segunda-feira, 13 de julho de 2009

Sim, nós podemos! O sexo na terceira idade

Nancy Price Freedman
Eu me sentei na mesa de exame no consultório do meu urologista e me cobri com o ridículo avental azul de papel que se tornou o uniforme padrão de paciente em nossa sociedade descartável. Certamente isso não foi projetado tendo um adulto em mente.
"Vista com a abertura na frente", resmungou a enfermeira, provavelmente pela 20ª vez naquele dia, enquanto saía às pressas da sala.
Ou ela disse para deixar a abertura nas costas? De qualquer forma, ele nunca cobriria minhas coxas. Eu abracei juntas as duas metades do avental enquanto esperava pelo médico.

O urologista, que provavelmente viu uma cena semelhante em cada sala de exame, ignorou meu avental com abertura na frente e começou a perguntar a respeito dos meus sintomas. Quando notei o problema pela primeira vez? Eu preciso levantar mais do que duas vezes por noite? Eu como comidas condimentadas? Bebo bebidas com cafeína?
Ele é um homem da minha geração, um membro de carteirinha da associação americana dos aposentados, entrando, como eu, nos anos dourados. Logo, fiquei surpresa quando sua próxima pergunta foi: "Você e seu marido ainda são sexualmente ativos?"
Meu impulso foi dizer: "Não é da sua conta!" Mas eu sabia que aquela não seria uma resposta médica aceitável. Eu olhei bem nos olhos dele e disse: "Sim, nós somos".
Eu não sei o que me incomodou mais, sua pergunta ou sua expectativa implícita de que não éramos ativos. (Ou talvez não deveríamos ser?)
Mas posteriormente, eu me vi pensando mais a respeito da pergunta. O que constitui "sexualmente ativos" para uma esposa e marido com 70 e 78 anos? Um certo número de vezes por semana, por mês, por ano? Eu não vi nenhuma estatística sobre o que pessoas de nossa idade fazem, ou tentam fazer, à portas fechadas. Nós não somos de uma geração que discute abertamente nossa vida sexual com os amigos, logo não tinha referenciais a respeito.
"Sexualmente ativos" sugere necessariamente paixão selvagem? Ou rolar na cama e dar um beijo de boa noite no meu marido conta?
Eu sei que não. Há não muito tempo, logo após dar um beijo de boa noite no meu marido, eu me virei e perguntei: "Eu já lhe dei um beijo de boa noite?" Isso soa como uma pessoa que lembraria quantas vezes fez amor em um certo período?
Nós colocamos ênfase demais na paixão física a longo prazo. Há vários anos, quando ainda estava trabalhando, uma amiga mais jovem no trabalho confidenciou para mim e outra colega que tinha dúvidas a respeito de seu atual namorado. Minha colega e eu representávamos respectivamente 25 e 35 anos de casamento, logo nos considerávamos especialistas no assunto.
A jovem mulher estava em dúvida sobre se acabava ou não um relacionamento de muitos anos com um homem que todos nós adorávamos. Ele era carinhoso e amoroso, enviava regularmente flores para ela para marcar as ocasiões especiais -um excelente ser humano.
O que não havia para gostar? Ou amar?
Ela explicou que após cinco anos juntos, a paixão desapareceu do relacionamento deles -não o amor, ela nos assegurou, mas a paixão intensa que costumava fazer parte de sua relação sexual.
Pacientemente, como as duas mamães ganso que éramos, nós suspiramos e explicamos que ao longo dos anos, o amor amadurece. Um casamento é composto de muito mais do que relação física; é mais sobre amizade e atenção genuína. Ele consiste de experiências e lembranças compartilhadas, de encorajar um ao outro e escorar um ao outro. Idealmente, nós aconselhamos, você passa a respeitar os pontos fortes um do outro e a fazer vista grossa para os pontos fracos.
Orgulhosas de nossa palestra sobre casamento, minha colega e eu trocamos sorrisos convencidos.
Nossa amiga, entretanto, parecia cética. E no final ela rompeu com ele. Ao saber da notícia, nós todas choramos.
Talvez não soubéssemos de toda a história, mas parecia um grande desperdício de um relacionamento promissor, e um padrão alto demais para manter - sustentar a paixão física por anos e anos. Apesar de depois termos rido da parte da paixão, nós mal podíamos esconder a inveja.
"Ah, quem tem a energia?", minha amiga disse rindo.
"Quem tem as juntas flexíveis?", eu acrescentei.
"Alguém de fato lembra o que é sexo?", adicionou uma colega pós-menopausa. Crises de gargalhada.
O sexo em nossa idade é algo que evidentemente ficamos mais à vontade fazendo piada do que conversando honestamente. Mas isso não significa que não aconteça, apesar do declínio de nossa energia, juntas e memória.
Recentemente um amigo me contou uma história sobre o asilo onde sua sogra vive. Ele soube pelos enfermeiros que alguns moradores mais velhos estavam entrando sorrateiramente nos quartos uns dos outros no meio da noite.
"Isso não é repulsivo?", ele perguntou.
Ele não sabia ao certo o que estava realmente acontecendo, mas era claro seu desconforto com a ideia de homens e mulheres idosos querendo ir para a cama uns com os outros.
Repulsivo? Não para mim. Nem de longe.
Mas toda a questão do sexo entre idosos nos distrai da verdade mais profunda de que a intimidade simples e carinhosa é muito importante à medida que envelhecemos, o tipo de coisa que nossa cultura altamente sexualizada, promotora do Viagra, tende a minimizar ou ignorar.
Eu contei para ele a experiência de outra amiga, durante sua recente estadia no hospital. Sua companheira de quarto era uma mulher idosa que aguardava ansiosamente pelas visitas diárias do marido. À noite, depois que ele ia embora, ela chorava silenciosamente em sua cama porque sentia falta demais dele, especialmente à noite, quando seu leito hospitalar parecia frio.
"Em casa", ela disse entre lágrimas, "nós sempre ficamos juntos abraçados enquanto dormimos. Sem ele, eu não consigo me aquecer".
No dia seguinte, quando o marido retornou para a visita, minha amiga anunciou que iria ler na sala de visita. Ao sair, ela sussurrou para o marido que ele devia se deitar sob as cobertas com sua esposa. Então ela puxou a cortina ao redor do leito da mulher e fechou a porta ao sair.
Isso é paixão. E amor. Mas não sexo. Mas o sexo ainda parece ser o instrumento com que medimos a duração de um casamento, e é dito para um número cada vez maior de nós em nossos anos dourados que, com um pouco de ajuda química, podemos ter sexo passional por anos, décadas.
Em um momento da história em que as pessoas estão vivendo mais, são mais fisicamente ativas e estão se aposentando mais cedo, com mais tempo para praticar atividades prazerosas, por que o sexo não deveria ser uma delas? Ou é o que a indústria farmacêutica nos faz acreditar. Se 70 supostamente é o novo 50, e 90 o novo 70, os laboratórios estão à procura de muitos novos negócios potenciais por muitos anos.
E não são apenas os laboratórios farmacêuticos. Recentemente, meu marido viu uma propaganda em uma revista para aposentados, oferecendo três DVDs que garantiam ensinar "relação sexual criativa" e "novas ideias para o casal melhorar seu casamento".
Eu também vi a propaganda. Aparentemente, muitos setores estão investindo no fato de que casais aposentados querem praticar sexo tão ativamente quanto jogar golfe ou tênis.
E essa propaganda claramente funciona. Nós pedimos os DVDs e aguardamos sua chegada.
Enquanto isso, logo após minha visita ao urologista, eu visitei minha ginecologista, uma mulher que é cerca de uma década mais jovem do que meu filho. Ela expressou surpresa quando perguntei se a cirurgia que ela recomendava teria algum impacto na minha vida sexual. "Oh, vocês ainda são sexualmente ativos?", ela perguntou em uma voz que mal escondia sua incredulidade.
A postura predominante a respeito da sexualidade entre idosos frequentemente me parece um recuo à era vitoriana -algo que não deve ser discutido em uma sociedade educada. Ótimo. Não pergunte e eu não digo. Mas um alerta para aqueles que perguntam: não descarte minha geração. Nós ainda não acabamos.
Meu marido e eu visitamos o mesmo urologista. Ele tem consulta nesta semana. Nós nos perguntamos se a pergunta também seria feita para ele. Eu não me lembro se o médico perguntou a respeito da frequência do sexo ou apenas se ainda éramos sexualmente ativos. Nós concordamos que devíamos coordenar os números para a eventualidade, mas não conseguimos decidir qual número deveria ser. Ao começarmos a ingressar no reino do ultrajante, nós decidimos que o médico provavelmente não consultaria meu prontuário.
É claro, não se trata da contagem. Uma vida amorosa ativa não se baseia em um número aleatório em um estudo sobre a intimidade dos casais. Ela se baseia em décadas desfrutando da companhia um do outro; compartilhando piadas bobas; da lembrança de eventos bons e ruins; no expressar de nossas opiniões, preocupações e medos; no encorajar e cuidar um do outro à medida que envelhecemos.
Fisicamente, nos abraçarmos ocupa um ponto alto em nossa lista. Esfregar as costas é importante. Ficar de mãos dadas em caminhadas e no cinema é automático. Sim, nós somos ativos -envolvidos ativamente um com o outro e em nosso amor à nossa vida juntos.
Mas e quanto aos DVDs que prometiam melhorar nosso casamento por meio de relação sexual criativa? Eles chegaram, como prometido, em um pacote discreto. Certa noite nos sentamos, colocamos o primeiro DVD no aparelho e começamos a assistir. Nós rimos de algumas partes, eu adormeci no meio do segundo e nem lembro se assisti o terceiro.
Ao guardá-los, meu marido sorriu e disse: "Talvez algum dia, quando formos mais jovens".
Postado no NTimes - Tradução: George El Khouri Andolfato
http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/nytimes/2009/07/13/ult574u9499.jhtm

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