quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

City of Fears, City of Hope

 Por Ana Ruepp*

  

“Cities have become dumping grounds for globally begotten problems.”
(Bauman 2003, 19)


No texto “City of Fears, City of Hope”, Zygmunt Bauman escreve que se vive hoje em permanente estado de revolução. O modo de vida urbano define-se através de uma constante mudança condensada e acelerada. 


Para Bauman, a cidade é, por isso, sinónimo de contínua transformação. Na sua opinião é também o lugar, por excelência, onde estranhos se encontram. 


A cidade vive da diferença e da complexidade. Os estranhos permanecem próximos uns dos outros e interagem (às vezes uma vida inteira) sem deixar de serem estranhos. Bauman explica que a densidade de ocupação do espaço resulta na concentração de problemas, necessidades, oportunidades e desafios, que uma pessoa só consegue entender se viver numa cidade. A constante necessidade de enfrentar problemas e fazer perguntas apresenta-se como o grande desafio urbano e pode assim elevar a inventividade da existência a níveis sem precedentes. (Bauman 2003, 6)


A vida na cidade, inevitavelmente, chama para si recém-chegados ou estranhos. Para Bauman, são os recém-chegados que trazem um novo olhar sobre as coisas e que desenvolvem novas formas de resolver problemas. Para aqueles que acabam de chegar tudo parece bizarro, nada é normal, nem dado como certo. Deste modo, para os enraizados e bem estabelecidos, os estranhos podem representar o desconhecido e a ameaça - são muitas vezes, vistos como os inimigos lógicos que põem em causa a tranquilidade e o orgulho local. Mas, uma cidade sem estranhos é um lugar sem vida. Bauman afirma que uma cidade será mais exuberante, pródiga e abundante, quanto mais os seus modos e os seus meios forem desafiados e questionados.


A cidade vive sempre de tensões e de equilíbrios constantes. A flutuabilidade intrínseca, a criatividade inerente, a proximidade, a densidade e a incerteza permanente da vida urbana, surge exatamente do relacionamento sempre incompleto e em constante agitação entre os vários espaços, organizações e indivíduos.


“Through their modern history cities have been the sites in which the settlement between contradictory interests, ambitions and forces was intermittently fought, negotiated, undermined, broken, revoked, re-fought, re-negotiated, challenged, found and lost, buried and ressurected.” (Bauman 2003, 14)


É verdade que são as forças contraditórias, as incompatibilidades mútuas e as tendências que se contradizem, que dão forma a uma cidade. Porém, segundo Bauman, o mundo atual está dividido entre o poder global e a pessoa local. O ser global está constantemente ligado a uma vasta rede de troca, de mensagens e de experiências privilegiadas e extraterritoriais que abrangem o mundo inteiro. O ser local depende do lugar onde mora, está ligado a uma rede segmentada e limitado à sua identidade (muitas vezes segregada) como garantia de defesa dos seus interesses. 


A imagem, que emerge desta descrição de Bauman, é a de dois mundos de vida segregados e separados, em que um domina o outro. Apenas o ser local é territorialmente circunscrito e a sua existência pode ser compreendida numa rede de noções ortodoxas geográficas, mundanas e realistas. Aqueles que vivem no mundo global não precisam necessariamente de pertencer a um lugar e a fluidez da sua presença desliga os seus interesses e as suas preocupações dos problemas de qualquer cidade. Por isso, para Bauman, o estado da liquidez da modernidade mede-se pelo aumento do intervalo que separa estes dois mundos. E no mundo globalizado atual as ações concretas parecem ser só locais: “Only in ‘local matters’ our action or inaction may ‘make a difference’; as for other, admittedly ‘supra-local’ affairs - there is (or so we are repeatedly told by our political lerdes and all other ‘people in the know’) ‘no alternative’.” (Bauman 2003, 18-19)


Sendo assim, na opinião Bauman, as cidades de hoje são os depósitos dos problemas gerados na escala mundial e infelizmente são as pessoas locais de qualquer cidade que têm a tarefa impossível de encontrar as soluções para todas as contradições globais existentes.

* Ana Oliveira Martins Ruepp. Architect / Artist. Instituto Superior TécnicoUniversity of the Arts London. London, England, United Kingdom.

Fonte:  https://e-cultura.blogs.sapo.pt/a-forca-do-ato-criador-1422027



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