sábado, 31 de janeiro de 2009
Pensamento com sabor
Requiem
OBRA PÓSTUMA Updike
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq3101200920.htm
Requiem
By JOHN UPDIKE
Published: January 28, 2009
Thomas Libetti
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John Updike, a Lyrical Writer of the Middle-Class Man, Dies at 76 (January 28, 2009)
Times Topics: John Updike
For life’s a shabby subterfuge,
— JOHN UPDIKE
This poem is taken from John Updike’s forthcoming collection, “Endpoint and Other Poems.”
http://www.nytimes.com/2009/01/29/opinion/29updike.html?_r=1&scp=8&sq=%22John%20Updike&st=cse
Vício impunido
A INFÂNCIA, com os livros coloridos, e logo a adolescência, é a idade ideal para incutir nas crianças o vício da leitura vício impunido, como o chamava Valery Larbaud. A imprensa, nas palavras do papa Gregório XVI, é uma arte execranda e detestável, ou se preferirmos a linguagem litúrgica haec detestabilis at que execranda, condenação que a acompanhou desde as origens. O que, aliás, continua até hoje: viciado irrecuperável, Annibal Augusto Gama refere que, "há cerca de sessenta anos, no pátio do Colégio dos Maristas, em Franca, os irmãos mandavam queimar uma boa centena de livros tidos como deletérios, entre eles alguns de Monteiro Lobato", incinerado simbolicamente através dos tempos. A meiga Cecília Meireles qualificava de "detestáveis" os seus personagens, retomando, talvez sem querer, o vocabulário papal, enquanto os seus livros eram proibidos durante o Estado Novo de 1937: "o procurador Dr. Clóvis Kruel de Morais afirmava que o texto [de Peter Pan] era perigoso e alimentava nos espíritos infantis, `injustificavelmente', um sentimento errôneo quanto ao governo do país' e `incutia às crianças brasileiras a nossa inferioridade, desde o ambiente em que são colocadas até os mimos que lhes dão'" (Annibal Augusto Gama. Os diamantes de Ofir. Ribeirão Preto, SP: Funpec, 2008 e Marisa Lajolo/ João Luís Ceccantini, orgs. Monteiro Lobato de livro a livro. São Paulo: Imprensa Oficial, 2008).
Assim, a leitura pode ser um vício impunido e escondido, como todos os vícios, não sendo poucas as punições que a escrita e seus autores vieram sofrendo, na fogueira, nas prisões e no exílio, "desde que há homens e que escrevem", para repetir as palavras de La Bruyère. É verdade que o procurador Kruel tinha razão: é nos mais tenros anos que devemos expor as crianças ao vício da leitura. Foi o que aconteceu com Annibal Augusto Gama: "O amor dos livros nasceu em mim quando, ainda menino, mal conseguia ler as palavras impressas. Daí para a frente, tive-os sempre comigo".
Contudo, é preciso evitar o irreparável erro pedagógico praticado nas escolas com a obstinação dos bens intencionais, que consiste em tentar despertar o "amor à leitura" com Camões e Machado de Assis impostos às crianças e adolescentes mentalmente imaturos. Os chamados "grandes escritores" só serão aceitos por inteligências literariamente educadas: "Há livros que devem ser lidos na juventude, outros na maturidade, e ainda outros na velhice. Cada um exige a época própria do leitor" (Annibal Augusto Gama). Livros que despertam o amor e, logo mais, o vício da leitura são, na adolescência, as novelas policiais e as narrativas de aventuras, que estimulam a inteligência e a ginástica mental, pondo o espírito a trabalhar, não os que o adormecem: "Quem teve a felicidade, em sua juventude, de ler essas novelas, descobrir o mundo através delas, debruçando-se também sobre a obra de Júlio Verne, sabe do que se trata".
É a biblioteca imaginária da coleção Terramarear, da Coleção Amarela e dos livros de Conan Doyle, os Negreiros da Jamaica, As minas de Salomão (o que hoje já se sabe não ter sido escrito por Eça de Queiroz), mais Jack London e Mayne Reid, sem esquecer Emílio Salgari, cujo sobrenome os nativos de sua província natal pronunciam como proparoxítono. Em lugar de supor que adolescentes de todas as idades (inclusive a mental) interessam-se por Dom Casmurro e conseguem entendê-lo, será possível introduzir José de Alencar pelas Minas de prata, não pelo Guarani.
A verdade é que cada livro não é um texto, mas um palimpsesto, no qual lemos ou relemos em filigrana todas as nossas leituras anteriores. Não há leituras definitivas: "A leitura de um livro antes lido e relido, e que, anos mais tarde você torna a pegar e a lê-lo de novo, da primeira à última página, esmoendo-o, analisando com exatidão cada frase, compreendendo tudo, interpretando cada passagem, descobrindoo que permanecia obscuro ou duvidoso, de tal sorte que, ao cabo, possa afirmar 'este eu assimilei inteiramente, não há nada mais, em todo ele, que eu não saiba`". O verdadeiro leitor não tem "livro único", mais importante que os demais, e, por isso, não pode responder a essa pergunta dos jornalistas.
E, muito menos, o livro folclórico que levaria para a ilha deserta, lugar, aliás, em que se pode pensar em tudo, menos na leitura. Nesse caso, Annibal Augusto Gama repete a resposta conhecida: "Atirados na ilha, dificilmente teremos ânimo para leituras, devendo procurar, antes de mais nada, os paus para fazer um barco que nos leve de volta (...)". O único livro a levar para a ilha é o manual de fabricação de canoas; os não-leitores denunciam-se desde logo ao declarar que levariam a Divina comédia ou as obras completas de Shakespeare, que provavelmente jamais haviam lido.
*Wilson Martins crítico literário
sexta-feira, 30 de janeiro de 2009
Idade é só um detalhe
Por Jorge Félix, para o Valor, de São Paulo
"Os idosos são vistos como altamente dependentes, economicamente e
Valor: O envelhecimento populacional está sendo percebido como consequência do desenvolvimento econômico ou como uma barreira?
Peter Lloyd-Sherlock: O envelhecimento populacional representa um desafio para o desenvolvimento. Pode se tornar um estorvo. Mas isso depende de como é administrado. Historicamente, o Brasil tem sofrido com a má administração de um sistema previdenciário ineficiente. Isso foi mais produto da dinâmica de políticas corporativistas do que da mudança populacional. O mesmo pode ser dito do sistema de saúde. Se a saúde e a previdência tivessem sido geridas com mais eficácia, o suposto fardo dos idosos poderia ser apenas uma fração daquilo que é hoje.
"O mito-chave é que o envelhecimento
Valor: Como esta dinâmica deve ser entendida?
Lloyd-Sherlock: Você não pode considerar o envelhecimento populacional como um fenômeno isolado. Tem que ser entendido no amplo contexto da transição da fecundidade. Rápida redução desta taxa significa uma queda na taxa de crescimento do total da população, o que é geralmente compreendido como uma boa coisa para o desempenho econômico. Por exemplo, reduções no número de crianças liberam mais recursos para investimentos produtivos.
Valor: Por que o envelhecimento populacional, então, quase sempre é visto como representativo de uma situação de crise?
Lloyd-Sherlock: Por que os idosos são vistos como altamente dependentes (economicamente e em outros áreas) e improdutivos. A velhice é associada com uma inevitável baixa qualidade de vida. Essas visões são simplistas. A terceira idade pode ser muito variada. Também se ignora a importante contribuição que muitos idosos, especialmente os de cerca de 60 anos, continuam a dar, o potencial deles... Basta que a sociedade lhes ofereça oportunidades.
Valor: Para um país em processo de envelhecimento surge obrigatoriamente uma escolha, em termos de políticas públicas, entre o bem-estar dos avós ou dos netos?
"Previdência e saúde importam muito,
Lloyd-Sherlock: Não tem que ser uma escolha. Para a família, os idosos (especialmente as mulheres) fazem muito para o sustento das gerações mais novas. Em termos de políticas públicas, não acho que isso signifique olhar para os recursos públicos como um "trade-off" entre, digamos, educação e Bolsa Família de um lado, e saúde e previdência de outro. Tudo é importante para a manutenção de uma sociedade saudável e decente. Em vez disso, penso que existem escolhas e conflitos de interesse entre aqueles brasileiros que podem dar-se ao luxo de ter uma saúde decente e planos de aposentadoria privados e enviar seus filhos para escolas privadas e aqueles que não podem, independentemente de quão jovens ou idosos eles são.
Valor: Como analisa a posição dos organismos multilaterais, como ONU e Banco Mundial?
Lloyd-Sherlock: O Banco Mundial tem-se preocupado, quase exclusivamente, com o financiamento dos sistemas de previdência. Não está envolvido com outras questões, como saúde, economia ou relações sociais e mercado de trabalho dos idosos. Ou seja, há um engajamento limitado no Plano de Ação Internacional de Madri, que estabeleceu as diretrizes para o envelhecimento populacional, em 2002. Isso é um vergonha, embora o Banco Mundial seja muito ativo em outros aspectos das políticas de saúde. Por exemplo, publicou recentemente um relatório sobre doenças crônicas, mas não fez praticamente nenhuma referência aos idosos. Mesmo assim, o principal argumento do relatório é que os sistemas públicos não estarão aptos para enfrentar o crescimento das doenças crônicas e muito mais deve ser feito para ampliar a presença do setor privado. Pessoalmente, acho isso uma perigosa recomendação, tantas são as falhas do setor privado de saúde em países como o Brasil.
Valor: O Brasil está atualizado com as orientações do Plano de Madri?
Lloyd-Sherlock: O Banco Mundial é muito crítico em relação ao sistema de seguridade social do Brasil como um todo, em termos de sua ineficácia, retrocesso e duvidosa sustentabilidade. No entanto, não estou convencido de que isso seja suficiente para viabilizar uma reforma. A política previdenciária do Banco Mundial evoluiu nos últimos 15 anos, mas ainda é principalmente baseada em promover a privatização e esquemas de contribuição definida. A eficácia de esquemas como estes na América Latina é irregular e sua aplicação não consiste em uma panacéia para todos os problemas da seguridade social do Brasil. O Banco Mundial está também colocando mais ênfase sobre a previdência não-contributiva para os mais pobres, como parte de um portfólio de políticas para focar as transferências de renda em diferentes grupos. De maneira geral, é uma boa coisa. Claro, esses programas já estão muito desenvolvidos no Brasil.
Valor: Existe a possibilidade de o envelhecimento populacional tornar-se mais um fator de aumento da desigualdade no Brasil?
Lloyd-Sherlock: Graças ao extenso sistema de pensões não-contributivas do Brasil (benefício de prestação continuada da assistência social e lei orgânica da assistência social), a renda dos mais pobres não é mais baixa para os idosos do que para a população em geral. Enquanto esses programas existirem, o envelhecimento populacional não deve ser associado com aumento da pobreza. Diante disso, no entanto, creio que é importante termos uma visão mais ampla da pobreza, para além da renda per capita. Por exemplo, alguns idosos podem estar acima da linha de pobreza, mas podem ainda encontrar grande dificuldade para ter acesso a medicamentos fundamentais por causa de problemas com o sistema de saúde público.
Valor: Ou seja, a pobreza pode aumentar independentemente da renda por que o idoso terá mais gastos básicos.
Lloyd: Recentemente falei com vários idosos no Brasil que não estavam na linha da pobreza, tecnicamente, mas não tinham acesso a medicamentos básicos para hipertensão. O crescimento no sistema privado de saúde é um fator que amplia a heterogeneidade entre os idosos. Há aqueles que desfrutam de boa assistência de saúde e aqueles que estão excluídos. Em termos de desigualdade, é bem conhecido que o sistema de seguridade social no Brasil tem um tremendo impacto sobre a melhoria da distribuição de renda. O prejudicial para a população idosa são problemas permanentes no sistema de contribuição. Assim, as pensões não-contributivas exercem um papel importante.
Valor: Os brasileiros estão envelhecendo melhor do que outros latino-americanos?
Lloyd-Sherlock: Em geral, sim. Em parte, por que muitos têm razoável acesso aos serviços de saúde durante suas vidas, ao menos na comparação com outros países da região. Os idosos brasileiros de hoje foram beneficiados por programas governamentais para aquisição de domicílios, sobretudo de baixa renda, e têm casa própria. Esse é um importante patrimônio, oferece segurança na velhice. Mais importante, porém, é que a maior parte dos idosos hoje tem acesso à previdência, que paga razoável soma de benefícios. Por outro lado, muitos idosos são crescentemente afetados (direta ou indiretamente) pelo aumento dos níveis de violência e outros problemas associados com a exclusão social, especialmente nos bairros pobres urbanos.
Valor: Em um de seus estudos o sr. afirma que "o debate político sobre o envelhecimento está impregnado por generalizações, estereótipos e mitos". Quais são eles?
Lloyd-Sherlock: O mito-chave no âmbito internacional é que o envelhecimento populacional é principalmente um fenômeno das economias industriais desenvolvidas. Na verdade, a grande maioria das pessoas com 60 anos ou mais vive nas regiões em desenvolvimento. Outro mito é que a fase idosa pode ser definida em termos simples (apenas como aqueles de 60 anos ou mais) e que experiências de vida mais longa são bastante similares. Isso é uma bobagem. É provável que uma pessoa de 61 anos tenha muito mais em comum com uma de, digamos, 49 do que com uma de 80.
Valor: É comum afirmar-se que o envelhecimento populacional significa aumento de gastos na saúde. Isso é verdade?
Lloyd-Sherlock: Basicamente, não. Custos de cuidados com a saúde são mais fortemente influenciados por vários outros fatores, como o desenvolvimento de novas (e usualmente mais caras) tecnologias e os modos como os sistemas de saúde estão organizados. Os Estados Unidos gastam um percentual do PIB três vezes maior em saúde do que o Reino Unido, embora tenham um percentual de idosos menor. As condições de saúde dos idosos americanos não são notadamente melhores do que as dos britânicos. Na verdade, estão longe de ser equivalentes. O principal fator de aumento dos custos de saúde nos Estados Unidos é a grande presença dos HMOs ("health maintenance organizations", os seguros privados que as empresas são obrigadas a oferecer aos empregados). Na minha opinião, o Brasil tem visto uma massiva expansão desse setor nos anos recentes. Isso faz muito mais pressão para inflacionar os custos do sistema de saúde do que o envelhecimento populacional.
Valor: E quanto à previdência? Quais têm sido os resultados das soluções adotadas até agora para reduzir o impacto do envelhecimento populacional?
Lloyd-Sherlock: Acredito que o sistema brasileiro tem sido muito positivo para os idosos e que é excelente o uso dos recursos públicos. Ampliar a idade de aposentadoria é uma solução potencial, especialmente se o mercado de trabalho pode absorver os trabalhadores extras. Não acho que exemplos como os da Inglaterra e do Chile sejam bons para o Brasil. Tem havido muitos problemas com os sistemas privados desses países em termos de mercado e de cobertura.
Valor: O debate do envelhecimento populacional não está concentrado demais nos sistemas de previdência e saúde? Não existe o risco de se esquecerem outras questões importantes?
Lloyd-Sherlock: Correto. Previdência e saúde importam muito, mas existem várias outras questões para levar em conta. Em particular, os governos precisariam dar mais atenção à qualidade das relações sociais dos idosos, inclusive no âmbito familiar, com garantia de apoio para que disponham de cuidados de longo prazo. Mas isso parece estar fora da prioridade pública no Brasil, como acontece em toda a América Latina. Por exemplo, é preciso haver uma regulamentação cuidadosa das instituições de longa permanência. As relações sociais dos idosos devem também aproximar os domicílios. Muitos idosos permanecem praticamente presos em suas próprias casas, amargando isolamento, solidão, baixa estima e um alto grau de dependência. Muito precisa ser feito para que as pessoas tenham uma rede social quando envelhecem. Transporte público acessível, melhora na segurança e um programa de centros de convivência com atividades poderiam ajudar.
Valor: O sr. fez pesquisas em bairros pobres de São Paulo. Nesta faixa da população, os recursos da pensão do idoso têm grande peso na renda familiar. Este é um bom papel para o idoso? Quais as conseqüências?
Lloyd-Sherlock: A resposta para isso não é simples. Existe um "trade-off" entre oferecer uma renda que atenda às necessidades pessoais dos idosos e difundir benefícios entre o maior número de domicílios. Além disso, comenta-se que os idosos são forçados a dar o dinheiro deles para parentes. Isso está relacionado à questão maior de abusos contra idosos, que não está sendo bem conduzida no Brasil.
Por um capitalismo moderno em 2010
O único laço de confiança sobrevivente ao desastre econômico é o que une o presidente Luiz Inácio a seu vasto núcleo de apoio popular. Toda a eventual credibilidade do resto se esfarelou: de acadêmicos, cronistas, consultores e tecnocratas. Ficaram todos entre intimidados e surpresos, cientes de que a sabedoria de que dispõem (real ou presumida) fora escassa para identificar o que nem uma ciência respeitável como a da economia seria capaz de antever: os momentos em que a complexidade do mundo assusta a humanidade com sinais de mórbido humor.
Pois são esses os mesmos que, passados menos de quatro meses do início do naufrágio, voltam às páginas e aos televisores, desfilando a antiga prosápia bem vestida, prenunciando raios e trovões no horizonte próximo da economia e da sociedade brasileiras. Vamos deixar claro, como condição de entendimento, uma pequena verdade: eles não sabem, com certeza, nada. Não, obrigatoriamente, por incompetência, mas porque o futuro próximo está enevoado em excesso e porque o passado recente ainda, por assim dizer, não passou.
Quase a cada dia surgem amargas novidades, dificultando, ao mesmo tempo, a contabilidade sólida da extensão da crise e a exaustiva identificação de seus vetores causais. Resta aos analistas o recurso de extrapolar para o futuro próximo as tendências observadas nos poucos meses antecedentes.
Ora, o método de extrapolação é um dos mais frágeis, entre as técnicas de análise prospectiva, assim como não muito segura é esta outra, utilizada pelo Banco Central, a de projetar a média ou mediana das opiniões de um grupo de "juízes", que aparecem como "graus" nas agências internacionais de classificação. Ambas foram generosamente empregadas às vésperas da crise e por esta falsificadas. Não tiveram a eficácia aumentada ou diminuída pelo fracasso, apenas continuam sendo não mais do que auxiliares nas previsões sobre o futuro.
À falta de melhores instrumentos, como é o caso presente, os analistas complementam o exercício com avaliações políticas, ou melhor, segundo uma perspectiva política. Difundem opiniões politicamente, partidariamente orientadas. É natural, compreensível e faz parte do jogo. Mas não devem ser tomadas como verdades cristalinas e sem retoques.
A orientação partidária da oposição consiste precisamente em romper o fio de confiança entre o governo Lula e a população que o apoiou até aqui. Por muito pouco o presidente Luiz Inácio escapou de ser encarcerado em sério dilema. Não fosse a pronta resposta da maioria do sindicalismo, a exceção mais conspícua sendo a Força Sindical, e certos cavalheiros da Fiesp teriam estabelecido um duto de extração de recursos do Tesouro Nacional, sem contrapartida, e esterilizado substancial parte dos direitos dos trabalhadores com carteira assinada.
Aproveitando o susto causado pela virulência da crise, diariamente alimentado por fatos reais e por fantasmagóricas especulações, a proposta apresentada quase como ultimato previa, do lado do Tesouro, suspensão de impostos, adiamento de dívidas, empréstimos de socorro e transferência para o governo dos custos de alguns benefícios sociais, hoje de responsabilidade empresarial. Para os trabalhadores a agenda incluía redução de jornada de trabalho com redução salarial, licença temporária, também com redução de salários, ou pagos com cursos de requalificação profissional, e, com olho na próxima decisão do governo, mudança na legislação sobre salário mínimo.
O dilema é claro: ou o governo cedia, diminuindo os recursos à sua disposição para investimento e programas sociais, ou recusava, assumindo a responsabilidade (atribuída) pela monumental onda de demissões que viria a seguir. Em qualquer dos casos, os laços de confiança entre o presidente e sua base popular ficariam estremecidos.
As eleições de 2010 poderiam começar a se definir agora, no bojo de uma crise econômica pela qual o governo, tal como os governos da França, da Alemanha, da Inglaterra e do resto do mundo, Estados Unidos à parte, não tem a menor responsabilidade. A proposta empresarial, além das vantagens econômicas e sociais, trazia um disfarçado bônus eleitoral. Como diria o agora adoentado Neguinho, intérprete dos sambas-enredo da Escola de Samba Beija-Flor de Nilópolis: olha a eleição de 2010 aí, minha gente!
Embora muito citado é raramente aproveitado o ditado, que me informam ser chinês, de que períodos de crise são também períodos de oportunidades. Ao que parece, o ditado não esclarece de que natureza seriam tais oportunidades, mas aqueles cavalheiros da Fiesp parecem dos poucos a se servirem do ditado e interpretaram a oportunidade da crise para garantir a agenda antes mencionada. Não percebi nenhuma resposta articulada do governo, somente medidas dispersas, e, do sindicalismo reunido com o presidente Luiz Inácio, apenas surgiram demandas convencionais.
Acostumados ao atraso institucional, os segmentos sociais progressistas imaginam que as relações trabalhistas em vigor são o máximo de avanço possível no capitalismo. Se assim fosse, qualquer proposta de mudança apontaria para perdas, não para ganhos. Mudar significaria, sempre, mudar para pior. Visto que as propostas de mudança que vêm a público são sempre para pior mesmo, consolida-se o preconceito de que o código varguista e alguns acréscimos constituem com efeito o paraíso do operariado. Mas a crise inaugura oportunidades para alguns experimentos.
Por exemplo, a antigreve. É bastante razoável supor que muitas firmas estão propensas a promover demissões por razões que a crise só veio agravar e que as promoveriam de qualquer forma. Uma abertura do caixa da empresa, mediante alguma fórmula jurídica que cabe ao Legislativo e ao Judiciário inventarem, permitiria avaliar a legitimidade do pleito do empresário, cabendo ao governo, portanto, assumir o problema via seguro-desemprego.
No caso em que não coubessem razões legítimas, ou pior, se a empresa se negasse a abrir o caixa, incumbiria ao sindicato convocar os demitidos às firmas e fábricas, não para entrar em greve, mas antes garantindo por meio de piquetes o retorno dos trabalhadores ao trabalho, continuando a produção.
É possível que surgissem alguns casos em que a redução da jornada com redução de salário se revelasse como boa estratégia de curto prazo para garantir a sobrevivência da empresa e a retomada futura da produção plena. Nessa variante, a parte não paga em dinheiro poderia ser substituída por ações ordinárias da empresa, a preço de mercado, com ou sem opção de compra posterior, também a preço de mercado, dependendo dos acordos jurídicos a serem convencionados. Afinal, a parte não paga do salário não deixa de ser um aporte do trabalhador à economia da firma.
Finalmente, a política de investimento, sobretudo das grandes corporações, em algum momento terá de ser compartilhada pelos proprietários do capital e os proprietários da força de trabalho. A contratação de trabalhadores e a compra de máquinas tanto podem ser vistas como custos ou investimentos. É uma concepção atrasada contabilizar uma como custo e outra, como investimento. Essa escrituração faz parte de uma visão primitiva do desenvolvimento do capitalismo, que pode haver sido responsável por algumas das crises dessa fase histórica.
O governo do presidente Luiz Inácio tem sido responsável por um dos mais importantes saltos na vida política brasileira: a incorporação do PT à vida democrática competitiva, daí se derivando a grande estabilidade do sistema brasileiro contemporâneo, para desapontamento das cassandras brazilianistas. Do exterior e domésticas. Pode aproveitar a oportunidade deste final de mandato associado à crise econômica para fazer avançar este mastodonte preguiçoso que é o capitalismo brasileiro. As eleições de 2010 estão no ar. Foram empinadas pelo empresariado.
P.S.: Na Primeira República o governador José Serra já estaria eleito presidente de São Paulo. Ainda não dá para mais.
Wanderley Guilherme dos Santos, membro da Academia Brasileira de Ciências, escreve quinzenalmente neste espaço
Email: leex@candidomendes.edu.br
De heldercamara@ceu.com para amigos e amigas
http://www.correiobraziliense.com.br/impresso/ 30/01/2009
FSM: O Ano do Futuro
Os acontecimentos que marcam o início de 2009
A grande mídia divulgou à saciedade o diagnóstico da situação mundial feita pelo Forum Econômico Mundial (FEM) na sua reunião deste ano. É um diagnóstico sombrio que coincide em muitos pontos com os diagnósticos feitos pelo Fórum Social Mundial (FSM) em suas sucessivas edições desde 2001. Não interessa saber se o FSM teve razão antes do tempo ou se o FEM tem razão tarde de mais. Interessa, sim, refletir sobre o fato de o FSM não ter tido a influência ou exercido a pressão que se desejaria sobre os decisores políticos. Em parte, isso deve-se a uma opção do FSM: ser um espaço aberto a todos os movimentos e organizações que lutam de forma pacífica por um outro mundo possível, sem deixar que tal abertura seja comprometida por decisões políticas, nunca possíveis de obter por consenso.
*Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal).
http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=4117&boletim_id=524&componente_id=9096
quinta-feira, 29 de janeiro de 2009
Mono-patologia
Os últimos ataques de vírus em computadores mostrou uma fragilidade que a revista Times denominou de "perigos da monocultura". Assim como a virulência dos novos vírus que atacam seres humanos se origina do desmatamento e da diminuição da bio-diversidade, a destrutividade dos vírus de computador também se origina na pouca diversidade de mídia. A grande maioria dos computadores deste planeta utiliza o mesmo software tornando os bancos de dados de nossa civilização extremamente vulneráveis.
*NILTON BONDER é rabino e escritor.
http://amaivos.uol.com.br/Acesso 29/01/2009
Uma moeda não hegemônica
quarta-feira, 28 de janeiro de 2009
Escritor-padrão dos EUA
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq2801200928.htm
*TEXTO INÉDITO DE CALLADO FOI ESCRITO EM 92
Cotidiano
- Tudo bem?
- Tudo bem!
Mesmo que as coisas vão mal.
Embora a dor sufoque a alma.
E a depressão emagreça os sentimentos.
E a vida é difícil.
A coragem desencoraje a alegria.
A tristeza magoa a alma.
E as aparências devam ser mantidas.
Ainda assim
Deva-se dizer:
Tudo bem.
Quanta mentira, meu Deus!
(Do livro:Poemas e Poetas. José Rovani e Valter Zanatta, ed. própria. s/dt. O poeta Valter Zanatta é irmão Lasallista, atual vice-diretor do Colégio Lasalle do Carmo em Caxias do Sul Rs. Natural de Carlos Barbosa, RS).
segunda-feira, 26 de janeiro de 2009
Obama é o primeiro presidente digital
Pioneiro no estudo da "geração digital" vê ascensão de grupo de influência que não aceitará governo tradicional e será incomumente exigente
Em 1996, quando a internet engatinhava, o canadense Don Tapscott detectou um fenômeno. Era o que ele chama de "Geração Digital", pessoas nascidas a partir da segunda metade da década de 80, para quem os avanços tecnológicos são realidade, não conquista. "Pela primeira vez, os jovens, e não seus pais, são as autoridades numa inovação central da sociedade." Pois essa geração chegou ao poder na última terça, com a posse de Barack Obama, defende o autor, acadêmico e empresário, em entrevista por e-mail à Folha. Mas os jovens fizeram mais do que apenas votar no democrata, segundo Tapscott. "Eles entraram para a política, mas no seu tipo de militância política", disse. Ela envolve militância via site de relacionamento social Facebook, noticiário via site de pequenas mensagens Twitter -e uma cobrança maior e mais imediata.
FOLHA - O que é "crescer digital"?
FOLHA - O sr. disse que o cérebro deles se "conecta" de outra forma.
FOLHA - Nesse sentido, podemos chamar Barack Obama de primeiro presidente digital? Quais as implicações da eleição dele nessa geração?
FOLHA - O sr. acha que economias emergentes como o Brasil têm chance de acompanhar as inovações digitais de economias avançadas? Ou há um "vácuo digital"?
FOLHA - Como a atual situação econômica afeta o que o sr. chama de "wikinomics" [veja quadro]? Esse tipo de atividade pode ajudar no combate à crise financeira?
São Paulo, segunda-feira, 26 de janeiro de 2009
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2601200917.htm
Terrorismo sexual
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq2601200918.htm
Ajude os velhinhos!
domingo, 25 de janeiro de 2009
A faca não corta fogo
A faca não corta o fogo,
não me corta o sangue escrito,
não corta a água,
e quem não queria uma língua dentro da própria língua?
eu sim queria,
jogando linho com dedos, conjugando
onde os verbos não conjugam,
no mundo há poucos fenómenos do fogo,
água há pouca,
mas a língua, fia-se a gente dela por não ser como se queria,
mais brotada, inerente, incalculável,
e se a mão fia a estriga e a retoma do nada,
e a abre e fecha,
é que sim que eu a amava como bárbara maravilha,
porque no mundo há pouco fogo a cortar
e a água cortada é pouca,
¡que língua,
que húmida língua, que muda, miúda, relativa, absoluta,
e que pouca, incrível, muita,
e la poésie, c’est quand le quotidien devient extraordinaire, e que música,
que despropósito, que língua língua,
é do Maurice Lefèvre, e como rebenta com a boca!
queria-a toda
◊
Herberto Helder, in A Faca Não Corta o Fogo, súmula & inédita, pp. 66-67, Assírio & Alvim, Lisboa, Setembro de 2008.
- Publicado na página: http://asfolhasardem.wordpress.com/
Religião e felicidade
É preciso não acreditar nos números da pesquisa. E isso porque as pessoas religiosas respondem de acordo com aquilo que sua ideologia religiosa as obriga a dizer. Perdão, Fernando Pessoa, pelo que vou fazer com os teus versos: “O religioso é um fingidor. Finge tão completamente que chega a fingir que é gozo a dor que deveras sente...” A religião dos pentecostais e evangélicos é uma religião que promete felicidade. Cristo dá paz àqueles que o têm no coração e resolve pelo milagre (a bênção!) os seus problemas. Se ele disser que não está feliz, ou a sua religião é falsa, não cumprindo o que promete ou ele não tem Cristo no coração. A ideologia católica permite confessar-se infeliz, porque nosso mundo é mesmo um vale de lágrimas. Felicidade só no céu. O mesmo vale para os protestantes. Um dos seus hinos diz: “Não há dor que seja sem divino fim...” E a ideologia espírita vê o sofrimento como instrumento do karma para promover a evolução. “Bendita a dor que me purifica a alma”, dizia a mulher espírita no sofrimento do seu câncer. Já os sem religião, por não estarem amarrados a uma ideologia que os obrigue, têm mais liberdade para reconhecer o sofrimento como sofrimento. Mas não sei se é vantajoso sofrer cientificamente. No sofrimento da dor eu não quero a realidade. Quero mesmo é uma dolantina, a felicidade dentro de uma ampola
Velhice tranquila
Em data passada eu publiquei em meio a espantos e risos a informação que me fora passada por um colega entendido em religiões. Mas não dei muito crédito e preveni meus leitores de que não deveriam aceitar o escrito como sendo real. Por que gastei tempo e espaço do jornal com uma besteira? É que eu cada vez mais me assombro com a capacidade humana de acreditar em coisas absurdas. Eu mesmo já acreditei. E me pergunto: onde estava a minha inteligência? O Chico Buarque e o Vinícius também acreditaram. Em nome de besteiras muitas guerras são travadas e muita gente é morta. O notícia era de que havia uma igreja com o nome de “Igreja Pentecostal Cuspe de Cristo”. Incrédulo de que a estupidez humana pudesse chegar a esse ponto resolvi consultar o Google. Descobri que a estupidez humana era muito maior do que eu imaginava. Vão aí alguns poucos exemplos: Assembléia de Deus Canela de Fogo, Assembléia de Deus com Doutrinas e sem Costumes, Associação Evangélica Fiel até Debaixo d’água, Comunidade Arqueiros de Cristo, Comunidade do Coração Reciclado, Cruzada Evangélica do Pastor Waldevino Coelho, a Sumidade, Igreja A Chave do Éden, Igreja A Serpente de Moisés, a que engoliu as outras, Igreja Abastecedora de Água Abençoada, Igreja Abominação à Vida Torta, Igreja Abre-te Sésamo, Igreja Assembléia de Deus Botas de Fogo Ardentes e Chamuscantes, Igreja Assembléia de Deus do Papagaio Santo que ora a Bíblia, Igreja Ave César, Igreja Bailarinas da valsa divina, Igreja bambolês sagrados, Igreja Batista da pomba sacrificada, Igreja Batista da velhice tranqüila... se eu não fosse tão descrente juro que entraria para essa última, da velhice tranqüila...
Aos que não gostam de ler
Nada tenho a dizer aos que gostam de ler. Eles já sabem. Mas tenho muito a dizer aos que não gostam de ler. Pena é que, por não gostarem de ler, é provável que não leiam isso que vou escrever. O que tenho a dizer é simples: “Vocês não sabem o que estão perdendo.” Ler é uma das maiores fontes de alegria. Claro, há uns livros chatos. Não os leiam. Borges dizia que, se há tantos livros deliciosos de serem lidos, por que gastar tempo lendo um livro que não dá prazer? Na leitura fazemos turismo sem sair de casa gastando menos dinheiro e sem correr os riscos das viagens. O Shogun me levou por uma viagem no Japão do século XVI, em meio aos ferozes samurais e as sutilezas do amor nipônico. Cem anos de solidão, que reli faz alguns meses, me produziu espantos e ataques de riso. Achei que o Gabriel Garcia Marques deveria estar sob o efeito de algum alucinógeno quando o escreveu. Lendo, você experimenta o assombro do seu mundo fantástico sem precisar cheirar pó. É isso: quem lê não precisa cheirar pó. Nunca tinha pensado nisso. A poesia do Alberto Caeiro me ensina a ver, me faz criança e fico parecido com árvores e regatos. Agora, essa maravilha de delicadeza e pureza, do Gabriel velho com dores no peito e medo de morrer: Memórias de minhas putas tristes. Li, ri, me comovi, fiquei leve e fiquei triste de o ter lido porque agora não poderei ter o prazer de lê-lo pela primeira vez. Pena que vocês, não-leitores, sejam castrados para os prazeres que moram nos livros. Mas, se quiserem, tem remédio...
Rubem Alves é escritor, teólogo e educador - Publicado 25/01/2009
http://www.cpopular.com.br/mostra_noticia.asp?noticia=1616941&area=2220&authent=6DB8CFE83762126D9ACFCA3740124F
sábado, 24 de janeiro de 2009
Por que não mudar o DNA humano?
O filósofo de Oxford defende
Peter Moon
Nick (ou Niklas) Bostrom é um dos mais jovens e brilhantes pensadores do futuro tecnológico da humanidade. Em 2008, ele coorganizou, ao lado de Sir Martin Rees, o presidente da Real Sociedade britânica, o livro Global catastrophic risks (Riscos de catástrofes globais), em que se discutem as diversas ameaças à humanidade. Em seu novo livro, Human enhancement (Aperfeiçoamento humano, no prelo), Bostrom defende o uso da manipulação gênica por todos os que queiram expandir sua memória e inteligência. No dia em que essa tecnologia estiver disponível, por que não usá-la? Em favor dessa tese, Bostrom investe contra os defensores das terapias “naturais” para obter uma vida melhor e mais saudável. São os mesmos que atacam a engenharia genética como insensata e cheia de riscos.
ENTREVISTA - NICK BOSTROM
QUEM É
ÉPOCA – Superpopulação, poluição, destruição ambiental, proliferação nuclear... Corremos o risco de nos autodestruir?
ÉPOCA – Quais são elas?
ÉPOCA – O senhor fundou a Associação Trans-Humanista Mundial. O que é isso?
ÉPOCA – Ter uma vida mais saudável não é o suficiente para viver mais e melhor?
ÉPOCA – Então, o senhor é a favor disso?
ÉPOCA – Será possível ampliar a inteligência das pessoas?
ÉPOCA – Há algum exemplo em seu futuro livro, Human enhancement?
“Por que não melhorar geneticamente nossa capacidade de concentração ou de memória, se tivermos os meios a nossa disposição?”
ÉPOCA – Sobre a inteligência artificial, muitos trans-humanistas creem que as máquinas serão conscientes até 2030.
ÉPOCA – Caso as máquinas se tornem inteligentes, quais serão as consequências?
ÉPOCA – A superinteligência controlará nossa vida, como no filme Matrix?
ÉPOCA – A nanotecnologia também envolve riscos. Ela pode derivar em armas de destruição maciça.
O CORVO
Publicado pela primeira vez em 1845, The Raven é o mais popular – e o mais prestigiado – poema de Edgar Allan Poe. Compare a seguir a primeira estrofe nas versões em português de Machado de Assis, Fernando Pessoa e aquela que costuma ser apontada como a melhor, do mineiro Oscar Mendes.
Por Edgar Allan Poe
Once upon a midnight dreary,
while I pondered, weak and weary,]
Over many a quaint and curious
volume of forgotten lore,]
While I nodded, nearly napping,
suddenly there came a tapping,]
As of some one gently rapping,
rapping at my chamber door.]
“ ‘Tis some visitor”, I muttered,
“tapping at my chamber door –]
– Only this and nothing more.”
Por Machado de Assis
Em certo dia, à hora, à hora
Da meia-noite que apavora,
Eu, caindo de sono e exaustode fadiga,]
Ao pé de muita lauda antiga,
De uma velha doutrina, agoramorta,]
Ia pensando, quando ouvi à porta
Do meu quarto um soar
devagarinho,]
E disse estas palavras tais:
“É alguém que me bate à porta
de mansinho;]
Há de ser isso e nada mais.”
Por Fernando Pessoa
Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste,
Vagos, curiosos tomos de ciências
ancestrais,]
E já quase adormecia, ouvi o que
parecia]
O som de alguém que batia
levemente a meus umbrais.]
“Uma visita”, eu me disse, “está
batendo a meus umbrais.]
É só isto, e nada mais.”
Por Oscar Mendes
Foi uma vez: eu refletia, à
meia-noite erma e sombria,]
a ler doutrinas de outro tempo em
curiosíssimos manuais,]
e, exausto, quase adormecido, ouvi
de súbito um ruído,]
tal qual se houvesse alguém batido
à minha porta, devagar.]
“É alguém” – fiquei a murmurar – “que bate à porta, devagar;
sim, é só isso e nada mais.”
http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jspuf=1&local=1&source=a2380089.xml&template=3898.dwt&edition=11557§ion=1029
A Ecologia Planetária de FRITJOF CAPRA
"Um outro mundo é possível". "Sim, nós podemos". A primeira afirmativa, quase que uma palavra de ordem nos lugares onde os movimentos sociais se encontram, surgiu no Fórum Social Mundial (FSM), evento internacional organizado para celebrar a diversidade, discutir e buscar novas alternativas para resolver os problemas sociais. A segunda é o slogan da histórica campanha que elegeu o democrata Barack Obama, presidente dos Estados Unidos. Assim, parafraseando os dois momentos, o físico austríaco Fritjof Capra encerrou seu discurso no Fórum Internacional de Energias Renováveis e Sustentabilidade - a Ecopower, realizada em Florianópolis, em novembro último. Como pensador e ambientalista engajado que é, tem todas as prerrogativas para propor caminhos certeiros para atingirmos a tão sonhada sustentabilidade.
Capra é, sem dúvida, um dos nomes mais relevantes na divulgação dos progressos da ciência, da filosofia e principalmente da ecologia em nossos dias. Em 1966, aos 27 anos, ele obteve seu título de Doutor em Física pela Universidade de Viena. Três anos mais tarde, no verão de 1969, teve uma "experiência culminante". Sentado em frente ao mar, numa praia da Califórnia, quando observa as ondas e refletia sobre os vários movimentos rítmicos da natureza - o vai-e-vem do oceano, as batidas do coração e o ritmo da respiração, associou-os ao que ele sabia, intelectualmente, sobre a "estrutura" física da matéria: "Neste momento, subitamente, apercebi-me intensamente do ambiente que me cercava: este se afigurava a mim como se participasse, em seus vários níveis rítmicos, de uma gigantesca dança cósmica. Eu sabia, como físico, que a areia, as rochas, a água e o ar ao meu redor eram constituídos de moléculas e átomos em vibração constante. Tudo isso me era familiar em razão de minha pesquisa com a Física de alta energia. Mas até aquele momento, porém, tudo isso me chegara apenas através de gráficos, diagramas e teorias matemáticas. Sentando na praia, senti que minhas experiências anteriores subitamente adquiriam vida". Dalí surgiu o "Tao da Física", livro que tornou Capra mundialmente famoso. A seguir, a Revista JB Ecológico selecionou uma série de pensamentos sobre este grande mestre de nosso tempo.
Confira:
Ciência x Misticismo
"Este novo desenho inclui a agricultura orgânica, clusters industriais ecológicos e a mudança de uma economia orientada pelos produtos para uma guiada para os serviços. Atualmente já existem edifícios que produzem mais energia do que consomem e que não geram resíduos; assim como células a combustível de hidrogênio, que incorporam os princípios básicos da ecologia: pequenas escalas, não poluidoras e nem geradoras de resíduos."
"Existe uma ciência chamada agroecologia, que estuda processos que rejuvenescem o solo, estimulando a vida dos microorganismos. O que este tipo de agricultura também faz, e isto não é muito conhecido, é puxar carbono da atmosfera. Os microorganismos são vivos, feitos de carbono. Carbono é o mais importante átomo na química da vida. Todas as moléculas, carboidratos, proteínas, lipídios, têm esqueletos de carbono, então carbono é o esqueleto da vida. Se você cria um solo que é muito vivo, com muitos microorganismos, está concentrando carbono, que vem do CO2 do ar."
"Uma das melhores medidas contra o aquecimento global é a agricultura orgânica. Que também é um trabalho muito intensivo, emprega muitas pessoas em pequenas propriedades, e por isso estimula a comunidade, aumenta a renda dos agricultores e breca a migração para as cidades. Os moradores do campo não vêm para São Paulo e para outras grandes cidades por vontade própria. Eles são levados a isso. O governo e as organizações deveriam investir em agricultura sustentável, pois é a melhor medida contra as migrações para as cidades. O outro elemento é a educação, porque você não pode fazer agricultura orgânica sem saber do que se trata, sem saber ecologia e técnicas básicas. Educação e agricultura orgânica são as melhores maneiras de fazer nossas cidades habitáveis novamente."
http://ee.jornaldobrasil.com.br/reader/zomm.asp?pg=jbecologico_82/103266