segunda-feira, 6 de julho de 2009

O lado escuro da Terra

MURILLO DE ARAGÃO*

O Hemisfério Sul do mundo ainda joga na terceira divisão. Nada, em termos políticos ou econômicos, que ocorre nestas bandas tem real valor no Primeiro Mundo. Parece que temos um déficit de credibilidade. Não no sentido da falta de confiança, mas no cansaço da espera de que as potencialidades da região enfim se realizem. No futebol, esperam que o Brasil ganhe e acaba acontecendo. Como economia, sempre estivemos abaixo de nosso potencial. Parece que o Norte leva o Sul nas costas. Não é bem assim, mas é o que parece.
No Brasil, depois das eras FHC e Lula, as coisas começam a mudar. Lentamente. O Brasil integra o grupo de nações emergentes mais promissor. É, de longe, a maior e melhor economia do Hemisfério Sul do mundo. Por nossas características, temos evidentes vantagens frente a russos, chineses e indianos. Somos uma das 10 maiores economias do planeta. O presidente Lula exerce incontestável liderança regional. Brasília, como posto diplomático, ganha relevância dia a dia.
Apesar dos avanços, ainda estamos muito atrás do reconhecimento que deveríamos ter. Tal aspecto é apontado por Moisés Naim, editor-chefe da revista Foreign Policy, em um excelente artigo publicado na revista Newsweek de 22 de junho. Nele, Naim aponta que o Brasil não é avaliado como deveria por políticos, jornalistas e formadores de opinião.
Naim nota que existe uma obsessão americana com relação a Cuba, ao passo que o Brasil, que é muito maior e muito mais importante, não tem a mesma atenção. É verdade. Os Estados Unidos gastam muito mais tempo e dinheiro com Cuba do que com o Brasil. É até compreensível. Como diz Naim, Cuba foi o único país vizinho que adotou o comunismo e enfrentou os Estados Unidos. No entanto, o modesto significado que temos para os americanos não é adequado nem para o Brasil nem para os Estados Unidos, dado o imenso potencial de nossa relação.
Porém, existe um problema que não é apenas do Brasil nem apenas dos Estados Unidos. O Hemisfério Sul é visto com desdém pelo pelos principais atores do diálogo norte-sul. No caso norte-americano, a ausência de um estratégia positiva para a região causou o débâcle comunista em Cuba, a revolução sandinista na Nicarágua, além de episódios com outros países.
De longe, o fato mais importante, foi a ascensão de Hugo Chávez na Venezuela. Parece incrível que os Estados Unidos, cuja relação com a Venezuela era economicamente intensa, não tenha construído uma relação política e militar sólida com aquele país.
Os Estados Unidos, bem com os demais países do Primeiro Mundo, sempre olharam para o Brasil e seus vizinhos como algo de menor importância. Ou de interesse meramente comercial. Por exemplo, a França vê no Brasil um cliente rico para seus produtos bélicos. Alguns deles não conseguem ser colocados em outros mercados. Mesmo assim, demora a construir a ponte que ligaria a Guiana ao Brasil. Afinal, Brasil e França têm uma fronteira extensa e importante na Guiana. Salvo o lado militar e cultural, a relação do Brasil com a França é mais alegórica do que estratégica.
A dinâmica política no Reino Unido — bipolar entre a relação com os Estados Unidos e a Comunidade Europeia — não dá espaço mental para que os políticos ingleses se preocupem com o nosso continente. Continuamos a ser algo distante e calorento. A China nos vê como fornecedores, mercado e competidores em algumas áreas. Mesmo assim, o Brasil não merece grande atenção por parte dos chineses. Tanto que a visita de Lula ao país decepcionou.
Hoje, o sucesso do Brasil é uma novidade e, como tal, tratada de forma episódica e pouco consistente. Alavancada pela popularidade e carisma de Lula. Em 2011, nem Dilma nem Serra parecem voltados para uma agenda externa. No quesito carisma ambos são muito fracos. Para o Brasil manter a sua escalada rumo ao reconhecimento internacional vai ter que dispor de uma estratégia bem executada e coordenada em vários âmbitos. A questão central é saber que papel o Brasil quer ter no cenário mundial e o que fazer para atingir os objetivos estabelecidos.
O fato de Barack Obama ter dito que Lula “era o cara” não é suficiente. Temos que ter uma estratégia de comunicação voltada para ampliar o conhecimento do Brasil no mundo a formadores de opinião. Nesse quesito, o Brasil vai mal. Países como Cuba, Montenegro, Croácia, entre outros, e regiões e províncias do Reino Unido, França, Itália e Estados Unidos, entre outros, se promovem de forma permanente. Apesar da badalação, o Brasil continua sendo um país cujo nível de conhecimento no Primeiro Mundo é precário.
*Mestre em ciência política, doutor em sociologia pela UnB e presidente da Arko Advice - Anális Política
Correio Brazilisente, 06/07/2009

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