Sim! Conheça essa experiência...
Claudia Costin*
Condições de sucesso escolar para alunos em situação
vulnerável
podem ser melhoradas
Num
livro publicado há poucos meses, Helping
Children Succeed, Paul Tough
observa, com tristeza, que o déficit de
aprendizagem entre alunos de 8.º ano, provenientes de diferentes estratos de
renda, vem crescendo nos Estados Unidos, ao invés de diminuir, a despeito
dos esforços para mudar a situação. O país tem apresentado não apenas
desempenho incompatível com seu grau de desenvolvimento, como tampouco
conseguiu evitar que os mais pobres tenham um ensino ainda mais precário.
O mesmo pode ser dito em
relação ao Brasil. Celebramos importantes avanços no Pisa de
2012, mas ainda estamos em posição
inaceitável entre as 65 economias que participam desse teste internacional de
qualidade da educação. Mais ainda, a despeito de sermos o país que mais
avançou em Matemática, de 2003 para
2012, ainda temos 67,1% dos alunos com
baixo desempenho na área. O tema de maior dificuldade para os alunos brasileiros,
em que tivemos o menor desempenho, foi o de “formular situações matematicamente”, competência relevante para
diversas profissões e áreas de pesquisa. Só
1,1% dos alunos apresentam desempenho elevado. Mas o que se mostra
particularmente cruel para os que acreditam que educação é o caminho para gerar
oportunidades para todos é a profunda
desigualdade educacional do nosso país, tanto no acesso e na conclusão de
cada etapa de escolaridade quanto no desempenho escolar ou na aprendizagem.
Estive
recentemente em Xangai, cidade chinesa,
com mais de 23 milhões de habitantes,
que obteve o primeiro lugar entre as
economias que participaram do Pisa. Fui lançar um estudo do Banco Mundial
sobre as razões do excepcional desempenho da cidade. Em solução de problemas, por exemplo, Xangai ficou em 6.º lugar no Pisa
2012 entre 44 países ou sistemas regionais – o Brasil ficou na 38.ª posição. Embora conte com número importante
de alunos em situação de pobreza, estudantes
que se encontram entre os 10% mais pobres de Xangai são
tão bons em Matemática quanto os 20% de adolescentes
mais ricos do Reino Unido e dos Estados Unidos. Ou seja: Xangai não
tem apenas o melhor desempenho em Matemática e um dos melhores em leitura e
Ciências; é também um dos mais igualitários, apesar de contar com uma proporção
elevada de migrantes internos.
O que fazem de excepcional
para chegar lá?
a) Os professores são
preparados para uma profissão e o currículo
na universidade enfatiza o conhecimento do conteúdo a ser ensinado e a prática
em sala de aula, incluindo a didática
específica daquela área.
b) Além disso, a universidade reúne-se com os professores
da escola para analisar, com eles, problemas de aprendizagem que lá tenham
emergido e, juntos, constroem soluções possíveis com os recursos disponíveis.
c) Outro ponto importante é
que os professores têm seu tempo de
atividades extraclasse dentro da escola (e não fora dela, como em muitas
escolas brasileiras), corrigindo tarefas
escolares e preparando planos de aula minuciosos, com base no currículo e
em colaboração com os colegas.
d) Observam, também, as aulas dos colegas e juntos discutem o que pode ser
aperfeiçoado.
Não
escrevo isso para que pensemos em copiar o modelo dessa megacidade chinesa, mas
para que possamos perceber que é possível ter qualidade para todos. A escolaridade dos pais e a situação
socioeconômica da família têm forte papel no desempenho escolar dos alunos.
Afinal, interpretação de textos, por exemplo, depende muito do repertório
cultural adquirido pelo aluno, e é sabido que importante parte dele vem da
família. Mas a escola pode, deve e tem
conseguido, em muitos casos, garantir o direito de aprender de crianças mesmo
vindas de famílias de reduzida escolaridade ou situação socioeconômica adversa.
Xangai ilustra isso, várias escolas no Brasil também o fazem, como mostra o
interessante estudo da Fundação Lemann
Excelência com Equidade – 250 escolas
públicas com alunos de nível socioeconômico situado entre os 25% mais baixos da
região onde estavam localizadas, e com pelo menos 70% dos alunos com nível
adequado em Matemática e Língua Portuguesa na Prova Brasil e, no máximo, 5% de alunos no nível insuficiente,
evidenciaram que é possível aliar qualidade e equidade. Duas delas estão
localizadas no Rio de Janeiro, e tive a oportunidade de visitá-las. O que têm
em comum? Metas claras e uma equipe de
professores comprometidos com um ensino que assegure que todos aprendam.
Autora deste artigo |
Mas como garantir que o
exemplo dessas escolas seja estendido às demais no Brasil que concentram
crianças em situação de pobreza? As condições de sucesso escolar para alunos em
situação de vulnerabilidade podem ser melhoradas, e muito,
a) se houver uma política pública que assegure a atração e
retenção de bons professores e lhes dê material de apoio adequado,
b) conte com uma educação de qualidade e cuidados na
primeira infância.
c) Se investirmos mais em remunerar melhor o professor,
d) alocá-los numa única escola, com tempo para ali, colaborativamente, preparar suas aulas e
aprender com os colegas, ajudaria.
e) Se tornarmos a formação inicial do professor mais adequada
aos desafios da sala de aula, e não enfatizarmos apenas os fundamentos da
educação, também ajudaria.
f) Mas se pudermos, além
disso, reduzir o impacto das condicionantes socioeconômicas no desempenho
escolar do aluno, por meio de um investimento
forte e focado em educação infantil de qualidade e cuidados na primeira
infância, poderemos, aí, sim, combinar qualidade com equidade, como
preconiza o Objetivo do Desenvolvimento
Sustentável, recém-aprovado pela ONU, para a educação (ODS-4), a ser
atingido até 2030:
“Assegurar a
educação inclusiva, equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de
aprendizagem ao longo da vida para todos”.
Não
é muito difícil garantir educação de qualidade para poucos, mas o princípio da equidade demanda que isso
seja estendido a todos – daí o nosso grande desafio!
* CLAUDIA COSTIN é diretora global de educação do Banco
Mundial.
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