Entrevista com Mario
Sergio Cortella
Professor e filósofo
Isabela
Palhares
Educador destaca
necessidade de exercer autoridade sobre os filhos e
não transformar desejos
em direitos
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MARIO SERGIO CORTELLA
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“Ele é assim e não há o que fazer”. “No meu tempo era
diferente”. Essas frases são comumente ditas por pais ao professor e
filósofo Mario Sergio Cortella. Ele lançou nesta sexta-feira, 12 de maio, o
livro Família – Urgências e Turbulências(Cortez Editora, 144 págs.,
preço sugerido R$ 38) em que aponta a falta de convívio familiar e a
dificuldade de exercer autoridade sobre os filhos como as principais falhas
nas relações familiares atuais.
Pergunta: O
senhor fala que a atual geração de pais dá “toda voz” às crianças. A falta de
tempo faz com que os pais optem por evitar confronto com os filhos?
Mario Sergio Cortella: A falta
de tempo é uma das causas. Ela não é exclusiva, mas extremamente significativa.
Afinal de contas, quando um casal inicia uma discussão, é preciso ter tempo
para levá-la adiante e concluí-la, de modo a não sofrer alguma ruptura. A
ausência do tempo de convívio leva a uma rarefação também do tempo de
enfrentamento. Eu uso a palavra enfrentamento sem nenhum tipo de pudor.
Porque toda relação de educação tem dentro dela um enfrentamento.
O senhor fala do medo dos pais em confrontar os filhos, de
discipliná-los e entristecê-los. Há uma geração de pais com medo de exercer
autoridade?
Mario Sergio Cortella: É uma
geração que inverteu a relação. Afinal, quando tenho responsabilidade sobre
alguém, tenho sempre de lembrar que ela está sob a minha ordenação, está
subordinada a mim. Isso não significa que ela seja submissa ou inferior,
mas que, do ponto de vista familiar ou legal, tenho responsabilidade por aquele
cuidado. A sensação é que os pais se sentem responsáveis para que o filho
seja feliz naquela circunstância imediata. É uma felicidade que não é
construída e projetada para um aproveitamento mais adiante, é apenas imediata.
Há um grande número de pais e mães que enfraqueceram a sua autoridade.
A preocupação excessiva de deixar as crianças em situações
prazerosas e a dificuldade de imposição de limites as prejudica?
Mario Sergio Cortella: É uma
ilusão imaginar que cabe aos adultos fazer com que crianças e jovens estejam o
tempo todo se divertindo. Essa perspectiva hedonista, de uma energia movida
apenas pela busca contínua do prazer, é muito danosa porque deforma o que temos
de formar nas crianças. Uma grande parte dos jovens tem dificuldade de lidar
com a recusa dos desejos. Uma parte dos filhos hoje é criada por pais que
assimilam a ideia de que os desejos são direitos e, portanto, é preciso
corresponder, outorgá-los. Essa condição, em que se procura o tempo todo dar
conta dessas necessidades, enfraquece a nova geração.
Há uma busca muito grande dos pais hoje para oferecer aos filhos o
maior número de atividades para que se destaquem. Temos hoje crianças muito
estimuladas, mas pouco motivadas?
Mario Sergio Cortella: A motivação
parte de dentro e o estímulo vem de fora. Pais precisam ser capazes de
estimular a motivação na criança. Esse excessivo agendamento da vida de
crianças e jovens, que os deixam quase sem tempo livre, tem uma perspectiva
muito mais de preparação para um mundo de combate do que para uma formação
densa de valores. Aliás, uma parcela dos adultos usa, em relação aos seus
filhos, uma linguagem bélica: “Tenho de preparar meu filho para o combate”,
“para a luta da vida”, “para a competição”. Como se a vida fosse uma corrida de
100 metros rasos com barreiras, em que você dispara e cai quase desmaiado no
final. Não, a vida é mais como uma maratona. E temos de formar crianças
e jovens para essa percepção: a maratona exige situações em que você economiza
fôlego, acelera, recua.
Sempre é possível restabelecer uma boa relação com os filhos?
Mario Sergio Cortella: Claro. O
pai que diz não ter alternativa assume a falência da capacidade de ação. Quem
tem responsabilidade sobre alguém não pode desistir e, afinal, quem ama não
desiste. Há pais que estão criando crianças soberanas e não autônomas.
Também esquecem que a família não é uma democracia – um conceito político que
se aplica a um conjunto de cidadãos com direitos iguais. Uma família pode ser
uma estrutura participativa, mas não democrática. Pais e filhos têm os
mesmos direitos no que diz respeito à dignidade humana, mas é preciso exercer
autoridade. Dar a mesma autoridade à criança é uma responsabilidade que ela
não pode carregar.
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