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Obama e sua circunstância:
um presidente tranquilo de um país nem tanto
em meio a um mundo que passa
por ferozes transformações
e constantes crises.
Uma semana antes de embarcar para o Brasil, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, concordou em dar uma entrevista exclusiva a VEJA. Obama pediu que ela fosse feita por escrito. A revista enviou-lhe catorze perguntas e ele escolheu nove para responder. Entre as questões excluídas estavam algumas de cunho pessoa, como a que pedia as impressões do Brasil que lhe ficaram gravadas na memória quando, na juventude, assistiu, ao lado de sua mãe, à fita Orfeu Negro, de 1959, filmada durante o Carnaval do Rio de Janeiro. Obama também preferiu evitar uma pergunta bem-humorada: “De que adianta ser o homem mais poderoso do planeta se não pode fumar um cigarrinho no Jardim das Rosas, na Casa Branca?”
Primeiro, a pergunta que não quer calar: os Estados Unidos estão mesmo em declínio ou é sua posição relativa que parece menos importante pela ascensão de outros países? Não estamos em declínio. Ao contrário. Nossos melhores dias ainda estão por vir. Os fundamentos dos Estados Unidos permanecem sólidos – a produtividade do trabalhador americano, o espírito inovador dos nossos empreendedores e empresas, a excelência das nossas universidades, que atrai estudantes de todas as partes do mundo, e a missão dos nossos homens e mulheres de farda, que garantem a segurança e a estabilidade internacionais. Além disso, em um momento em que enfrentamos desafios comuns, como crescimento econômico, mudança climática e a não proliferação de armas nucleares, as relações entre as nações não precisam ser um jogo de soma zero. É do interesse americano que mais países venham a contribuir para a segurança e a prosperidade global. Essa é a razão pela qual não apenas aceitamos a ascensão de países como o Brasil, mas achamos que é bem-vida.
"Não estamos em declínio. Ao contrário.
Nossos melhores dias ainda estão por vir.
Os fundamentos dos Estados Unidos
permanecem sólidos"
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que o Brasil já é a quinta maior economia do mundo, superando a Inglaterra e a França, depois de crescer 7,5% no ano passado, a maior taxa desde 1986. Como o senhor vê esse progresso recente? Nos últimos quinze anos, o Brasil vem demonstrando que a integração à economia global pode levar à multiplicação de oportunidades internamente, que a estabilidade macroeconômica pode criar uma base sólida para a prosperidade, que o espírito do capitalismo pode triunfar em conjunto com o espírito da justiça social e, por fim, que a democracia é o caminho mais curto para o progresso econômico. Por todas essas razões, os EUA apoiam a ascensão do país como um pode econômico global. É por isso que temos trabalhado para ajudar a ampliar o papel do Brasil nas instituições que comandam a economia global – tais como o G-20, o FMI e o Banco Mundial. O rápido progresso do Brasil vem contribuindo para o aprofundamento das relações econômicas bilaterais.
Em 2009, a China tornou-se o maior parceiro comercial do Brasil, ultrapassando os Estados Unidos. Seu governo tem algum plano concreto para retomar a liderança? O Brasil, como muitos outros mercados nas Américas, é competitivo. Meu desejo de reforçar nossa robusta relação econômica é uma das razões da minha visita ao país, das reuniões que terei com a presidente Dilma Rousseff e da troca de ideias com o setor privado americano e brasileiro. Acredito que os Estados Unidos e o Brasil podem e devem ter uma relação econômica em que os dois países saiam ganhando – uma relação de cooperação em setores-chave das duas economias, como energia, o que virá em benefício de ambos os países. O Brasil importa mais bens e serviços do EUA do que de qualquer outra nação, principalmente bens manufaturados de alta tecnologia, da indústria aeronáutica à indústria química. A ampliação desses laços requer um compromisso intenso do governo dos dois países e empenho do setor privado para expandir as oportunidades. Durante minha visita ao país, poderei ouvir o que os líderes empresariais têm a dizer sobre as maneiras mais eficazes de intensificarmos nossas relações econômicas em benefício mútuo. Também terei a oportunidade de expor a eles minha visão pessoal.
Ouve-se com certa frequência que a ascensão do Brasil está mudando os cálculos da política externa no mundo. O senhor concorda com isso? Os Estados Unidos mantêm uma relação próxima e dinâmica com o Brasil. Nosso trabalho conjunto com o país, sempre ancorado em valores comuns, tem sido crucial para segurança nacional dos EUA e para a construção de um futuro melhor, seja na promoção de direitos humanos, fortalecimento do desenvolvimento econômico, combate à mudança climática, seja na ajuda às nações necessitadas. E, indo mais longe, gostaríamos de cooperar ainda mais com o Brasil tanto na região como no mundo. A experiência brasileira oferece lições importantes aos países que estão enfrentando transformações de caráter político e econômico. Uma das razões pelas quais vemos com bons olhos a ascensão do Brasil é o fato de que temos valores comuns, como democracia e inclusão social. Num mundo dinâmico como o nosso, é uma satisfação ter a oportunidade de trabalhar com a presidente Rousseff e seu governo para ajudar a construir um planeta mais estável, próspero e democrático, no qual as necessidades básicas dos povos sejam atendidas.
Daqui a 100 anos, o que o senhor gostaria que os historiadores dissessem sobre seu governo, mas o que o senhor teme que eles venham a dizer? Bem, não passo meu tempo pensando sobre o que os historiadores do futuro vão dizer. Meu dia já está bastante ocupado com os desafios cotidianos e as coisas que fazem a diferença para os americanos e os demais povos – os empregos, a segurança, os sonhos dos filhos. É nisso que estou concentrado. Agora, como eu já disse, ninguém quer ser um presidente medíocre. Todos querem ser um grande presidente. Mas acho que a história lembra dos líderes e das gerações que mudam o rumo do seu país para melhor, que deixam as coisas melhores do que encontraram. É isso que tento fazer todos os dias.
Obs.: Reportagem completa na revista VEJA – 23/03/2011.
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Reportagem por :André Petry, de Nova York
Fonte: Revista VEJA, edição impressa nº 2209 – 23 de março de 2011, pg.62-67.
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