Juremir Machado da Silva*
Crédito: ARTE PEDRO LOBO SCALETSKY
Era uma festa só. Muitos dos nossos liberais amavam o Chile do ditador Pinochet. Quando o tirano morreu, o jornal Estado de. S. Paulo ficou de luto e publicou uma capa com uma tarja preta em torno da foto do ídolo. Algo assim. O Chile era apresentado como um modelo econômico a ser seguido. Os grandes heróis dos nossos neoliberais foram Pinochet, Margareth Thatcher e Ronald Reagan. Eles eram feios, duros, velhos e defensores do Estado mínimo. Só os dois últimos qualificativos são pejorativos. Opa! Pinochet usou o máximo de Estado para incrementar políticas econômicas maravilhosas aos olhos dos apaixonados pelo Estado mínimo. Foi cantado em prosa e verso por gente ainda disposta a dispensar a democracia se a economia estiver indo bem e sem greves incômodas.
Como é difícil conciliar democracia, respeito à Constituição e negócios. No Brasil, volta e meia queremos passar por cima da "Carta Magna". Qualquer criança vê que o tal exame de ordem, imposto pela OAB, é inconstitucional. Assim como é, infelizmente, inconstitucional a Lei da Ficha Limpa. Fere a presunção de inocência. Nossa pressa leva, muitas vezes, a apostar em atalhos perigosos. O modelo chileno deu os doces. Fez da educação um grande negócio. No Chile de Pinochet, privatizar era a solução para tudo. Uma solução associada a outro mecanismo admirado silenciosamente, ou nem tanto, pelos nossos empresários saudosos da ditadura de 1964: o porrete contra movimentos sociais. O sonho dos nossos neoliberais sempre foi implantar aqui uma mescla de modelo chinês e chileno: o chi-chi. Uma cacaca. Privatização e repressão chilenas com disciplina e custo de trabalho chineses. E o Estadão como diário oficial.
"Alguém precisa explicar essa relação
entre mulheres jovens e bonitas com o comunismo.
Em contrapartida, ninguém precisa explicar
a relação entre velhos feios
com o capitalismo e
com as ditaduras."
Já era. Os estudantes estão nas ruas do Chile. São comandados por uma deusa de 23 anos, olhos verdes, piercing de argola no nariz e sobrenome de poeta, Camila Vallejo. Ele é comunista. Um comunismo com novo design e formas mais sinuosas. A moça é mesmo marxista. E tem namorado. Só este último dado é que incomoda agora muitos chilenos. O que querem os jovens que seguem Camila como cachorrinhos atrás da dona? Educação pública. O iluminado modelo chileno faz com que cada jovem ao terminar a faculdade esteja endividado até o pescoço. Jovem tem pouca influência. Para ser deputado, precisa ter 35 anos de idade. É uma gerontocracia. Certamente por causa disso, a galera resolveu sair às ruas para pisotear o sonho dos pinochetistas. Praticam novas modalidades de protesto como o "beijaço". O governo reage à moda antiga: desce o pau e fala em negociação. A resposta não se faz esperar.
Alguém precisa explicar essa relação entre mulheres jovens e bonitas com o comunismo. Em contrapartida, ninguém precisa explicar a relação entre velhos feios com o capitalismo e com as ditaduras. Maniqueísmo? Provavelmente. Foi preciso aparecer uma guria linda para chamar a atenção do mundo para as falácias do modelo chileno. Em Palomas, certa época, na Rede Baita Sol, era proibido falar mal do Chile. O chefe não deixava. Uau!
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* Sociólogo. Escritor. Tradutor. Prof. Universitário. Cronista do Correio do Povo.
Fonte: Correio do Povo on line, 25/07/2011
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