David Coimbra*
Quanto mais indignado e agressivo você for, mais sucesso fará o seu vídeo e mais popular você se tornará entre os adeptos da seita que escolheu
Pois uma tarde, na redação de Zero Hora, a Mariana fazia seu trabalho, quieta na sua mesa, e, de repente, suspirou profundamente, um suspiro de tal maneira profundo que metade da redação ouviu e levantou a cabeça, para ver o que viria em seguida. E o que veio foi uma exclamação em voz alta e sonora, feita pela Mariana sem nem erguer os olhos da mesa:
— Ai, ai, quando é que eu vou ficar famosa?
Todos desatamos a rir.
Essas manifestações da Mariana eram comuns e, o melhor, autênticas. A Mariana queria mesmo ser famosa – hoje é! – e nunca teve vergonha disso.
Ao contrário da Mariana, muitas pessoas não admitem esse desejo, embora o cultivem. Elas dissimulam. Alegam, por exemplo, que o que lhes importa é construir um mundo melhor.
Sei.
O curioso é que hoje, graças às redes sociais, qualquer um pode ficar famoso ou, no mínimo, bastante popular em algum segmento da sociedade. Há pessoas com 500 mil seguidores, e nunca ouvi falar delas. Óbvio: seguir alguém é fácil, não custa nada, basta clicar num botão. Mas por que uns e outros despertam interesse? Isso é intrigante.
Há mulheres que são seguidas porque são bonitas. Elas postam vídeos de biquíni ou fazendo exercícios. Ou os dois: fazendo exercícios de biquíni. Elas dizem que estão “treinando”. Gosto dos vídeos de mulheres de biquíni fazendo exercícios. São estimulantes. Elas se dedicam à ginástica todos os dias. Levantam aqueles pesos. E quantos abdominais são capazes de enfrentar! Céus! As barrigas delas ficam bem musculosas, a gente vê no Instagram.
Elas estão sempre de bom humor, essas mulheres que fazem exercício de biquíni, e falam “gente”, como o Paulo Gustavo falava, e vão à praia com grande frequência. É do que gosto nos vídeos delas: a vida que elas levam é perfeita, com festas elegantes à noite, comida saudável durante o dia e bastante tempo para se bronzear. É reconfortante saber que há pessoas vivendo tão bem.
Mas, para se conseguir tudo isso, é preciso ter um corpo como essas mulheres têm, o que não é fácil – muito polichinelo, muito pique no lugar. Então, se você quiser alcançar a popularidade com menos esforço, tenho cá a fórmula. No Brasil, basta você assumir um dos lados políticos em disputa e falar mal do outro. Grave um vídeo criticando com fúria qualquer coisa que o governo federal faça e diga que a luta contra o bolsonarismo é a luta da liberdade contra o fascismo. Pronto. Milhares de opositores curtirão o seu vídeo e o compartilharão.
Agora, se você preferir ser o querido do outro time, aproveite o mesmo texto, apenas substituindo Bolsonaro por Lula e fascismo por comunismo. Da mesma forma, milhares de governistas o aplaudirão e talvez o sigam.
Quanto mais indignado e agressivo você for, mais sucesso fará o seu vídeo e mais popular você se tornará entre os adeptos da seita que escolheu. Logo você também terá seus 500 mil seguidores.
Só não tente ponderar. Não tente refletir. Ninguém, no mundo de hoje, se importa com quem é compreensivo. O caminho da popularidade é o sectarismo. Isso de tentar ser justo é coisa muito fora de moda, no século 21.
* Jornalista. Cronista da Zero Hora
Imagem da Internet
Fonte:https://gauchazh.clicrbs.com.br/colunistas/david-coimbra/noticia/2021/06/nao-tente-ser-justo-se-quiser-ser-popular-ckppvb34i00700180s40voyey.html
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