segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Deus não tem de vir ao mundo...

Andrés Torres Queiruga*
"Deus não tem de vir ao mundo, porque já está desde sempre em sua raiz mais profunda e originária; não tem de intervir, pois é sua própria ação que está sustentando e pro-movendo tudo; não acode e intervém quando é chamado, porque é Ele quem, desde sempre, está convocando e solicitando nossa colaboração. Karl Rahner – em um livro destinado ao grande público – salientou, há muitos anos, a enorme transcendência desta inversão, sublinhando as graves consequências que o fato de não tê-la em conta tem acarretado. Vale a pena citá-lo por extenso:

KARL RAHNER
“É preciso reconhecer que, pelo que diz respeito à relação de Deus com o mundo, produziu-se ainda se está produzindo uma mudança radical, não só na mentalidade não cristã, como também dentro do próprio cristianismo e de sua teologia: também nós, os cristãos, vamos nos acostumando lentamente e não descobrir nenhuma intervenção de Deus, pontual e espaço-temporal, dentro de nosso mundo. Para os cristãos atuais, Deus tampouco é um elemento particular a mais, inserido na totalidade da realidade, que “age” sobre os demais, e cujo efeito, e imediata procedência da parte de Deus, pudessem ser constatados, mas constitui um pressuposto capaz de suportar a pluralidade do mundo juntamente com a mútua determinação das realidades concretas desse mundo, sem entrar nesse contexto como um momento particular a mais.
Portanto, se o que acontece é que antigamente se acreditava que Deus intervinha, ao menos em alguns casos determinados, de uma maneira pontual e espaço-temporal em instantes concretos da marcha do universo, então, verdadeiramente teve lugar uma transformação enorme de mentalidade na passagem de épocas anteriores à nossa, uma transformação que, certamente, ainda não chegou a se impor até as últimas consequências, nem na prática religiosa de tipo médio, nem na teologia cristã, e precisamente por isso, está criando-nos grandes dificuldades. (K. Rahner, K.H. Weger, Qué debemos creer todavia? Propuestas para uma nueva generación, Santander, 1980, p.69).

Duas instituições fundamentais permitem articular teologicamente esta nova compreensão: a nova concepção do infinito e o repensar da ideia de criação."

(Excerto do livro: Fim do Cristianismo pré-moderno*)
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* Doutor em Filosofia e Teologia. Prof. Universitário na Espanha. É galego.
( QUEIRUGA, Andrés Torres. – FIM DO CRISTIANISMO PRÉ-MODERNO – desafios para um novo horizonte. Paulus, SP, 2003, p.30/31)

*KARL RAHNER, teólogo alemão de renome. Jesuíta. Participou como teólogo do Concílio Vaticano II. Criou a revista Concilium.

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