quarta-feira, 11 de março de 2020

Às portas da imortalidade

Juremir Machado da Silva*
 Resultado de imagem para imortalidade
 
Cientistas anunciam fim da morte


            Estou refazendo meus planos. Eu tinha calculado viver até por volta de 2050, encerrando meu ciclo terreno ou terrestre com 88 anos. Eis que chega a novidade: segundo dois pesquisadores, seremos imortais a partir de 2045. Preciso recalcular a minha aposentadoria complementar. A morte da morte, conforme os especialistas, só não será completa por três exceções: assassinatos, suicídios e acidentes. Será   que o INSS vai querer rever todas as aposentadorias exigindo mais tempo de trabalho dos imortais? Quanto tempo? Como fechar essa conta?
            Sempre que penso na imortalidade, especialmente na minha, não a do Grêmio, que chegará em boa hora, não consigo resolver o problema dos novos nascimentos: como manter uma taxa de natalidade razoável para a renovação da vida e dos vizinhos sem a desocupação do espaço pelos mortos? Em outras palavras, como acomodar todo mundo ao mesmo tempo? Não sei. Tenho a impressão de que os neoliberais recorrerão ao STF contra a imortalidade alegando que irá promover um inchaço do Estado. Pode-se, claro, olhar pelo lado positivo e pensar em quantos postos de trabalho serão criados no atendimento à milésima idade e depois.
            O leitor pode achar que estou brincando. Nada disso. A notícia sobre a imortalidade a partir de 2045 é de José Luís Cordeiro e David Wood no livro "A morte da morte: a possibilidade científica da imortalidade" (editora LVM). Haverá regra de transição para quem estiver pela hora da morte em 2044? Não seria justo morrer um mês antes da grande virada. A verdade é que a coisa está esquentando e vamos acabar vivendo muito mais, se não for para sempre. A questão é: para fazer o quê? Imagino o leitor pragmático dizendo na lata: não importa, primeiro a gente vira imortal, depois vemos o que fazer da vida.
            Tenho tanta coisa planejada que a imortalidade me daria tempo de realizar ao menos a metade do que pretendo fazer. Falando sério, como se dará o uso do tempo livre da imortalidade numa sociedade pós-trabalho? Haja Netflix e campeonatos de futebol. O trabalho, como se sabe, ou só não sabem os preguiçosos, é estruturante. Além de garantir, ou quase, os meios de subsistência, organiza a vida das pessoas com horários, obrigações, metas, uniformes, ideologias, festas de firma e outras modalidades de administração da mente vadia dos indivíduos. O trabalho não é apenas a venda de uma força produtiva, mas também um sistema de hierarquia social e de controle da energia coletiva.
            A morte também não deixa de ser estruturante. Durante muito tempo, as guerras promoviam as mortes necessárias para evitar desemprego. Era um sistema eficiente. De quebra, fornecia material para bons romances e filmes. Há todo um mercado em torno da morte. Se a imortalidade vier, e virá, talvez se faça acompanhar da possibilidade de fazer viagens a outros planetas habitados. Nunca mais fui o mesmo desde que soube disto: “cerca de uma a cada cinco estrelas da nossa galáxia contém um planeta rochoso com tamanho similar ao da Terra”. Temos cem bilhões de estrelas na galáxia. A imortalidade vem aí.
Espero que seja com alternância no poder.
----------
* Jornalista. Escritor. Prof. Universitário  Fonte: https://www.correiodopovo.com.br/blogs/juremirmachado/%C3%A0s-portas-da-imortalidade-1.403784 - 07/03/2020 - Imagem da Internet

Nenhum comentário:

Postar um comentário