Uma equipa internacional quer usar técnicas de ADN para
identificar os restos mortais de Leonardo da Vinci, e acredita que será
possível reconstituir a sua aparência física.
Chama-se Projecto Leonardo e propõe-se isolar material genético de
Leonardo da Vinci, numa operação que poderá envolver o Papa, a Rainha de
Inglaterra e o fundador da Microsoft, Bill Gates. Dito assim parece o
argumento para mais um best seller de Dan Brown, mas é uma
ambiciosa missão científica, que começou a ser preparada em 2014, e na
qual trabalha uma vasta equipa internacional e interdisciplinar, que
inclui geneticistas, microbiólogos, historiadores, antropólogos,
arqueólogos, arquitectos e outros investigadores.
O primeiro objectivo é confirmar a autenticidade dos presumíveis restos mortais daquele que foi o maior génio do Renascimento.
Se a operação for coroada de sucesso, os cientistas envolvidos
acreditam que poderão criar um modelo a três dimensões daquela que terá
sido a aparência física de Leonardo, e ficar a saber mais sobre a saúde,
os hábitos alimentares, ou mesmo a acuidade visual do génio
renascentista.
Inicialmente financiado pela Fundação Richard
Lousbery, de Washington, uma organização filantrópica que atribui
prémios em Medicina e Biologia e apoia o desenvolvimento da ciência e
tecnologia, o Projecto Leonardo engloba hoje instituições como o
Instituto de Paleontologia Humana de Paris, o Instituto Internacional de
Ciências Humanas e o Laboratório de Antropologia Molecular e
Paleogenética de Florença, o Museu Ideale Leonardo da Vinci, em Vinci,
terra natal do artista, o Laboratório de Identificação Genética de
Granada, em Espanha, a Universidade Rockefeller, de Nova Iorque, ou o
Instituto J. Craig Venter, na Califórnia, pioneiro na sequenciação do
genoma humano. E a equipa inclui ainda alguns dos especialistas do FBI
que trabalharam na identificação das vítimas dos atentados de 11 de
Setembro de 2001.
No final da sua carreira, Leonardo mudou-se para
França, a convite do rei Francisco I, e viveu e trabalhou de 1516 até à
sua morte – no dia 2 de Maio de 1569 – no palacete Clos Lucé, que hoje
acolhe um museu dedicado ao seu mais célebre locatário e que se situa a
500 metros do castelo real de Amboise.
O pintor terá sido
enterrado na igreja próxima de Saint-Florentin, demolida na época
napoleónica, sendo as suas pedras utilizadas para reparar a fortaleza. O
sítio onde a igreja se erguia foi depois escavado e encontrou-se um
esqueleto completo e fragmentos de uma inscrição em pedra com letras
compatíveis com o nome de Leonardo. Hoje sepultados na capela de
Saint-Hubert, junto ao castelo de Amboise, pensa-se que estes ossos
correspondam aos restos mortais de Da Vinci. Uma hipótese que os
cientistas do Projecto Leonardo querem confirmar ou invalidar de vez com
o recurso ao ADN, mas quebrar este verdadeiro código da Vinci pode vir a revelar-se uma tarefa espinhosa.
A
equipa está a avançar simultaneamente em várias frentes, por exemplo
analisando com raios x o chão de uma antiga igreja italiana em busca dos
túmulo do pai e de outros parentes de Leonardo, ou tentando reunir
amostras de ADN de descendentes actuais do pai do artista. Uma
investigação genealógica que durou quatro décadas identificou 35
descendentes vivos em Itália, incluindo o nonagenário realizador Franco
Zefirelli, nascido em 1923 em Florença.
Outro objectivo é analisar
os seus diários manuscritos – alguns deles na posse do Vaticano, de
Isabel II de Inglaterra ou de Bill Gates –, à procura de impressões
digitais que possam conter vestígios de ADN, a comparar depois com as
amostras recolhidas dos seus presumíveis restos mortais.
A busca
de impressões digitais vai também abranger algumas das suas pinturas, e a
equipa do Instituto J. Craig Venter vem pesquisando outras obras de
arte da época, em mãos de privados, para tentar aperfeiçoar técnicas de
extracção e análise de ADN. Neste momento, não se sabe ainda se a
passagem do tempo e as técnicas usadas nos restauros não terão apagado
definitivamente quaisquer eventuais vestígios de ADN que pudessem ter
existido nas telas de Leonardo.
Os responsáveis do projecto
querem concluí-lo até 2019, quando se assinalará o 500.º aniversário da
morte de da Vinci, e acreditam que até lá conseguirão desenvolver um
perfil genético do artista suficientemente extenso para permitir
perceber melhor características que podem ter tido influência
significativa na sua arte, como a acuidade visual.
Jesse Ausabel,
vice-presidente da Fundação Richard Lounsbery, comenta: “Acho que todos
na equipa acreditam que Leonardo, que se dedicou a fazer avançar a arte e
a ciência, que se deliciava com charadas e cujos diversos talentos e
intuições continuam a enriquecer a sociedade cinco séculos após a sua
morte, teria dado as boas-vindas a esta iniciativa – e se hoje fosse
vivo, provavelmente teria querido dirigi-la”.
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