Análises de dados sobre suposto planeta habitável
fora do Sistema Solar indicam erro de seus descobridores
Cientistas responsáveis por descoberta original se defendem;
astro seria primeiro com condições de abrigar seres vivos
O único planeta supostamente habitável encontrado fora do Sistema Solar na verdade não existe, segundo diversos grupos de astrônomos que tentaram confirmar o achado original.
Em setembro de 2010, um grupo americano liderado por Paul Butler, da Instituição Carnegie de Washington, e Steve Vogt, da Universidade da Califórnia em Santa Cruz, anunciou a descoberta de dois novos planetas ao redor da estrela Gliese 581.
Eles se juntariam a quatro anteriormente identificados por outros astrônomos, e um deles estaria numa distância tal de sua estrela que a água, em tese, poderia se manter em estado líquido em sua superfície. A essa região do sistema planetário se dá o nome de zona habitável, pela crença de que a presença de água seja a condição essencial ao surgimento da vida.
VIDA?
Esse mundo ligeiramente maior que a Terra (massa estimada de três a quatro vezes a terrestre) despertou enorme interesse. Poderia mesmo haver criaturas vivas nele?
Alguns cientistas, como um grupo do Instituto para Pesquisa de Impacto de Clima de Potsdam, na Alemanha, usaram os parâmetros anunciados para investigar as possíveis condições na superfície desse planeta.
Os resultados, publicados no periódico "Astronomy & Astrophysics", concluem que se trata de um mundo com real potencial de habitabilidade. O problema é saber se ele existe mesmo. Diversos outros grupos tentaram confirmar a descoberta em meio aos dados coletados dessa estrela em particular e não encontraram sinal dos dois planetas adicionais.
A descoberta original havia sido feita combinando dados de dois instrumentos: o espectrógrafo Harps, do ESO (Observatório Europeu do Sul), e o Hires, seu rival americano no Havaí.
Mas Mikko Tuomi, da Universidade de Hertfordshire (Reino Unido), revisou a pesquisa e concluiu: "Os dados do Harps e do Hires não levam à conclusão de que haja dois companheiros adicionais orbitando Gliese 581".
Sua análise, também publicada no "Astronomy & Astrophysics", é só uma das muitas que contestam a presença dos novos planetas.
O grupo que desenvolveu o Harps e hoje é o campeão na caça a mundos extrassolares, liderado por Michel Mayor, do Observatório de Genebra, também reviu seus dados e não encontrou sinais dos misteriosos objetos.
CADÊ?
"O pessoal do Corot [satélite europeu caçador de planetas, com participação brasileira] também analisou os dados e não viu nada", diz Eduardo Janot Pacheco, astrônomo da USP. "Esse planeta não existe."
Pressionados, Vogt e Butler continuam defendendo sua análise original.
"Estamos trabalhando duro para obter mais dados próprios sobre esse sistema planetário", diz Vogt. "Nos últimos 15 anos, nossa equipe descobriu centenas de planetas, sem uma única constatação falsa, e estamos fazendo o nosso melhor para manter as coisas desse jeito."
O mistério sobre a existência dos planetas Gliese 581g (o habitável) e 581f (igualmente misterioso) não deve se desfazer tão cedo. Sua detecção está no limiar dos atuais instrumentos, e será preciso aguardar a próxima geração de aparelhos de precisão para confirmar de forma irrefutável a descoberta ou o erro. Por ora, a questão permanece em aberto.
Dúvida mostra pressa de achar astro habitável
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O sonho dourado de qualquer astrônomo é passar à história como o homem que descobriu a primeira Terra, o primeiro mundo vivo, fora do Sistema Solar. Mas a pressa é inimiga da perfeição.
Até hoje, apenas dois anúncios de um planeta habitável foram feitos. O primeiro veio em abril de 2007, com o grupo europeu liderado por Michel Mayor. Era um planeta pouco maior que a Terra localizado ao redor da estrela Gliese 581.
Como se viu mais tarde, a festa foi precipitada. Fato: o planeta está mesmo lá. Contudo, novos estudos mostraram que, na verdade, a zona habitável do sistema estaria um pouco mais longe da estrela do que o imaginado antes, deixando o astro, o Gliese 581c, de fora.
Pulamos então para 2010, quando vem o segundo anúncio. Ao redor da mesma estrela, Steve Vogt e Paul Butler acreditam ter identificado outros dois mundos, um deles bem na zona habitável. Aparentemente, desta vez o planeta está na região certa para poder abrigar vida. Resta saber se ele existe mesmo. Muitos cientistas dizem que não. Será que foi mais um alarme falso? (SN)
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Reportagem por: SALVADOR NOGUEIRA COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Fonte: Folha online, 12/03/2011
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