Lucy Kellaway*
É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar nos estúdios de uma rádio e falar sobre seu dinheiro.
Posso atestar a veracidade desta lição depois de ter passado muito tempo recentemente tentando convencer ricaços britânicos a serem entrevistados ao vivo sobre suas atitudes em relação aos seus bens.
Eu queria descobrir como a posse de uma fortuna muda a vida das pessoas, suas relações, valores e hábitos de compra. Minha teoria é que é surpreendentemente mais difícil ser bom em ter dinheiro do que consegui-lo.
Talvez a recessão tenha tornado o dinheiro extremamente não mencionável. Talvez seja uma característica dos britânicos. Mas, durante meses, os produtores do programa se esforçaram. Eles não tiveram dificuldades em conseguir pessoas para falar publicamente sobre suas operações de mudança de sexo, divórcios, colapsos mentais e outras compulsões estranhas. Mas sobre a riqueza? Não, obrigado. Eventualmente, após duas centenas de recusas, três pessoas tiveram coragem suficiente para aceitar o desafio.
A ideia da série me veio após um jantar meses atrás, quando conversei com um empresário que tinha uma fortuna de 400 milhões de libras mas estava vestido da cabeça aos pés com roupas gastas da Marks and Spencer. Quando lhe perguntei como ele gasta seu dinheiro, ele disse que além de fazer muitas doações para instituições de caridade, ele ajuda a pagar a escola de sobrinhos e sobrinhas, mas seus irmãos e irmãs são tão ressentidos com ele quanto agradecidos.
Apesar de toda a sua habilidade para ganhar dinheiro, ele não pareceu ser terrivelmente bom em tê-lo. Ou melhor, sua maneira de tê-lo é fingir que não tem, o que eu achei ao mesmo tempo admirável e um desperdício.
Portanto, o que é ser bom em ter dinheiro? Cada um dos meus três entrevistados teve experiências bem diferentes com o dinheiro, o que talvez não seja surpreendente, uma vez que ser rico lhe dá escolhas. Mal citando Tostói, os pobres são todos iguais, mas os ricos são ricos à sua própria maneira.
O primeiro dos entrevistados foi uma empresária. Ela estava tão infeliz com sua fortuna que disse que só falaria no rádio se seu nome não fosse revelado.
"Mal citando Tostói,
os pobres são todos iguais,
mas os ricos são ricos à sua
própria maneira."
Ela foi educada para acreditar que os ricos não são boas pessoas. E assim, quando descobriu que havia entrado para o time, após a abertura de capital de sua empresa, começou a ter medo de que os amigos - e em particular do homem com quem ela havia se casado recentemente, que tinha um salário mediano - passassem a olhar para ela de outra maneira.
Ela disse que agora está em paz com seu dinheiro, depois de aprender como doá-lo de forma eficiente, mas ainda acha que as pessoas que sabem o quanto ela é rica a tratam diferente daquelas que não sabem.
O entrevistado seguinte lidava melhor com seu dinheiro, algo que evidentemente ele apreciava. Ele deliberadamente estabeleceu como meta ficar rico: ao conseguir isso, descobriu que a vida com uma Maserati e um jatinho é bem mais interessante. Mas ele não estava satisfeito. Queria ficar ainda mais rico, criar mais empregos para os outros e comprar um avião maior.
O terceiro entrevistado, outro homem, herdou parte de uma vasta fortuna de seu pai. Ele sempre foi rico e um grande doador para as artes. Mas quando perguntei se seu dinheiro o havia isolado, ele disse que seria isolado de qualquer maneira. E quando perguntei sobre o que o dinheiro fez por seus filhos, ele fez uma careta e disse que não queria entrar nesse assunto.
A única coisa ligando esses três ricaços é que todos protestaram quando apliquei o termo a eles. Não importa o fato de eles estarem entre as mil pessoas mais ricas do país, nenhum se vê dessa maneira. Isso deve acontecer porque, quando avaliamos nossa riqueza, tendemos a olhar para cima e não para baixo. Não importa o quanto você é rico, sempre há alguém mais rico.
Quando você está taxiando seu jatinho particular em um aeroporto, se houver um outro maior que o seu ao lado, então você não é tão rico assim.
Agora que estou pensando nisso, também me sinto culpada. Nem me descrevo como rica porque vejo pessoas que são mais ricas. Mas como provavelmente faço parte dos 2% que estão no topo da pirâmide no país, isso me deixa oprimida.
E como me sinto em relação ao meu dinheiro? Fazer o programa de rádio me fez pensar sobre qual seria a quantidade perfeita de dinheiro, e talvez eu esteja perto dela. Isso significa ter dinheiro suficiente para nunca ter de se preocupar com emergências. Mas não tanto que você tenha que ficar se afligindo sobre como vai doá-lo, ou se preocupar que seus filhos se casem com golpistas.
Percebi que não me importo de falar sobre dinheiro. O que me preocupa é pensar nele. Os pobres precisam pensar em dinheiro o tempo todo. Assim como os ricaços. Para mim, a quantidade perfeita de dinheiro é quando você mal precisa pensar nele.
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* Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times". Sua coluna é publicada às segundas-feiras na editoria de Carreira
Fonte: Valor Econômico on line, 12/12/2011
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