domingo, 3 de maio de 2009

Autoestima na dose certa

Christophe André
Psiquiatra francês
diz que o homem vive
a era do culto a si mesmo.
E isso só torna as pessoas mais vulneráveis
e instáveis emocionalmente.
O ser humano carece de recursos internos
para se garantir

O amor próprio é um sentimento valioso. Mas para os que constroem a autoestima em cima de bajulações e acreditam que seu valor como ser humano aumenta graças a um estilo de vida com ostentação, cuidado. Na primeira dificuldade, a confiança em si mesmo vai ruir. A tese é do psiquiatra francês Christophe André, 52 anos. "Estimar- se é uma necessidade vital. Hoje, porém, fazemos isso de forma equivocada", disse o médico à ISTOÉ, de seu consultório em Paris, onde trabalha também no Hospital Universitário de Sainte-Anne. Ele debate a ideia no novo livro Imperfeitos, livres e felizes (Ed. BestSeller), recém-lançado no Brasil. André diz que a autossupervalorização que as pessoas apresentam na atual sociedade esconde um medo exacerbado de se mostrar quem é e de fracassar. "Mas adivinhe: todos nós fracassamos em algum momento", afirma. "É preciso aprender a se perdoar."

ISTOÉ - Por que exibir bens materiais é o maior indício de autoafirmação?
Christophe André - Carros, joias, roupas de grife são atributos usados numa tentativa de convencer o outro de que se tem valor graças à posse desses símbolos sociais de reconhecimento. É um caminho perigoso, que cria dependência. Quando todos os olhares se afastam e a máscara é retirada, é revelada uma carência profunda de recursos internos para se garantir.

ISTOÉ - Significa que, na hora que uma pessoa tiver que lidar com situações difíceis, ela estará mais frágil do que supunha?
André - Exatamente. Pessoas assim estarão mais vulneráveis e instáveis emocionalmente. Ao enfrentarem uma falha ou crítica, reagirão com emoções negativas. Ou serão destrutivas com elas mesmas ("Minha vida é um lixo", "Sou um perdedor"); ou serão agressivas com os demais ("Eles são incompetentes, invejosos"). Tornam qualquer ideia diferente das suas uma fonte de conflitos. Levam tudo para o lado pessoal.

ISTOÉ - A autoestima pode ser aprendida?
André - Sim. A verdadeira autoestima se aprende confrontando as dificuldades, sem ajuda de ninguém. É um fortalecimento interno de valores. É, também, pensar em outra coisa além de si mesmo.

ISTOÉ - Qual o perfil de uma pessoa que tem a verdadeira autoestima?
André - Ela não se prende à autocompaixão. Diante das adversidades, simplesmente diz: "Ok, qual a melhor maneira de reagir a esse problema?"
Sempre se pergunta qual a lição aprendeu com a experiência e o que pode ser usado no futuro. Sabe que dificuldades fazem parte da vida. Quem tem a real autoestima consegue compreender, se adaptar e descobrir soluções para o que não corre bem.

ISTOÉ - No livro o sr. afirma que desempenho, abundância e aparência são três flagelos da sociedade. Por quê?
André - Eles transformam a vida em uma competição permanente. O desempenho não significa enxergar desafios por todos os lados e querer ser um vencedor até adoecer. É normal buscar abundância de coisas boas, mas não comprar freneticamente tudo o que vê. E é compreensível se sentir feliz com o próprio corpo. Mas não é saudável estremecer com o surgimento de uma ruga.
ISTOÉ - O sr. diz que a solução do ego que vai mal não é pensar menos em si, mas pensar de outra forma. O que isso significa?
André - Simplesmente se livrar de valores falsos. É assumir não ser o que se deseja mostrar, mas aquilo que se sente. Não ter uma vida baseada na grife que usa, mas naquilo que oferece ao outro como ser humano. O valor essencial é a felicidade. Não o poder.
Reportagem de Suzane G. Frutuoso - Revista ISTO É nº2060, p.65 - 06/05/2009
http://www.terra.com.br/istoe/edicoes/2060/artigo132919-1.htm

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