De pala e lenço vermelho, teólogo participa de aula aberta sobre direitos humanos e coloca ecologia no centro da questão
Apesar do frio, cerca de 300 pessoas assistiram a aula pública em Porto Alegre.
Precisou de pala e de um copo de quentão para fluir a conversa no
Parque Farroupilha, na tarde deste sábado. Para uma plateia cheia de
políticos e militantes de esquerda, o filósofo e teólogo Leonardo Boff, 77 anos, fez graça antes de deslanchar a conversa sobre direitos humanos na Capital:
— Não me ofereçam água, assim vocês ofendem o gaúcho. Tragam uma
graspinha ou um quentão — disse o catarinense influenciado pelo frio de
9° na tarde deste sábado.
Vestido de maragato, Boff falou neste sábado no Parque Farroupilha
Foto: JÚLIO CORDEIRO
Durante quase uma hora, o precursor da teologia da libertação falou
sobre direitos das mulheres, negros, indígenas e LGBT em um evento que
poderia ser comparado a uma missa campal contemporânea. É que, antes de
começar, ele puxou uma oração; no decorrer, deu umas alfinetadas na
política imperialista norte-americana; mas foi com a "mãe natureza" e o
cuidado com a terra que ele gastou a maior parte de seu tempo.
— Não importa o que prega o código científico ou religioso. O fato é
que a natureza tem direitos que devem ser respeitados. Nossas bases
físicas, químicas e biológicas estão sendo destruídas. Temos que
resgatar a vitalidade da terra para nos mantermos em paz — afirmou, em
tom profético.
Sobre o recente encíclica da Igreja Católica sobre meio ambiente,
Boff caracterizou como um "manual de ecologia cotidiana que engloba
todas as dimensões", não apenas ambiental, mas cultural e espiritual. O
recente texto divulgado pelo Papa Francisco aponta caminhos que colocam o
meio ambiente no centro das preocupações do século XXI.
— O Papa Francisco usou partes de meus textos no seu discurso. Vou
cobrar direitos — brincou ao mencionar sua participação na Carta da
Terra (declaração de princípios éticos fundamentais para a construção de
uma sociedade global justa, sustentável e pacífica criado na
Conferência Eco-92).
O vento gelado assustou o público (das 3 mil pessoas esperadas, cerca
de 10% compareceu), mas não congelou a tietagem. Ao final da palestra,
dezenas de fãs cercaram o filósofo e pediram para fazer selfies. A
presença de cabelos grisalhos e peles enrugadas debaixo dos gorros e
mantas sinalizou que a velha-guarda da esquerda militante, por vezes
adormecida na Capital, desperta cada vez que um nome como o de Leonardo
Boff aterrissa na cidade.
Autor de mais de 60 livros nas áreas de Teologia, Ecologia,
Espiritualidade, Filosofia, Antropologia e Mística, Boff é conhecido
dentro e fora do Brasil. A maioria de sua obra está traduzida nos
principais idiomas modernos.
Em 1984, em razão de suas teses ligadas à Teologia da Libertação, foi
submetido a um processo no Vaticano e condenado a um ano de "silêncio
obsequioso". Em 1992, novamente ameaçado pelas autoridades de Roma,
renunciou às atividades de padre e se autopromoveu ao estado leigo.
Foi professor universitário, agraciado com o prêmio Nobel alternativo
em Estocolmo e atualmente vive no Jardim Araras, região campestre de
Petrópolis (Rio de Janeiro), onde compartilha vida com a educadora
Marcia Maria Monteiro de Miranda.
---------------Reportagem Por:
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