– Deus existe?
É uma
obsessão, sou meio chato. O Leandro Fontoura, editor de Notícias aqui da
Zero, odeia quando escrevo sobre isso, diz que é uma bobajada, que tem
muita coisa importante acontecendo para se perder tempo com dúvidas
inúteis. Pois perco tempo com esse troço há quase 30 anos. Que que eu
posso fazer? Uma das maiores inquietudes da minha vida se refere a essa
pergunta – Deus existe? –, e mais inquietante ainda é a forma como ateus
e fiéis lidam com a resposta. Como podem ter tanta certeza? Por que
suas convicções são tão invioláveis? Sinceramente, invejo todos eles.
Mas o padre
Fábio viria à Zero Hora – e talvez ele me desse uma boa resposta e, se
me desse, eu teria de escrever sobre isso outra vez, azar é o do
Leandro. Porque já questionei mais de 200 pessoas sobre o assunto, entre
crentes e descrentes, e nenhuma jamais me persuadiu. Nunca, portanto,
formei uma opinião acerca da existência ou não de Deus.
E por que
Fábio de Melo ajudaria? Porque, embora eu tenha torcido o nariz quando o
vi pela primeira vez (lembro daquele padre galã fitando o horizonte,
apoiando o queixo no punho cerrado em um comercial cafona de TV), aos
poucos percebi que ele é um fora de série. Suas pregações e entrevistas
têm se revelado aulas necessárias de tolerância – e de hermenêutica, ao
oferecerem interpretações do Evangelho que apenas agregam, jamais
discriminam. Eu queria saber o que faz alguém tão profundo, de
inteligência tão apurada, ter tanta convicção sobre a existência de
Deus.
Ele chegou
às 11h15min, vestindo jaqueta de couro preta e um blusão vermelho.
Cumprimentou-me com simpatia à beira da escada, e o fotógrafo Félix
Zucco começou a filmar nossa conversa.
– Padre,
tenho uma dúvida que me acompanha desde criança – decidi não perder
tempo. – Como é que o senhor tem certeza de que Deus existe?
Ele soltou um meio sorriso e, embora não tenha muita cara de padre, respondeu com a calma de um padre:
– Se eu tivesse certeza, não precisaria ter fé.
Como é que é? Não pode ser! Nem o padre Fábio de Melo tem certeza de que Deus existe?
Mantive a boca entreaberta, e ele prosseguiu:
– A
experiência da fé nos dispensa das certezas. Fé é confiança, não é
certeza. É o que você pode experimentar, por exemplo, como filho. Você
tem certeza do amor de sua mãe?
– Olha... Acho que sim, padre.
– E você tem provas científicas desse amor que ela sente por você?
– Não... – Mas você confia. Você acredita. E pronto.
Nunca tinha
pensado por esse lado. Fábio de Melo não tentou me persuadir, não tentou
me impor sua verdade, apenas explicou por que, para ele, aquela é sua
verdade. Se ele sente que Deus existe, como eu sinto que minha mãe me
ama, quem tem autoridade para contestá-lo?
Agradeci a
ele por se comportar com a tolerância própria dos valores cristãos.
Porque, se eu não sou cristão, tampouco me parecem cristãos alguns dos
sacerdotes de maior penetração nas massas – malafaias que debocham,
julgam e agridem quem não compactua com suas verdades. Na saída do
prédio, Fábio de Melo atendeu às fãs que pediam fotos, despediu-se e
disse assim:
– Conheço ateus que agem como cristãos. No fim, é só isso que importa. É só isso que Deus quer.
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* Jornalista. Colunista da ZH
Fonte: http://entrelacos.blogspot.com.br/ 20/08/2016
Imagem da Internet
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