domingo, 10 de maio de 2009

Entre os primeiros

O chanceler Celso Amorim fala do atual
protagonismo externo do Brasil.


"Esquerdopatia”, “retórica inútil”, “antiamericanismo tosco”, “complexo de inferioridade vertido em arrogância”, “forçação de barra”, “acúmulo de fracassos”, “beira o ridículo”. Esses foram alguns dos torpedos lançados sobre as ações de Celso Amorim à frente do Ministério das Relações Exteriores. Seis anos depois, Amorim ri por último. “Estamos entre os primeiros dos primeiros”, festeja, sobre a atual onda de elogios internacionais às políticas interna e externa do governo Lula. “Pena que tenha sido necessário vir do Obama e da Newsweek antes de vir dos próprios brasileiros.”
Quanto às críticas, feitas principalmente por seus antecessores no cargo, preferiu, sem citar nomes, ironizar. “Essas pessoas têm complexo de inferioridade. O problema para eles é fazer psicanálise, não é nem questão de oposição. Eu acho graça”, afirmou o chanceler em entrevista à CartaCapital. Na pauta da conversa, a entrada da Venezuela no Mercosul, os negócios com o Irã e o fim do embargo dos EUA a Cuba.
CartaCapital: O fato de a política externa ter dado certo até agora comprova que o presidente não precisava ser poliglota para alcançar resultados internacionais?
Celso Amorim: O presidente precisa, acima de tudo, acreditar no Brasil. É muito mais importante do que falar em várias línguas.
CC: O senhor diria que realmente mudou a visão mundial em relação ao Brasil? CA: Não tenho a menor dúvida e não posso atribuir isso somente ao governo Lula, vem ocorrendo desde que o Brasil firmou a democracia, acertou a economia. Hoje somos percebidos como um interlocutor necessário para a grande maioria dos temas internacionais.
CC: Virou um país sério?
CA: Não gosto dessas comparações. Elas revelam o complexo de vira-latas de que falava Nelson Rodrigues, pelo qual só se é capaz de ver pelos olhos do outro. Precisamos sempre de uma legitimação de fora. Todo mundo estava criticando muito a política externa, mas quando veio a capa da Newsweek, o abraço do presidente Barack Obama, aí as pessoas começaram a ver de outra maneira. Acho bom, mas é pena que tenha sido necessário vir do Obama e da Newsweek antes de vir dos próprios brasileiros ou pelo menos de uma parte deles.
CC: Uma das prioridades da política externa do governo Lula foram as relações com a África. Em que se modificaram?
CA: Mudaram de perfil totalmente. Não só pelo número de viagens que a gente fez, até já perdi a conta. Somos o país da América Latina que tem o maior número de embaixadas na África, antes era Cuba. Houve um número razoável antigamente, mas foram diminuindo por medida de economia ou falta de prioridade. Reabrimos todas que existiram e abrimos várias outras. Passaram de 20 para 35.
(...)
CC: Pessoalmente, o que o senhor achou de Obama?
CA: É uma pessoa que ouve com atenção. Outra coisa que diria, que vejo semelhante no presidente Lula, é que dá a impressão de refletir no momento. Pensa na hora e dá uma resposta. Os outros presidentes vinham com as respostinhas prontas.
CC: O senhor acha que, com Obama, as tarifas ao etanol brasileiro vão cair?
CA: O término da Rodada de Doha seria o caminho mais expedito. Os próprios americanos estão vendo dificuldades, o custo excessivo do etanol de mlho, e isso vai acabar ocorrendo. Mas se resolverá mais rápido com o fim de Doha.
(...)
CC: O acordo de Itaipu com o Paraguai foi feito na época da ditadura. É necessário revê-lo?
CA: Rever o acordo é algo complicado. O fato de ter sido feito durante o governo militar é uma circunstância. Há reinvindicações justas e realistas e outras que não têm viabilidade. Vamos trabalhar da maneira mais positiva possível. Não é o caso de se procurar fazer uma liberdade, mas ao mesmo tempo tem de compreender que Itaipu é importante para o Brasil, mas para o Paraguai é quase uma das únicas fontes de receita.
Parte da Reportagem de CYNARA MENEZES, em Carta Capital nº 545, 13 de maio de 2009.

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