Leandro
Karnal*
O mundo é da inteligência, algo que não tem relação com estatura. Você
preferiria ter 1,95 m ou ser Zuckerberg, com seu
Alexandre, o Grande, tinha no corpo menos grandeza do que no título. Sua
altura é estimada entre 1,52 m e 1,56 m. Não era, propriamente, um gigante.
Venceu o grande imperador persa Dario III. O derrotado talvez passasse de 2,12
m. Mesmo que as crônicas aquemênidas possam exagerar um pouco, Alexandre sentiu
a diferença ao sentar no trono do derrotado. Se houvesse celular naquele
momento, a cena teria algo de ridículo. Meu amigo Alex Bezerra de Menezes,
especialista em Alexandre, deu-me dados e fontes precisas para trazer esses
números à tona. Alexandre, o pequeno, derrotou Dario, o gigante. Altura e
sucesso não parecem ser amálgama necessário.
Napoleão devastou a Europa do alto do seu 1,68 m. Não era pequeno para o
início do século 19. O francês era ligeiramente mais alto do que seu rival
irlandês, o Duque de Wellington (da famosa batalha de Waterloo). Possivelmente,
a fama de “anão corso” nasceu da propaganda inglesa e da presença comparativa
da Guarda Imperial que chegou a ser um exército dentro do exército napoleônico.
Muitos oficiais desse corpo de elite eram altos e ficavam ao lado do imperador.
A comparação foi desfavorável ao gênio de Austerlitz.
A injustiça perdurou. Surgiu o termo “complexo de Napoleão” para
descrever as pessoas que, tendo baixa estatura, compensam com agressividade ou
arrogância. A calúnia inglesa foi eficaz. Contradição interessante: se ser
baixo produz uma vontade maior de superar a média, deveríamos, a partir do exemplo
napoleônico, considerar que a baixa estatura estimula a força de vontade e o
sucesso.
Houve ditadores que poderiam ter sido vítimas do complexo de Napoleão.
Mussolini tinha 1,69 m. Usava botas e se fazia fotografar de baixo para cima
para criar efeito de maior altura. Muitas vezes discursou do alto de uma
plataforma de madeira atrás de um balcão. Quem olhasse da praça, veria
Mussolini mais alto do que seus generais ou assistentes. Chaplin ironiza isso
em uma cena do Grande Ditador (1940), fazendo com que Hitler e o
italiano ficassem elevando suas cadeiras para impor respeito ao “aliado”.
A auxologia estuda o crescimento dos corpos. Há povos que combinaram
carga genética e alimentação e apresentam alturas superiores à média mundial. É
o caso de um grupo do Sudão do Sul, os dincas, e o caso dos holandeses na
Europa. A Holanda é o país das pessoas mais altas do mundo segundo a maioria
dos levantamentos. Todos os dez países no topo do ranking estão na Europa. Os
motivos são muito variados e incluem hábitos alimentares, saneamento,
alimentação durante a gestação e genética. Será contínuo o processo? Os dados
dos Estados Unidos mostram que os norte-americanos estão crescendo menos a
partir dos anos 1960 do que cresceram no século anterior.
No Brasil a média de altura é de 1,73 m para os homens e 1,60 m para as
mulheres, com pequenas variações de acordo com a pesquisa e o método. Aqui
Napoleão, com um pequeno saltinho, já estaria na média.
Os brasileiros cresceram. Na média, saltamos mais de 8 cm em cem anos.
Com frequência, filhos são maiores do que os pais. Nosso futuro parece ser mais
elevado do que nosso passado.
A auxologia registra que situações de crise afetam o crescimento. Várias
gerações de escassez crônica de alimentos na Coreia do Norte levaram a uma
diferença significativa entre a outrora harmônica altura dos coreanos do Sul e
do Norte. Democracia parece favorecer gente maior. Desde o fim do franquismo,
os espanhóis registram um grande crescimento. O ditador, aliás, tinha 1,63 m. O
atual rei da Espanha democrática, Filipe VI, tem 1,97 m. Claro, estou fazendo
uma falsa associação entre autoritarismo e nanismo, mas, curiosamente, o mundo
dos ditadores está mais próximo de se reunir na aldeia dos Smurfs...
Não existe uma possibilidade de associar altura a sucesso, inteligência
ou caráter. Hitler tinha 1,75 m, a mesma altura de Albert Einstein. O mundo
piorou com um e melhorou com o outro. Se acreditarmos no Santo Sudário, Jesus
seria um homem de mais de 1,80 m, um gigante para a Palestina do século 1.º. Se
o Salvador tinha esse tamanho, o encontro com Zaqueu (descrito como muito baixo
em Lucas 19) deve ter sido ainda mais impactante. A graça divina, no caso do
coletor de impostos de Jericó, veio do alto.
Existe excessiva preocupação com altura. Pais apelam a tratamentos mesmo
que o caso não implique uma preocupação expressiva. Existe bullying em torno de
altura nas escolas. Padrões fixos de beleza sempre esbarram na diversidade
humana. Muitos homens sofrem com o que consideram sua baixa estatura e se
esquecem de que a horizontalidade da cama é uma equalizadora extraordinária.
Quer se sentir alto? Vá para o Timor Leste, um dos países com habitantes os
mais baixos do mundo. Você acha sua altura expressiva? Uma caminhada em
Amsterdã vai reduzi-lo a alguma insignificância. O domínio da força física e do
tamanho limitou-se à pré-história ou às hordas bárbaras da Idade Média. O mundo
é da inteligência, algo que, felizmente, não tem relação com estatura. Mark
Zuckerberg tem 1,71 m, abaixo da média brasileira. Você preferiria ter 1,95 m
ou ser Zuckerberg? Dario III preferiria ser Alexandre, o pequeno Magno? É
preciso ter esperança.
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