terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Discutindo a relação

Eduardo Anizelli/Folhapress
A gerente de RH Mariana Hóss, 27, e o namorado, Alexandre Passos, 20
Enquanto os homens duelam, as mulheres fazem conchavos,
diz linguista americano que aponta razões biológicas para
 explicar as dificuldades de comunicação
 entre os dois sexos

A guerra dos sexos ganhou outro capítulo com o lançamento de "Duels and Duets", do linguista americano John Locke, sem edição no Brasil.
O livro diz que homens e mulheres se expressam de formas bem diferentes: eles duelam, disputando poder, e elas falam como se estivessem fazendo duetos, compartilhando informações.
Locke, doutor em psicologia cognitiva e professor do Lehman College, em Nova York, não descobriu a pólvora. Pesquisas em neurociência e psicologia já provaram que vários estereótipos de gênero têm sua razão de ser.
É nesses estudos que Locke se apoia. "Mulheres passam longos períodos discutindo problemas", disse o pesquisador, em entrevista à Folha. Se elas têm disposição ao diálogo e são polidas, eles interrompem uns aos outros e amam piadas infames.
O motivo da diferença, para ele, é biológico: por milênios, homens e mulheres seguiram seus próprios caminhos evolutivos. Eles foram selecionados para agredir, lutar e caçar; elas, para acertar na escolha de parceiro e cuidar da família. Boa parte do tempo, cada um ficou cercado de gente do mesmo sexo.

HORMÔNIOS FALAM
Locke relaciona a testosterona, hormônio masculino, com a fala agressiva e assertiva deles, e a oxitocina, hormônio do instinto materno, com os duetos femininos.
Cérebros de homens e mulheres são distintos, isso influencia na comunicação, concorda o neurocientista Renato Sabbatini, da Unicamp.
"A mulher usa os dois hemisférios para falar, os homens, um. Elas têm mais sensibilidade para detectar tons emocionais. Minha mulher sempre diz: 'Olha como ela fala, é falsa', eu respondo que ela está imaginando coisas."
Desde que aprende a falar a menina já tem mais fluência verbal do que o menino.
Mas, apesar de estudos comprovarem distinções biológicas, muitos linguistas ponderam que há poucas pesquisas comportamentais sobre o tema, o que torna mais difícil saber qual é o papel da natureza e o da cultura nas diferenças de expressão entre os sexos.
Para Eleonora Albano, linguista e pesquisadora da Unicamp, desde pequenas as meninas são incentivadas a falar mais, e os meninos, a fazer atividades motoras.
"Meninas de dois anos contam histórias para suas bonecas. Meninos não contariam para seus carrinhos."
O pesquisador Luiz Paulo da Moita Lopes, da UFRJ, também defende que a influência cultural fala mais alto que a genética. "Sexo é biológico, gênero é social. Nossa cultura espera algo do homem e da mulher diferente do esperado em outras culturas."
Nessa visão, são as expectativas e os papeis sociais que fazem das mulheres as melhores ouvintes e dos homens os mais assertivos.
"A ideia de que homens falam de um jeito e mulheres de outro é muito engessada e excludente. Acontece, mas muita gente fica fora do padrão", diz a pesquisadora Ana Cristina Ostermann, da Unisinos (Universidade do Vale do Rio dos Sinos).

'NÃO QUERO BRIGAR'

Biológica ou não, a diferença estudada por Locke é reconhecida entre casais. A gerente de RH Marina Hóss, 27, se identifica com o que ele diz.
Ela diz que terminou um namoro por falhas de comunicação. O ex nunca dizia o que o incomodava.
"Eu perguntava, ele falava que não ia dizer porque não queria brigar. Também deixava de falar coisas. No fim, quando falamos tudo, não tinha mais jeito de consertar."
Marina admite que ela quase sempre acha problema onde não tem, mas reclama que os homens fogem de qualquer tentativa de conversa.
"Eles acham que a gente quer conversar para encher o saco e fazer cobrança. Não é. Queremos discutir para construir. É uma tentativa da mulher de fazer dar certo."
Agora, Marina namora há quatro meses Alexandre Passos, 20, auxiliar administrativo. "Ele é paciente", diz ela.
O que não quer dizer que goste de discutir a relação, afirma Alexandre. "Nenhum homem gosta. A gente pensa: que conversa inútil. O problema é falar demais sobre coisas desnecessárias."
Até agora, não tiveram discussões. Até agora.
Anna Paola Conde, 43, nutricionista, é casada há 20 anos com o empresário Evilasio Mariano, 59. Os dois trabalham lado a lado, conversam o tempo todo e dizem que se dão bem. "Nunca dormimos brigados."
Ela não gosta quando ele insiste em saber por que ela está brava. "Digo que estou na TPM e peço para ele me deixar quieta. Ele quer saber o que tenho. Que coisa insistente, quer que eu desenhe?"
Ele se defende: "O bicho mulher nasceu para complicar. Ela é cheia de sutilezas, de dizer sem falar. O homem não está ligado nisso. Depois ela vem e culpa você por não ter entendido, porque era claro para ela. Não é não."

Elas conversam mais sobre sexo


Entre amigas, as mulheres falam mais sobre sexo do que os homens com seus colegas, pelo menos segundo os dados de uma pesquisa feita na Universidade Estadual da Pensilvânia (EUA).
O resultado mostrou também que elas se sentem mais confortáveis para falar do assunto.
O estudo foi feito com 205 universitários e patrocinado pelo Instituto Nacional de Saúde da Criança e Desenvolvimento Humano. Os participantes (124 mulheres e 81 homens, entre 18 e 25 anos) responderam questionários sobre a frequência dessas conversas, os tópicos falados e como se sentiam.
O tema mais conversado, tanto entre os homens quanto entre as mulheres, foi a aparência física do sexo oposto.

Mulher é menos afirmativa, não é?

É, segundo o trabalho da Universidade da Califórnia, publicado neste ano na "Psychology of Women Quarterly". Os pesquisadores chegaram a essa conclusão após a análise de 39 pesquisas, envolvendo 3.502 pessoas.
Foram consideradas formas de linguagem não assertiva o uso de expressões de dúvida ("não tenho certeza"), indicadores de imprecisão ("acho") e afirmações seguidas de pergunta ("não é?").
Para Campbell Leaper, autor do estudo, a linguagem menos assertiva não expressa necessariamente submissão, mas uma tentativa de envolver o interlocutor na conversa.

Quem fala mais, o macho ou a fêmea?

Contrariando todos os estereótipos e o senso comum, pesquisas científicas mostram que não são elas as mais falantes.
Uma análise de 70 estudos feitos para comparar a quantidade de palavras usadas diariamente por homens e mulheres, incluindo 4.385 pessoas, mostra que a verborragia masculina é maior.
O trabalho, da Universidade da Califórnia, foi publicado em 2007 na revista da Sociedade de Psicologia Social e Personalidade.
Na melhor das hipóteses, homens e mulheres falam a mesma quantidade: uma média de 16 mil palavras por dia, segundo uma pesquisa feita na Universidade do Texas, com 400 participantes.

Entre iguais

Como homens e mulheres se comportam quando conversam com pessoas do mesmo sexo, segundo o linguista John Locke

ELES DIZEM

Ei, seu Mané
Homens gostam de se insultar. Entre amigos, é frequente o uso "carinhoso" de palavrões e xingamentos. "Ei, mané, que barriga de chope é essa?", "Olha essa careca!". Os insultos são acompanhados de piadas e quase sempre encarados com humor

Armas
Homens utilizam as palavras como se fossem armas de um duelo sem confronto físico. A competitividade e a assertividade são essenciais para ganhar a disputa. Isso faz com que eles interrompam mais o diálogo. Mas mudam de tom e ficam menos eloquentes quando vão conquistar mulheres

ELAS DIZEM

Emoção na voz
Imagine uma mulher dizendo: "Nossa, que horror essas rugas no seu rosto". Quando dizem algo do tipo, em geral, procuram ser mais educadas. Elas também usam menos palavrões e põem mais emoção nos assuntos, com mais variações no tom de voz

Vaquinha de Presépio
Mulheres concordam mais com o que a outra pessoa diz. Elas usam mais expressões tipo "hum" e "ahãm", incentivando a interlocutora a continuar a história. É como se ela assumisse o papel de coautora na narrativa

Meninas abstratas, meninos concretos
Homens querem exemplos concretos, mulheres são mais subjetivas. Isso tem a ver com diferentes formas de o cérebro processar a linguagem, segundo neurocientistas da Northwestern University, em Illinois (EUA).
Usando imagens de ressonância magnética, eles observaram as áreas cerebrais ativadas em 62 crianças enquanto faziam exercícios com palavras.
As meninas usaram mais as áreas de decodificação da linguagem. Já os meninos ativaram mais as áreas ligadas a funções visuais e auditivas, conforme as palavras eram escritas ou faladas. O estudo foi publicado no jornal "Neuropsychologia", em 2008.
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REPORTAGEM POR JULIANA VINES DE SÃO PAULO
FONTE: Folha on line, 13/12/2011


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