inteligência artificial em um longínquo ensaio publicado em 1950.
A partir de 2022, essa elucubração amalucada se torna uma realidade inelutável. Porque o ChatGPT não é apenas mais um software ou plataforma como os que nos anunciam regularmente os magos das indústrias. A inteligência artificial surtirá um impacto transformador sobre as indústrias do conhecimento equiparável ao da introdução das máquinas durante a Revolução Industrial. Ou talvez maior.
Mas o Século 21 não trouxe somente mudanças tecnológicas importantes, nos trouxe também guerras parecidas com as do século passado — ou do anterior. Em 24 de fevereiro de 2022, Vladimir Putin ordenou que seus generais invadissem a Ucrânia.
A essa surpresa se seguiram outras: em vez de durar poucos dias, a guerra de Putin está prestes a completar um ano; a Europa descobre que é capaz de atuar unificadamente e que essa capacidade recém-descoberta faz com que, em vez de se limitar a discursos e exortações, ela possa atuar como potência militar de primeira ordem.
Os ferozes ataques cibernéticos que se esperavam da Rússia não se materializaram nem foram neutralizados. E a inépcia dos militares russos só é superada pela selvageria medieval com a qual eles agem. Os ataques cotidianos contra a população civil da Ucrânia e a infraestrutura do país parecem ser a única resposta do Kremlin.
Isso faz com que, em setembro de 2022, Putin tenha voltado a introduzir uma opção que se pensava superada: o uso de armas nucleares. “Se a integridade territorial do nosso país for ameaçada, sem dúvida usaremos todos os meios disponíveis para proteger a Rússia e o nosso povo”, disse o líder russo. “Isso é o que deve dizer todo líder que veja a soberania de seu país em perigo. Aqui, o detalhe importante é que o líder que diz o óbvio tem à sua disposição o maior arsenal do mundo. “Isto não é um blefe”, alertou Putin. Claramente o que está em jogo na Ucrânia não afeta somente esse país, mas também possui ramificações geopolíticas de todo tipo, muitas delas inesperadas.
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Outra mudança importante na política mundial ocorreu em 21 de setembro, quando Xi Jinping, o líder chinês, conseguiu romper com a norma que o obrigaria a deixar o poder ao término de seu mandato, como haviam feito seus antecessores desde Mao. Nesse dia de setembro, Xi foi eleito presidente da China e secretário-geral do Partido Comunista pela terceira vez, superando todos os obstáculos para se tornar o primeiro ditador vitalício da China desde a morte de Mao.
Finalmente, no que já sucedeu deste século, a mudança climática se manifestou ferozmente. A frequência e a intensidade dos fenômenos, os danos materiais e o massivo sofrimento humano que ocorreram este ano em razão da mudança climática estão alterando nosso planeta profundamente e rapidamente. Não há uma data simbólica para isso: as catástrofes climáticas se tornaram normais. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL
* É escritor venezuelano e membro do Carnegie Endowmen
Fonte: https://www.estadao.com.br/internacional/chatgpt-brexit-donald-trump-pandemia-guerra-na-ucrania-qual-sera-o-marco-do-seculo-21/
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