Silvia Pontes*
De quem é o punhal da violência
De quem é o punhal da violência
quando nossas digitais
também estão na faca?
As mais recentes notícias sobre o envolvimento de jovens da classe média com o tráfico de drogas e armamentos apontam para uma questão crucial que afeta toda a sociedade e vem se ampliando: o valor da própria vida.
É fácil condenarmos a violência que ameaça a segurança da sociedade da qual fazemos parte em relação a um determinado grupo. Mas de quem é o punhal da violência contra a sociedade quando nossas impressões digitais também estão na faca?
O problema das drogas ignora fronteiras de classes. Essas fronteiras são construídas pelo medo, pela indiferença, pela arrogância e pela insegurança que fazem as pessoas se separarem umas das outras. Numa sociedade em que o ser humano perde a confiança no próximo a violência prospera, assim como prosperam todos os mecanismos que contribuem para que a segurança e o poder sejam garantidos com mais armas, mais medo, mais violência.
Se aquilo do qual mais fugimos na vida costuma vir ao nosso encontro, exigindo a nossa presença, é cada vez mais imprescindível haver um enfrentamento sério e destemido da situação. Nesse enfrentamento percebemos que há mais coisas em comum entre os jovens da classe média alta e aqueles que circulam pelo tráfico nos redutos das favelas, também portando drogas e armas.
Vamos evoluir ao ponto de também atingirmos o nível de facções de classe média alta como acontece no narcotráfico da coca? Ainda não chegamos a esse ponto. Ainda... é bom lembrar. Mas parece haver um caminho aberto e em expansão para esta possibilidade.
Existe, por outro lado, um caminho pelo qual podemos (e precisamos) compreender o lugar que a droga ocupa na vida do ser humano, especialmente na vida dos jovens de todas as classes. A curiosidade, o exemplo e o desafio costumam inspirar os jovens a buscarem drogas e situações de risco. A necessidade de sentir-se visível em seu grupo de convivência, no qual descobre seu valor, pode levar o jovem a buscar isso fora de casa, sobretudo quando sua família é uma familha, onde as pessoas mal se conhecem, não dialogam, não se tocam. A ausência e/ou falência das figuras parentais, responsáveis pela presença da lei, aqueles princípios básicos que permitem dar ao indivíduo limites e compreensão de sua importância no mundo e para o mundo podem ser fatores significativos na busca dos jovens por uma visibilidade junto ao poder fornecido pelo tráfico.
Os jovens carecem de líderes que os orientem, de espelhos parentais nos quais possam começar a perceber a importância do valor da própria vida, para conseguirem fazer escolhas com consciência. O que espelhamos para os nossos filhos, por meio de palavras e, sobretudo, atitudes no dia a dia?
Lembrando Virginia Satir:
"Quero te amar sem sufocar.
Juntar-me a ti sem invadir.
Estimar-te sem julgar.
Convidar-te sem insistir.
Criticar-te sem te acusar.
Ajudar-te sem te afrontar.
Deixar-te sem culpas.
Se eu puder ter o mesmo de ti,
juntos podemos nos integrar".
*Silvia Pontes é coordenadora especial de Prevenção à Dependência Química da prefeitura do Rio de Janeiro. Bióloga.
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