segunda-feira, 21 de novembro de 2022

A depressão da Covid é real. Aqui está o que você precisa saber

Knvul Sheikh The New York Times

Jovem sentando no chão com cabeça nas mãos
Problemas de saúde mental parecem ser mais comuns em pessoas que contraíram Covid-19 - Adobe Stock

Risco de desenvolver sintomas de depressão permanece alto até um ano após a recuperação


A Organização Mundial da Saúde observou este ano que a ansiedade e a depressão aumentaram 25% em todo o mundo apenas no primeiro ano da pandemia de Covid-19. E os pesquisadores continuaram a encontrar mais evidências de que o coronavírus causou estragos em nossa saúde mental: em um estudo de 2021, mais da metade dos adultos americanos relataram sintomas de transtorno depressivo sério após a infecção por coronavírus. O risco de desenvolver esses sintomas –assim como outros distúrbios de saúde mental– permanece alto até um ano após a recuperação.

Não é de surpreender que a pandemia tenha tido um impacto tão grande. "É um evento sísmico", disse o doutor Ziyad Al-Aly, epidemiologista clínico da Universidade de Washington em St. Louis e chefe de pesquisa e desenvolvimento do Sistema de Saúde de Veteranos de St. Louis.

Preocupações com a saúde, luto pela perda de entes queridos, isolamento social e interrupção das atividades cotidianas foram uma receita para angústia, especialmente no início da pandemia. Mas, em comparação com aqueles que conseguiram evitar a infecção (mas também lidaram com os difíceis impactos da pandemia), as pessoas que contraíram Covid-19 parecem ser muito mais vulneráveis a uma série de problemas de saúde mental.

"Há algo no coronavírus que realmente afeta o cérebro", disse o doutor Al-Aly. "Algumas pessoas sofrem depressão, enquanto outras podem ter derrames, ansiedade, distúrbios de memória e distúrbios sensoriais." Outras, ainda, não têm qualquer condição neurológica ou psiquiátrica, disse ele.

Por que algumas pessoas ficam depressivas quando têm Covid?

Os cientistas ainda estão aprendendo exatamente como o coronavírus altera o cérebro, mas a pesquisa começa a destacar algumas explicações possíveis. Alguns estudos, por exemplo, mostraram que o sistema imunológico entra em ação acelerada quando certas pessoas adoecem. Elas podem acabar com inflamação em todo o corpo e até no cérebro. Há também algumas evidências de que as células endoteliais que revestem os vasos sanguíneos no cérebro são interrompidas durante um surto de Covid-19, o que pode inadvertidamente permitir a passagem de substâncias nocivas, afetando a função mental. E as células chamadas micróglias, que normalmente agem como guardiãs do cérebro, podem se tornar rebeldes em alguns pacientes, atacando neurônios e danificando sinapses, disse o doutor Al-Aly.

É possível que a Covid-19 até comprometa a diversidade de bactérias e micróbios no intestino. Uma vez que os micróbios no intestino demonstraram produzir neurotransmissores como serotonina e dopamina, que regulam o humor, essa mudança pode estar na origem de alguns problemas neuropsiquiátricos.

Quem está mais em risco?

Um dos maiores fatores de risco para desenvolver depressão após a Covid-19 –ou após qualquer doença grave– é ter um distúrbio de saúde mental diagnosticado antes de adoecer. As pessoas que tiveram sintomas graves de Covid-19 e tiveram que ficar hospitalizadas durante a doença também tinham maiores chances de depressão, disse Megan Hosey, psicóloga de reabilitação que trabalha com pacientes de UTI no Hospital Johns Hopkins.

De acordo com estimativas da Organização Mundial de Saúde, os jovens correm um risco desproporcional de comportamentos suicidas e de autoagressão após a Covid. As mulheres são mais propensas do que os homens a relatar efeitos na saúde mental após a Covid. E pessoas com problemas de saúde física preexistentes, como asma, câncer e doenças cardíacas, têm maior probabilidade de desenvolver sintomas de transtornos mentais após a doença.

Além disso, as pessoas que experimentam extensa interrupção do sono, isolamento social ou uma mudança significativa em outros comportamentos, como a quantidade de álcool que consomem ou o tipo de medicamentos prescritos que ingerem, podem ter maior probabilidade de enfrentar depressão depois que os sintomas físicos da Covid-19 desaparecem. "Sabemos que ter fatores de estresse adicionais pode predizer sintomas depressivos mais tarde", disse a doutora Hosey. Alguns estudos sugerem que as pessoas que experimentam esses estressores podem ser mais vulneráveis a desenvolver Covid longa em geral.

Quando o blues da Covid se torna depressão clínica? Quais são os sinais precoces?

Enquanto você está no meio da luta contra a infecção viral, é normal sentir-se cansado e com dor de cabeça. "Quando você se sente fisicamente péssimo, isso pode interferir no seu humor", disse Hosey. "Eu nunca diagnosticaria alguém com depressão clínica nas fases agudas de uma infecção por Covid."

Mas se a exaustão e a sensação de estar arrasado persistirem por duas a seis semanas após a infecção por Covid e começarem a interferir nas atividades do dia a dia ou afetar negativamente seus relacionamentos com outras pessoas, pode ser um sinal de depressão, explica a doutora Hosey.

Algumas pessoas com depressão também podem experimentar tristeza persistente, choro, irritabilidade, alterações no apetite ou no peso, dificuldade para pensar ou se concentrar, ou sentimentos intensos de culpa, inutilidade ou desesperança. Aquelas com depressão severa podem pensar frequentemente na morte e desenvolver ideias suicidas, alerta Hosey.

O que você pode fazer para tratar a depressão pós-Covid?

Se você está preocupado com o fato de você ou um ente querido ter sintomas de depressão após a infecção por Covid, é importante conversar com um médico ou profissional de saúde mental. "Nem todo mundo precisa consultar um psiquiatra para ser avaliado quanto à depressão", disse o doutor Al-Aly. As pessoas podem compartilhar o que estão passando com seu médico de atenção primária para obter ajuda também, disse ele. "O mais importante é procurar ajuda. E o mais cedo possível."

A depressão não é algo que você normalmente consegue superar sozinho, disse a doutora Hosey. Pode ser tentador usar recursos online e ferramentas de autodiagnóstico e solicitar suplementos que prometem acalmar a inflamação relacionada à Covid ou reparar sua saúde intestinal. Mas muitas dessas intervenções não são confiáveis ou apoiadas por evidências.

É uma boa ideia fazer um balanço de sua dieta, sono e uso de drogas e álcool. Consumir alimentos mais nutritivos e estabelecer uma boa rotina de sono, por exemplo, podem ter um pequeno impacto positivo na sua saúde mental. A pesquisa sugere que exercício e meditação também podem ajudar a curar a mente em alguns casos. Mas se as mudanças comportamentais não funcionarem um profissional pode recomendar terapia ou medicação, dependendo de suas necessidades.

Durante a pandemia, o acesso aos serviços de telemedicina e saúde mental se expandiu, disse a doutora Hosey. Vários estados americanos agora permitem que psicólogos licenciados prestem atendimento a pacientes em outros estados que fazem parte do Pacto Interjurisdicional de Psicologia. Isso significa que você pode procurar mais facilmente um provedor de saúde mental presencial ou online, mesmo que haja escassez de atendimento especializado na sua área, disse Hosey.

Ainda não está claro quanto tempo leva para superar os sintomas de depressão pós-Covid. "A recuperação da depressão é um processo muito individualizado", explica a médica. Muitas pessoas se recuperam após um breve período de tratamento. Algumas experimentam recaídas, quando seus sintomas melhoram e pioram, e podem precisar tentar um tratamento diferente, disse ela. Às vezes, a depressão desaparece sem tratamento, embora seja mais provável que isso aconteça em pessoas com casos leves.

"Após uma infecção por Covid, você deve se dar um tempo e ser paciente", disse a doutora Hosey. "Uma infecção pode ser difícil de tratar."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/equilibrio/2022/11/a-depressao-da-covid-e-real-aqui-esta-o-que-voce-precisa-saber.shtml 17/11/2022

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