Foi com essa convicção que a socióloga Anamaria Schindler, 46 anos, superintendente do Instituto Arapyaú, superou questões familiares delicadas e construiu sua carreira
Alemã naturalizada brasileira, a socióloga Anamaria Schindler, 46, queria entender como os ricos se envolviam com as mazelas dos países. Foi então trabalhar na Ashoka, entidade internacional pioneira na prática do empreendedorismo social. Lá, fazia a ponte entre empresários como Larry Page, do Google, e empreendedores sociais. Chegou à copresidência mundial da Ashoka e hoje, de volta ao Brasil, dedica-se ao Instituto Arapyaú, iniciativa voltada para o futuro da educação e o desenvolvimento sustentável
>>> Nasci na Alemanha, mas me mudei para o Brasil com quase 3 anos. Tinha aprendido a falar alemão e, ao chegar aqui, não abri mais a boca. Minha mãe conta que fiquei um mês sem falar. Quando voltei, só falava em português. Adotei o Brasil.
>>> Era boa em física e matemática, mas acho que a escolha de sociologia se deu pelo momento do Brasil. Fiz o ensino médio entre 1979 e 1981. O que mais me mobilizou foi a questão da ditadura e da violência institucional, da polícia, da tortura, das prisões. Aprendi desde muito cedo que você precisa de uma boa dose de indignação para mudar as coisas.
>>> Queria saber como as pessoas mais ricas do Brasil se envolviam com as questões sociais e comecei a estudar filantropia empresarial. Fui então chamada pela Ashoka. Durante 12 anos me dediquei a construir pontes entre empresários, grandes riquezas e os processos de transformação social. Essas mudanças não são rápidas. Podem durar gerações.
>>> Saí da Ashoka em dezembro de 2007, para ajudar Guilherme Leal a montar seu instituto, o Arapyaú. Ele me convidou num momento em que estava querendo voltar para o Brasil. Na Ashoka, trabalhei a maior parte do tempo em Washington e fui me distanciando do meu país. O custo familiar foi alto, porque minha família não foi comigo.
>>> Sempre fui muito curiosa em relação à essência humana. Entrei na meditação aos 14 anos, sempre na linha hinduísta. Desde pequena pergunto: quem eu sou efetivamente? Estamos aqui rodeados por coisas, uma casa, o mundo lá fora, os carros, o planeta, não sei mais o quê... Mas e você? Você constrói a casa, compra o carro, põe gasolina, vai para o trabalho todo dia. Para quê? É isso que você é? Não é isso.
>>>Minha filha Ana Clara é portadora de atrofia espinhal infantil progressiva, uma síndrome genética de degeneração dos neurônios da medula. Ela só mexe três dedos, fica deitada. Quando ela nasceu, a experiência de vida me mostrou que todos temos limitações. O próprio corpo te limita na velocidade, no tempo. A Ana Clara tem o corpo e não se mexe. Mas, aos 16 anos, é uma adolescente da gema. Vai a show de rock, teatro, cinema, balada. Todo ser humano tem limitações, mas a nossa capacidade é ilimitada.
>>> Quando soube do diagnóstico da Ana Clara, pedi ao médico algo para ler. Nos textos tinha uma tabelinha dizendo que o prognóstico de vida da minha filha era de, no máximo, dois anos e meio. Liguei alucinada para o médico. Ele me respondeu algo definidor: ‘Anamaria, não se ligue aos prognósticos, porque é o indivíduo que tem a síndrome, e não a síndrome que tem o indivíduo’. Percebi que ela tinha todas as possibilidades.
>>> Tenho a força que tenho por causa dela. Nunca vi minha filha reclamar de nada. Não tem um dia em que ela acorde e fale: ‘Ai, que saco de vida’. Nunca. Como é, então, que eu posso falar isso?
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Por Aline Ribeiro Fonte: Revista ÉPOCA NEGÓCIOS online, abril/2010
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