Eu,
muitos me odeiam. Sou homem branco de classe média, o pior tipo de
cidadão, segundo uns tantos. Há até um vídeo famoso da pensadora (boa
profissão, essa) Marilena Chaui, ela com o microfone na mão, diante de
uma plateia embevecida, bradando de punhos cerrados e dentes rilhados:
– Eu odeio a classe média! Eu odeio a classe média!
Outros
pensadores vivem a se manifestar contra pessoas como eu, homens brancos
de classe média. Dizem eles que fazemos parte da “Elite Branca”. Então
eu, que sempre trabalhei, que trabalho e muito, o dia todo, todos os
dias, que ganho salário, que sou filho de professora e neto de
sapateiro, que sempre estudei em colégio público e nunca ocupei cargo
público, eu sou da Elite Branca.
Certo.
Não me incomodaria
ser da Elite Branca, francamente, pode até parecer boa coisa. O
problema é que os tais pensadores deixam claro que essa é uma
classificação pejorativa. Eles, por conta deles, dividiram o país em
dois: Elite Branca versus Negros e Pobres. Como sustentação, digamos,
“filosófica”, eles deram de mão em algumas bandeiras, causas sobre as
quais não há ponderação, que exigem apoio incondicional. Com o discurso
de que defendem essas bandeiras, passaram a rotular os brasileiros,
mesmo que seja mesmo só discurso, sem prática. Num tempo de campanha
eleitoral, como esse, a divisão se acentua. Eles tentam convencer o país
que o que está em jogo não são o poder, os empregos públicos e
dinheiro, dinheiro, dinheiro, e sim que se está travando a luta do Bem
contra o Mal. Então, você tem de estar de um lado ou de outro. Assim, em
duas colunas:
ELITE BRANCA x NEGROS E POBRES
Racistas x Negros discriminados
Homofóbicos x Homossexuais
Misóginos x Feministas
Colonos x Índios
Agronegócio x Sem Terra
Motoristas agressivos x Ciclistas pacíficos
Comedores de carne x Vegetarianos
Especistas x Defensores dos animais
Empresários x Trabalhadores
Estados Unidos x Cuba
Poluidores x Ecologistas
Malvados x Bonzinhos.
Sempre
que há qualquer questão envolvendo esses grupos, você está proibido de
pensar a respeito, de tentar entender as motivações dos dois lados.
Proibido. Você tem que entrar num time e permanecer nele até o fim. Se
você estiver de um lado, você é Elite Branca; se você estiver de outro, é
Negro e Pobre. Ou simpatizante, digamos assim.
Essa ruptura tem
objetivo, evidentemente: a ideia é justificar os atos, quaisquer que
sejam, de grupos que, por ora, estão no poder. Não começou hoje, nem
anteontem. Vem de longe, como diria o Brizola. Cacá Diegues já a
identificou lá no fim dos anos 70, quando criou o genial termo “patrulha
ideológica”. O que aconteceu, agora, é que essa visão binária do mundo
se acirrou, porque o poder está em jogo e, com o poder, cargos,
reputações, facilidades, dinheiro, benesses. Acirrou-se tanto, essa
visão, que contaminou toda a sociedade. E aí, em triunfo e glória,
ingresso no terreno do futebol. Porque o Grêmio está sendo vítima dessa
“filosofia”. O Caso Aranha jogou o Grêmio no lado da Elite Branca e,
agora, se não há intenção clara de prejudicar o time, há, ao menos,
antipatia. Os paladinos dos oprimidos punirão o Grêmio por muito tempo
ainda. E não há nada a fazer. No Brasil, a Elite Branca sofre.
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* Colunista da ZH
Fonte: ZH online, 14/10/2014
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