segunda-feira, 7 de março de 2011

NA DÉCADA DA BIODIVERSIDADE, O ANO DAS FLORESTAS

MALU NUNES*
As Nações Unidas anunciaram o período de 2011 a 2020 como a Década da Biodiversidade. Para iniciá-la, 2011 foi proclamado o Ano Internacional das Florestas. O que se discute é o manejo sustentável de todos os tipos de florestas para conter a taxa alarmante de desmatamento e degradação. Restam no mundo pouco mais de 20% da cobertura florestal original, e 130 milhões de hectares desses remanescentes foram convertidos para outros usos nos últimos 10 anos. No Brasil, um dos cinco países que mais detêm florestas, a perda chegou a 26 milhões. Os números são da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO).
É preciso frear essa destruição porque está em jogo nossa sobrevivência e nossa qualidade de vida. A degradação prejudica o fornecimento de serviços ecossistêmicos essenciais para a vida humana, como a produção de água doce, a regulação do clima e a manutenção da qualidade do ar e do solo. Sem eles, reduzir os efeitos das mudanças climáticas e garantir a vida no planeta como concebemos hoje são tarefas impossíveis.
Nesse sentido, para manter uma parcela indispensável da biodiversidade, viabilizar sua evolução e os serviços ecossistêmicos providos por ela, bem como manter os estoques de carbono, é necessário preservar em perpetuidade grandes áreas nas suas condições naturais, por meio de unidades de conservação, onde possa sobreviver por tempo indefinido o maior número possível de espécies.
A boa notícia é que, em 2010, o Brasil e outros membros da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) aprovaram elevar para 17% a proteção de habitats terrestres até 2020 Hoje, 12% dos remanescentes florestais são destinados à conservação. Outro compromisso assumido pelo país, na Convenção sobre Mudança do Clima, foi o de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa, principalmente as derivadas do desmatamento.
Porém, enquanto externamente o país defende a permanência das florestas e outras áreas naturais, internamente pode retroceder de forma desastrosa. Como garantir o cumprimento dos compromissos assumidos caso as propostas de alteração do Código Florestal, que reduzem consideravelmente nossas áreas de floresta, sejam aprovadas neste ano?
"A sociedade já não aceita mais tão facilmente
o discurso de que o meio ambiente
é entrave para o desenvolvimento
e exige soluções efetivas."
Em vez de adaptar a lei a favor de quem não a cumpriu, uma forma de garantir esses compromissos seria beneficiar aqueles que sempre mantiveram suas áreas naturais protegidas, contribuindo para a manutenção da qualidade do ambiente e das atividades produtivas. O Brasil dispõe, por exemplo, de mecanismos inovadores de pagamentos de serviços ecossistêmicos como o Projeto Oásis, que premia financeiramente proprietários de terra em regiões de manancial de São Paulo e Apucarana (PR) por conservarem suas áreas naturais.
A Certificação Life, idealizada por um grupo de instituições não-governamentais e empresas do Paraná, é outro exemplo. Ela atende, inclusive, uma demanda da própria CDB, além de ser uma ferramenta que viabiliza a inserção concreta das empresas na conservação da natureza.
O Brasil tem maneiras de cumprir seus compromissos e legitimar seu papel de protagonista no cenário mundial. Só precisa encarar o desafio de implementá-las de forma rápida, abrangente e competente, pois as cobranças virão internacionalmente, o país ficará cada vez mais em evidência, já que detém grande parte das riquezas naturais globais nacionalmente. A sociedade já não aceita mais tão facilmente o discurso de que o meio ambiente é entrave para o desenvolvimento e exige soluções efetivas. Aqui dentro e lá fora, o governo precisa desempenhar um papel decisivo para que não venha a se arrepender depois.
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*Engenheira florestal, mestre em Conservação da Natureza e diretora executiva da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza
Fonte: ZH online, 07/03/2011

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