terça-feira, 10 de maio de 2016

Decifrar o verdadeiro código da Vinci

Uma equipa internacional quer usar técnicas de ADN para identificar os restos mortais de Leonardo da Vinci, e acredita que será possível reconstituir a sua aparência física.

Chama-se Projecto Leonardo e propõe-se isolar material genético de Leonardo da Vinci, numa operação que poderá envolver o Papa, a Rainha de Inglaterra e o fundador da Microsoft, Bill Gates. Dito assim parece o argumento para mais um best seller de Dan Brown, mas é uma ambiciosa missão científica, que começou a ser preparada em 2014, e na qual trabalha uma vasta equipa internacional e interdisciplinar, que inclui geneticistas, microbiólogos, historiadores, antropólogos, arqueólogos, arquitectos e outros investigadores.

O primeiro objectivo é confirmar a autenticidade dos presumíveis restos mortais daquele que foi o maior génio do Renascimento. Se a operação for coroada de sucesso, os cientistas envolvidos acreditam que poderão criar um modelo a três dimensões daquela que terá sido a aparência física de Leonardo, e ficar a saber mais sobre a saúde, os hábitos alimentares, ou mesmo a acuidade visual do génio renascentista.

Inicialmente financiado pela Fundação Richard Lousbery, de Washington, uma organização filantrópica que atribui prémios em Medicina e Biologia e apoia o desenvolvimento da ciência e tecnologia, o Projecto Leonardo engloba hoje instituições como o Instituto de Paleontologia Humana de Paris, o Instituto Internacional de Ciências Humanas e o Laboratório de Antropologia Molecular e Paleogenética de Florença, o Museu Ideale Leonardo da Vinci, em Vinci, terra natal do artista, o Laboratório de Identificação Genética de Granada, em Espanha, a Universidade Rockefeller, de Nova Iorque, ou o Instituto J. Craig Venter, na Califórnia, pioneiro na sequenciação do genoma humano. E a equipa inclui ainda alguns dos especialistas do FBI que trabalharam na identificação das vítimas dos atentados de 11 de Setembro de 2001.

No final da sua carreira, Leonardo mudou-se para França, a convite do rei Francisco I, e viveu e trabalhou de 1516 até à sua morte – no dia 2 de Maio de 1569 – no palacete Clos Lucé, que hoje acolhe um museu dedicado ao seu mais célebre locatário e que se situa a 500 metros do castelo real de Amboise.

O pintor terá sido enterrado na igreja próxima de Saint-Florentin, demolida na época napoleónica, sendo as suas pedras utilizadas para reparar a fortaleza. O sítio onde a igreja se erguia foi depois escavado e encontrou-se um esqueleto completo e fragmentos de uma inscrição em pedra com letras compatíveis com o nome de Leonardo. Hoje sepultados na capela de Saint-Hubert, junto ao castelo de Amboise, pensa-se que estes ossos correspondam aos restos mortais de Da Vinci. Uma hipótese que os cientistas do Projecto Leonardo querem confirmar ou invalidar de vez com o recurso ao ADN, mas quebrar este verdadeiro código da Vinci pode vir a revelar-se uma tarefa espinhosa.   

A equipa está a avançar simultaneamente em várias frentes, por exemplo analisando com raios x o chão de uma antiga igreja italiana em busca dos túmulo do pai e de outros parentes de Leonardo, ou tentando reunir amostras de ADN de descendentes actuais do pai do artista. Uma investigação genealógica que durou quatro décadas identificou 35 descendentes vivos em Itália, incluindo o nonagenário realizador Franco Zefirelli, nascido em 1923 em Florença.

Outro objectivo é analisar os seus diários manuscritos – alguns deles na posse do Vaticano, de Isabel II de Inglaterra ou de Bill Gates –, à procura de impressões digitais que possam conter vestígios de ADN, a comparar depois com as amostras recolhidas dos seus presumíveis restos mortais.
A busca de impressões digitais vai também abranger algumas das suas pinturas, e a equipa do Instituto J. Craig Venter vem pesquisando outras obras de arte da época, em mãos de privados, para tentar aperfeiçoar técnicas de extracção e análise de ADN. Neste momento, não se sabe ainda se a passagem do tempo e as técnicas usadas nos restauros não terão apagado definitivamente quaisquer eventuais vestígios de ADN que pudessem ter existido nas telas de Leonardo.  

Os responsáveis do projecto querem concluí-lo até 2019, quando se assinalará o 500.º aniversário da morte de da Vinci, e acreditam que até lá conseguirão desenvolver um perfil genético do artista suficientemente extenso para permitir perceber melhor características que podem ter tido influência significativa na sua arte, como a acuidade visual.

Jesse Ausabel, vice-presidente da Fundação Richard Lounsbery, comenta: “Acho que todos na equipa acreditam que Leonardo, que se dedicou a fazer avançar a arte e a ciência, que se deliciava com charadas e cujos diversos talentos e intuições continuam a enriquecer a sociedade cinco séculos após a sua morte, teria dado as boas-vindas a esta iniciativa – e se hoje fosse vivo, provavelmente teria querido dirigi-la”.
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Reportagem por

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