terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Uma neurocientista no trapézio

SUZANA HERCULANOGHOUZEL*
Imagem da Internet

 
Lançar-se em atividades novas
traz como bônus
a satisfação
e a injeção de autoconfiança

TENTAR COISAS novas envolve, pelas definições do cérebro, correr riscos: abandonar o usual, a rotina, e se lançar em novas paragens sem garantia de sucesso.
Algumas novidades são bastante inofensivas, como andar do outro lado da rua ou mudar de cabeleireiro.
Outras são mais perigosas, mas expandem nossos horizontes e mudam a nossa vida, como aprender a nadar, andar de bicicleta ou dirigir.
Além de expandir nosso repertório de talentos, aceitar se lançar em atividades novas ainda traz uma vantagem bônus: a satisfação da conquista e, com ela, uma injeção de autoconfiança -que, por sua vez, nos impele a continuar experimentando e testando (e expandindo) nossas habilidades.
Foi assim, movida pela curiosidade do será-que-eu-consigo, que me meti às vésperas do Ano-Novo a fazer uma aula de trapézio voador.
As crianças haviam acabado de experimentar e adorar a primeira aula, então arranjei tempo e fui à segunda aula com elas. É verdade que a coisa toda havia sido ideia minha: uma boa atividade para as férias e que ainda aumentaria a autoconfiança deles.
E, assim, a neurocientista de plantão amarrou o cinto de segurança, subiu a escadinha e foi, lááá no alto, encarar o trapézio voador.
É muito interessante notar o próprio coração palpitando quando se sabe direitinho de onde vem a taquicardia: da amígdala do cérebro registrando a altura, do córtex cingulado avaliando os riscos da possível ideia de jerico de se lançar no ar agarrada a uma barrinha, se dependurar de cabeça para baixo, se desvirar e, então, se jogar na rede de segurança.
Alarmes tocam no cérebro e fora dele para chamar a atenção para o risco iminente -que, no entanto, é solenemente ignorado se houver determinação pré-frontal mais forte. E foi assim que eu pulei.
Ah, a excitação de se descobrir capaz! Não apenas não caí do trapézio, como consegui me dependurar de cabeça para baixo (fazendo menos força do que esperava), estender os braços na hora certa e ser apanhada pelo outro trapezista em pleno ar.
Que sensação deliciosa voar e pousar: ao me perceber viva, inteira e vitoriosa, meu cérebro se premiou com uma baita injeção de dopamina que, agindo sobre meu córtex órbito-frontal e hipocampo, tornou a experiência não só incrivelmente prazerosa como inesquecível. Vencer desafios é uma recompensa incrível, só alcançada quando se aceita o risco da queda.
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*SUZANA HERCULANO-HOUZEL, neurocientista, é professora da UFRJ e autora de "Pílulas de Neurociência para uma Vida Melhor" (ed. Sextante) e do blog www.suzanaherculanohouzel.com
Fonte: Folha online, 11/01/2011

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