A qualidade e a utilidade da obra continuam a gerar dilemas éticos, como o que envolveu a cirurgiã Susan Mackinnon, pesquisadora da Universidade Washington em Saint Louis, no estado norte-americano de Missouri. Em um artigo publicado na revista Surgery, ela relatou o caso de uma paciente de 50 anos de idade que, após várias cirurgias no joelho, sofrera uma lesão em um nervo que causava uma dor insuportável e cogitava amputar a perna para se livrar do suplício. Como não conseguia encontrar o nervo, pediu ao colega Andrew Yee para fotografar uma das ilustrações do Atlas de Pernkopf, que ela ganhara em 1982, e lhe mandasse por e-mail. Assim, identificou a localização exata e concluiu a operação com sucesso.
Depois ficou pensando se fizera a coisa certa. Ela e Yee resolveram consultar historiadores, especialistas em bioética e juristas, para colher suas opiniões. O resultado, exposto na Surgery, é que Mackinnon fez bem em recorrer às ilustrações. O médico Michael Grodin, da Escola de Medicina da Universidade de Boston, Estados Unidos, estudioso da medicina do nazismo, ponderou que os desenhos de Pernkopf conjugam notáveis qualidades artísticas e científicas, ao contrário de boa parte do conhecimento gerado pelos cruéis experimentos dos médicos de Hitler que, de modo geral, se revelou fútil e imprestável.
Segundo Grodin disse ao serviço de notícias em saúde e negócios Stat, o dilema da médica remete a uma velha pergunta:“É possível extrair o bem do mal?”. Mas nem mesmo o judaísmo, afirmou Grodin, veria um impedimento no uso das imagens. “A maioria dos rabinos não apenas permitiria utilizá-las, como isso seria obrigatório”, diz, referindo-se ao potencial dos desenhos de ajudar a salvar vidas e aliviar sofrimentos. O rabino e especialista em bioética Joseph Polak, da Universidade de Boston, concordou com Grodik, mas ressaltou que médicos e educadores devem relembrar as origens quando recorrerem às ilustrações. “Sempre que alguém usar uma dessas imagens, precisa contar de onde ela veio”, afirmou Polak, sobrevivente de um campo de concentração.
Fonte: https://revistapesquisa.fapesp.br/e-possivel-extrair-o-bem-do-mal/?utm_source=newsletter&utm_medium=email
Nenhum comentário:
Postar um comentário