Thomas Fischermann conta o que achou mais interessante no Brasil até
agora, comenta seu interesse na Amazônia
e fala sobre a economia do país
no futuro
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Daniela Hallack Dacorso / daniela dacors
Editor para a América do Sul do jornal Die Zeit, alemão, que vive há um ano no Rio, percorreu, no período, favelas, terreiros, garimpos e reservas indígenas
“Nasci na Alemanha, em 1969. Sou jornalista e cientista político, com
formação em economia. Fui correspondente em Londres, Nova York e
Washington. Vivo no Rio há pouco mais de um ano, sou casado com uma
mineira, que conheci no meu país e com quem tenho um filho de nove anos”
Conte algo que não sei.
No Brasil, para um correspondente, é mais difícil falar com políticos
e grandes empresários do que em Londres ou Nova York. Até hoje não
falei com o Eike! (Risos) Já as pessoas na rua são acolhedoras em
qualquer lugar, há uma história para contar a cada dia e os
trabalhadores estão sempre disponíveis para narrar a sua labuta.
Você é um alemão típico?
Tenho a pele pálida, o que me difere dos cariocas. E o fato de eu
estar sempre nos lugares na hora marcada. Esse é o hábito que mantenho.
O que você já descobriu de mais interessante no Brasil?
Fiz uma viagem incrível a uma reserva indígena partindo de Rondônia,
mata adentro. Na pequena aldeia, vi coisas que jamais imaginei. O
fotógrafo que me acompanhou ficou três horas dentro do cabaré dos
garimpeiros, tomou sete uísques com as putas, virou amigo de todos.
Quase mataram um travesti lá dentro e o avião emperrou na saída. Houve
mortes em confrontos entre índios e brancos. É um lugar perigoso. Lá,
conheci as rainhas da beleza. Há beleza no garimpo além de ouro. Mas há
armas e perigo, também.
Você tem um interesse particular pela Amazônia?
Percorri, em pouco mais de um ano, os lugares mais impensáveis . Das
favelas do Rio ao garimpo nos arredores da Transamazônica. Desde que eu
fazia o ensino médio na Alemanha e estudávamos a cultura de outros
países eu tinha curiosidade em conhecer a relação entre brancos e
índios.
O que faz você viajar?
Interesso-me por processos de transformação social que envolvem
condições econômicas. E por como o dinheiro transforma essas relações.
Onde há muito dinheiro em circulação, há sempre tensão social. É o caso
do garimpo, das reservas indígenas e dos conflitos que deflagram. Na
luta por direitos humanos, sei que há sempre dois lados na história.
Você se instalou no Brasil em 2013, momento politicamente delicado. Que efeito isso teve no seu olhar?
Foi fascinante. Estava no Rio quando eclodiram as manifestações.
Também cobri a seleção alemã na Bahia, fui atrás do Neymar, das
prostitutas cariocas, dos conflitos no Jardim Botânico, da umbanda e do
candomblé, dos templos evangélicos, da intolerância religiosa. Todos
esses assuntos são relevantes porque ilustram o que é o Brasil.
E o que é o Brasil?
Em uma observação geral, digo que não é o carnaval, a festa ou a alegria, mas o esforço grande em ir para a frente.
Na função de correspondente de economia, como você vê os próximos anos?
Depende das conexões que o Brasil vai fazer no futuro, de como vai se
posicionar no mercado internacional. O país tem muito a oferecer. Mas
desenvolver-se economicamente não quer dizer, necessariamente,
desenvolver-se socialmente. O extrativismo beneficia um número muito
pequeno de pessoas. Há desafios sociais profundos.
Como você compara o Rio a outras cidades do continente?
Se eu comparar com São Paulo, o que já é suficiente, prefiro estar
aqui. São Paulo pode ser economicamente mais central, mas o Rio é
socialmente representativo do que é o Brasil: o centro da América do
Sul. Não há como negar.
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Reportagem por Maria de Luz Miranda
Fonte: O globo online, 06/10/2014
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