PLINIO MONTAGNA*
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A psicanálise continua sendo,
com seus avanços, poderosa arma terapêutica
de ampliação do conhecimento sobre
cada um e sobre relações humanas
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Como dispor do tempo que ainda viveremos -esse é nosso desafio, universalmente humano. Vale para qualquer idade e qualquer tempo, desconhecido, que a vida nos reservará. O presente é o fim e o início de dois tempos, passado e futuro, e é nele, no trânsito entre nossas recordações e nosso destino, que temos o nosso dizer e fazer.
O futuro se ancora nas escolhas que fazemos hoje, dentre aquilo que a vida nos apresenta e nossas criações próprias. Vivê-lo com qualidade ou jogá-lo fora depende de nós. Nos é dado redimensionar e reorganizar em nós o passado, mas, óbvio, não o viveremos mais.
Passado e futuro são referências apenas do presente. É disso que trata uma psicanálise. Diferentemente do que muitos imaginam, o fazer psicanalítico contemporâneo não se refere a falar do passado para entender o presente.
Ao inverso, por meio das formas relacionais que alguém mostra na sala de análise pode-se reconstruir imaginativamente seu passado, não necessariamente o factual, vivido "de fato", mas, sim, a narrativa que dele faz para si mesmo.
Mais do que explicar, refere-se a compreender -ou criar sentidos em que a própria mente é apenas virtualidade, uma protomente.
Mais do que conjeturar o passado, importa configurar graus crescentes de liberdade interior para o indivíduo lidar com o presente e com a trama que imprime às suas relações, se apropriando daquilo que se vai revelando verdadeiro em seu ser. A apropriação de sua singularidade radical, a favor da vida, pode-se dizer o escopo nuclear de um processo analítico.
Não se trata, por exemplo, de uma pessoa não sofrer, mas, sim, de desenvolver seus equipamentos, em auxílio a se desviar dos sofrimentos evitáveis e enfrentar os que não o são. É assim que podemos ajudar. Estamos mais instrumentados que na época de Freud.
Além dos outros grandes mestres, a psicanálise segue, como todo campo de saber, sendo construída num trabalho diário de muitas mãos. Na Associação Psicanalítica Internacional, que Freud fundou, convivem e conversam entre si diversos modos de pensar, sendo natural, num mundo em rede como o nosso, um influenciar o outro.
Mantém-se perspectiva plural, para a maioria, por vezes pluralista.
A psicanálise representa hoje a peça de resistência do estudo da subjetivação e da subjetividade humana e segue tendo enorme influência em inúmeras outras áreas.
Continua sendo, com seus avanços, uma poderosa arma terapêutica de ampliação do conhecimento sobre cada um e sobre relações humanas.
Possibilitando a atualização de sua existência a cada um, permanece como uma ferramenta preciosa na busca de uma vida psíquica de qualidade. Como cada um de nós, ela não está pronta, fechada em seu saber e fazer. Influencia e é influenciada pelo tempo e pelo espaço que a circunda.
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* PLINIO MONTAGNA, mestre em psiquiatria, psicanalista, é presidente da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP), membro componente da Associação Psicanalítica Internacional. Foi docente da Faculdade de Medicina da USP.
Fonte: Folha on line, 22/05/2011
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