quinta-feira, 28 de julho de 2011

Em nome da qualidade

Novo diretor de Regulação do MEC
defende aprofundar as transformações
 no sistema de avaliação e acena
com a possibilidade de mudanças
nos instrumentos de regulação

No primeiro andar do prédio do Ministério da Educação (MEC), o espaço que antigamente era ocupado pela Secretaria de Educação à Distância foi ocupado por novas cara e também por uma nova missão. É lá que funciona a Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior, criada no início de 2011 e oficializada no dia 1º de junho. Quem assume a tarefa é o ex-chefe de gabinete do ministro Fernando Haddad e professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Luís Fernando Massonetto.
Em entrevista à Ensino Superior, o secretário explica que a criação de um órgão específico no ministério para cuidar da regulação é consequência da sofisiticação que o processo ganhou. Ele acredita que com a estrutura será possível dar mais agilidade e qualidade aos processos. "Nosso objetivo principal é a promoção de qualidade sem deixar de atender a expectativa do regulado, de um processo célere, transparente, do cumprimento das regras do jogo", afirma. Massonetto fala ainda das possíveis mudanças estudadas pela secretaria - inclusive a de encurtar os prazos de análise dos processos - e defende que a regulação é salutar para todo o sistema.

Ensino Superior: Por que o ministério decidiu criar uma secretária específica para cuidar da regulação?
Luís Fernando Massonetto: A secretaria surge em um momento importante em que os marcos regulatórios vão se tornando mais sofisticados e passam a exigir estruturas dedicadas exclusivamente à regulação. É uma busca por maior inteligência na regulação e por uma maior eficiência na análise dos processos, sem perder do horizonte o que anima nosso trabalho que á a garantia da promoção da qualidade do ensino superior no país.

ES: A Sesu estava sobrecarregada com os processos de regulação?
No lugar de falar de sobrecarga, eu prefiro falar na necessidade de uma estrutura especifica, um órgão que pensasse somente a regulação. É um movimento natural dentro da própria administração pública a criação de estruturas especializadas a partir de um determinado momento quando a gente sente que as estruturas tradicionais ficam saturadas, até pelo volume de trabalho e a quantidade de processos que tem que administrar. Esse processo é natural e é decorrente do próprio êxito do modelo regulatório implementado após a lei dos Sinaes. A secretaria surge não para corrigir uma ineficiência nesse processo, mas para aprofundar as transformações que vêm sendo feitas.

ES: Como a secretaria pretende equilibrar a tarefa da regulação com as demandas das instituições, especialmente do setor privado?
A regulação trata de toda a educação superior, e o nosso trabalho tem sempre em vista, por um lado, o interesse público que é o da promoção da qualidade. O que está por trás de todo o sistema de regulação é a missão que a Constituição Federal nos confere de garantir a qualidade da educação superior. Por outro lado, a regulação não pode perder de vista uma expectativa do regulado na organização dos seus negócios, da sua atividade. Então o nosso objetivo principal é a promoção de qualidade sem deixar de atender a expectativa do regulado, de um processo célere, transparente, do cumprimento das regras do jogo. A regulação é sempre montada a partir de regras previsíveis e um papel importante da secretaria é dar transparência ao cumprimento dessas regras.

ES: Qual é a sua primeira missão ou projeto à frente da secretaria?
Não é uma tarefa das mais simples você reunir estruturas de secretarias diferentes, então a primeira tarefa foi pensar essa inteligência comum de regulação. Ao mesmo tempo se pensa um modelo de administração mais eficiente dos processos regulatórios. Há intenção de reduzir os prazos de análise dos processos, de ter esses prazos pactuados e que eles sejam conhecidos pelo setor. Isso envolve uma reestruturação interna que é o que a estamos fazendo neste momento na secretaria. A mensagem que eu passaria para o setor é essa necessidade de estruturar uma regulação que seja ao mesmo transparente e eficiente no cumprimento dos prazos. Mas também eficiente no atingimento de seus resultados. O maior desafio que a secretaria terá é equilibrar uma análise eficiente dos processos com a qualidade.

ES: Há alguma previsão de mudança no Sinaes? Uma crítica das instituições de ensino é o peso excessivo do Enade no processo de avaliação.
Nosso sistema de avaliação hoje é bastante sofisticado e é composto por indicadores que levam em conta várias dimensões. Essa crítica sobre o peso exacerbado do Enade olha somente para um dos aspectos do Sinaes. A Conaes acabou de aprovar os novos instrumentos de avaliação que deixam claro o equilíbrio existente entre a avaliação da instituição, a avaliação do curso e aquela procedente da relação do ensino - aprendizagem que é a medida pelo Enade. Para cada medida, conceito, índice, você tem um peso maior ou menor de uma dessas dimensões.

ES: Em junho a secretaria fez mais um trabalho de supervisão especial suspendendo 11 mil vagas em cursos de direito. Medidas semelhantes já foram tomadas em relação às graduações em pedagogia e medicina. Alguma outra área está na mira do ministério?
A gente tem um olhar permanente sobre a qualidade, mas o próprio Enade seleciona os cursos que durante determinado ciclo merecem uma atenção especial, como foi o caso desses cursos. Assim, isso vai acontecer com os demais cursos avaliados, sucessivamente. Isso não significa que a secretaria perde qualquer tipo de olhar mais atento para os demais cursos. Mas a ideia de ciclo é uma ideia de foco nos cursos que acabaram de receber uma avaliação especifica. Há todo um encadeamento lógico dos indicadores de qualidade que por si constituem um conjunto importante para o ministério atuar. Uma instituição que por ventura tenha tido suas vagas reduzidas provisoriamente pode tê-las retomadas obtendo um resultado satisfatório no conceito de curso ou no conceito preliminar de curso. A medida cautelar sempre tem um caráter provisório, pode ser confirmar ou ser revista.

ES: Mas há uma intenção do MEC em atuar especificamente em cursos com saturação de mercado ainda no processo de autorização?
A secretaria vem estudando a fixação de um limite inicial de vagas para cursos com maior saturação de mercado. O que não significa que isso seja uma regra absoluta. Há hoje estudos que indicam que uma redução de vagas em alguns cursos tendem a elevar a qualidade. O aluno tem a possibilidade de usufruir melhor da estrutura e do corpo docente. Muitas vezes a massificação feita com um número excessivo de alunos ela satura a infraestrutura e o próprio corpo docente. Essa medida pode ajudar o aluno a ter um melhor aproveitamento daquilo que a instituição tem para oferecer. Essa indicação, combinada com essa saturação do mercado, nos leva à política de possivelmente reduzir as vagas de entrada em alguns cursos.

ES: A nova secretaria absorve também a regulação dos cursos a distância e os tecnológicos, tarefa que antes era de responsabilidade de outras áreas do ministério. Pensa-se em criar regras específicas para essas modalidades?
Esses cursos já estão na lógica da regulação, todos já seguem a orientação do Sinaes guardadas as especificidades, especialmente em relação a EAD. Mas o mais importante na reunião dessas três diretorias é a possibilidade de criar uma inteligência comum, trabalhando com a possibilidade de análise comum de dados e unificação da supervisão. É um ganho tanto para o regulador como para o próprio regulado que identifica no ministério uma única autoridade regulatória em relação a todos os cursos independente da modalidade.

ES: No caso dos cursos tecnológicos, as instituições de ensino apontam a necessidade de adequar alguns parâmetros da avaliação, como a titulação do corpo docente, que hoje leva em conta os mesmos critérios adotados para o bacharelado. Há previsão de mudanças desses instrumentos?
Essa é uma demanda que já foi levada à Conaes e ao Inep e a secretaria é bastante sensível a ela. De fato parece bastante razoável a necessidade de adequação dos instrumentos de avaliação para se levar em conta esse dado que é específico dos tecnológicos. Talvez a métrica dos cursos tradicionais de bacharelado não seja a melhor para a avaliação dessa situação especifica dos cursos tecnológicos. A gente tem que pensar em uma regra talvez adaptada para esses cursos.

ES: Como o senhor avalia o momento atual do sistema de ensino superior a partir do crescimento dos processos avaliativos e regulatórios?
É importante afirmar que a regulação é uma conquista tanto da sociedade como dos próprios atores regulados. A gente tem o sistema se desenvolvendo de uma maneira bastante diferente da que ele se desenvolvia antes do Sinaes. Evidente que o processo de avaliação merece um aperfeiçoamento constante, mas essa busca pela transparência e pela existência de regras claras associadas à promoção da qualidade do sistema eu creio que seja um objetivo comum a quem regula e a quem é regulado. É impossível hoje se defender um modelo puro de livre iniciativa sem qualquer espécie de regulação. Primeiro porque seria contra o espírito da Constituição. Segundo porque o sistema vem se desenvolvendo a contento com a existência dessa regulação. Por isso que reafirmo a regulação como uma conquista dos atores do processo, ela fez bem para todo mundo.

ES: O país passa por um momento de grande crescimento econômico, com necessidade urgente de mão de obra especializada e uma demanda da população por educação superior. Qual é o papel da secretaria dentro desse contexto?
Sem dúvida alguma ela tem um papel especial. Essa necessidade do país se reflete em uma das metas do Plano Nacional de Educação que prevê a expansão das matrículas na educação superior até 2020. Essa expansão vai ocorrer tanto no setor público quanto no privado. É nesse sentido que a secretaria tem um papel fundamental de garantir que essa expansão seja feita com qualidade - que não seja uma expansão desenfreada a pretexto de subsidiar o desenvolvimento do país. Nosso desafio é expandir sim, mas com qualidade. E essa é uma tarefa da regulação e não falo aqui de regulação como uma tarefa da autoridade regulatória, mas como uma atividade conjunta de todos os atores envolvidos com a educação superior.
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REPORTAGEM por Amanda Cieglinski
Fonte: http://revistaensinosuperior.uol.com.br/textos.asp?codigo=12789

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