Juremir Machado da Silva*
Crédito: ARTE PEDRO SCALETSKY
Quanto mais o tempo passa, mais pensamos nesse clichê: como passa o tempo. Para as crianças, o tempo é uma eternidade. Para os idosos, próximos da eternidade, o tempo é terrivelmente efêmero. O ano de 2011, para quem está deixando de ser quarentão como eu, passou como um fim de semana prolongado: alguns chopes, um espumante, uma garrafa de tinto, uma picanha, algumas alegrias, uma grande tristeza, a perda de uma pessoa querida, e lá se foi deixando aquela sensação paradoxal: que bom, já estava ficando comprido e chato, que venha a segunda-feira. Fica sempre aquele certo vazio e um pouco de ressaca. Como o tempo é uma convenção, salvo para o nosso corpo, tudo recomeça sem de fato ter parado. Mais uma vez o Internacional não foi campeão brasileiro, mais uma vez João Gilberto furou, o que já não é uma bossa nova, mais uma vez a corrupção brasileira frequentou as manchetes dos jornais semanalmente. Nada de muito novo no front.
As novidades, porém, existiram. Dilma Rousseff instalou-se no Palácio do Planalto e conseguiu mostrar que sabe fazer faxina, embora só tenha tomado a iniciativa de olhar embaixo dos tapetes depois que a mídia passou o dedo nas poltronas governamentais e abriu um rastro de sujeira. O acontecimento internacional mais bombástico foi certamente a execução de Bin Laden pelos americanos no Paquistão. No ano em que Julian Assange continuou estuprando a diplomacia dos Estados Unidos e revelando a obscenidade do sistema no seu Wikileaks, até cansar e jogar a toalha para tentar escapar da neutralidade da Justiça, as imagens da morte do líder da Alcaida permaneceram sigilosas. Em compensação, as da eliminação de Muammar Kadhafi correram o mundo virtual indicando como a civilização trata a barbárie. Já as redes sociais detonaram a "primavera árabe", que ainda não se transformou num verão da democracia e corre o risco de virar logo um outono e, em seguida, se depender dos novos donos do poder, um novo e interminável inverno. A humanidade, pelo jeito, continua a mesma, o que prova, ao mesmo tempo, a sua estabilidade e sua instabilidade.
No apagar das luzes de 2011, o Brasil resolveu instalar uma comissão da verdade para analisar as mentiras da sua última ditadura. Tudo de acordo com a vocação nacional para passar a borracha, o que, noutro sentido, foi feito por torturadores que ainda andam por aí sem-vergonha, punição ou qualquer incômodo. Ana Paula Arósio não me fez um 21 e, bem pensado, não tem importância, pois o tempo do 21 já passou e o da Arósio, se o leitor permite esta pontinha de despeito, também está passando. Nos dez anos dos atentados de setembro de 2001, que atingiram, conforme outro clichê, o coração do império, lembramos que a mídia havia anunciado que o mundo nunca mais seria o mesmo. Como não havia sido consultado, o mundo permaneceu igual, sem que a mídia, também inalterável, tenha notado. Parece que 2012 será de grandes novidades no Brasil. Especula-se que já em janeiro dois ministros sejam defenestrados por suspeita de corrupção. Nada como mudar de ano para mudar de hábitos. Prometo que em 2012 não falarei bem de ninguém.
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* Sociólogo. Prof. Universitário. Escritor. Tradutor. Colunista do Correio do Povo
juremir@correiodopovo.com.br
Fonte: Correio do Povo, 28/12/2011
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