Dora Kramer*
Uma
catástrofe aconteceu em Brumadinho porque a empresa dona da barragem
que se rompeu e as instâncias do poder público responsáveis por regular a
operação foram e são
criminosamente negligentes.
Esse é o fato. Já as
versões que nos dias seguintes se reproduziram a respeito,
principalmente na internet, tiveram menos a ver com o fato e mais com o
drama ou a comédia (sim, houve disso) que as pessoas se dispuseram a
fazer dele com base nas respectivas posições
ditas políticas.
Atitudes
usuais em se tratando das redes, esses ambientes permeáveis aos
surfistas de ondas fáceis. Desconforta, no entanto, constatar que uma
tragédia
das proporções da ocorrida em Minas Gerais seja utilizada para esse
tipo de atividade. E
aqui se incluem todas as correntes delirantes:
* a daqueles que culparam a privatização da Vale nos anos 1990,
* a dos que responsabilizaram a insensibilidade de Jair Bolsonaro e companhia ao tema do
meio ambiente e
* a turma que resolveu tripudiar sobre a população de Brumadinho porque Bolsonaro ganhou
a eleição na cidade.
O traço comum entre esses grupos é
o exercício da manifestação sem compromisso algum com a realidade e com os efeitos que possam causar aos outros.
Repetiu-se a situação quando da morte do irmão mais velho de Lula, em
razão do pedido do ex-presidente para comparecer ao velório. De um
lado, falou-se que a autorização dada pelo ministro Dias Toffoli a Lula
para ir a uma unidade militar encontrar-se com parentes, com proibição
de fotos e uso de celular, significava um “sequestro” dos direitos do
ex-presidente, e, de outro, fizeram-se inúmeras
piadas com a entrevista da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, no
cemitério. Houve até quem aventasse a hipótese de uma armação para
permitir a saída temporária de Lula da prisão em Curitiba.
Além de desnecessárias, são em alguns aspectos
manifestações nefastas, prova de que boçalidade não tem ideologia.
Sinais de um tempo em que as pessoas se impõem a obrigação de
dar opinião sobre tudo, saibam ou não a respeito do que falam,
tenham ou não informações mínimas sobre o assunto de que tratam.
O
destaque disso que chamemos aqui de fenômeno, até por falta de termo
mais adequado, é a tendência de dar ao fato o caráter de drama ou de
comédia,
dependendo do gosto do freguês.
O que se tem com isso é um
misto de superficialidade e distorção, cujo resultado é um elogio permanente à ignorância. Seus autores são todos uns
indignados de plantão, donos da convicção de que suas opiniões dão rumo ao mundo. Tomando emprestada de Nelson Rodrigues a expressão e pedindo licença para trabalhar no seu inverso, formariam com louvor na
tropa dos imbecis da falta de objetividade.
A
postos. Com todos os elogios que já foram feitos ao comportamento de
Hamilton Mourão no exercício da Presidência, há que notar uma
franca adaptação do general algo folclórico da campanha ao personagem de vice-presidente em contraponto ao chefe, pronto para o que der e vier.
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*Jornalista
Fonte: VEJA – Edição 2620 – Ano 52 – nº 6 – 6 de fevereiro de 2019 – Pág. 51 – Internet: clique
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