domingo, 29 de agosto de 2010

RETIRO - SER HUMANO (Final)

Frei Irineu Costella*

Dez palavras para você ser feliz: Eu. Sujeito. Silêncio. Bíblia. O olhar. Vida. Montanha. Perdão. Fiquemos com essas oito que já é de bom tamanho, menino. Vamos com Jessé, Voa Liberdade:

“Voa, voa minha liberdade.

Entra se eu servir como morada.

Deixa eu voar na sua altura.

Agarrado na cintura da eterna namorada...”

Convido vocês para irem à 1 Cor 13,1-13: É o grande mandamento. Vocês já o ouviram muitas vezes. “Se eu falar a língua dos anjos e dos homens, mas não tiver , sou como o bronze que soa ou o tímpano que retine... O amor jamais há de acabar... No presente permanecem estas três coisas: fé, esperança e amor, mas a maior delas é o amor”

Com o saca-rolhas, a vivaz beneditina, convidou-nos para conferir as qualidades do olhar contemplativo, que é mais do que olho físico. É um olhar interior. E colheu: compassivo. Compreensivo. Límpido. Gratuito. Sincero. Auxiliador. Misericordioso. Terno. Fraterno. Que procura.
 Olhar que perdoa, acorda, provoca, desafia, estimula. Respeita, aceita. Acolhe. Olhar de cumplicidade. Isso é bom demais. Sim, precisamos ser cúmplices, no bom sentido – só faltaria que uma beneditina não fosse cúmplice no bom sentido. A liberdade é a eterna liberdade. É sedução. É paixão. É muito bom ser seduzido, viver apaixonado. Para completar, sobre o olhar, busquem os textos de Rubem Alves e Juvenal Arduíni.

Agora, vamos à “Metade", com Osvaldo Montenegro. É o último texto do retiro:

E que a força do medo que tenho

Não me impeça de ver o que anseio.

Que a morte de tudo que acredito

Não me tape os ouvidos e a boca

Porque metade de mim é o que grito,

Mas a outra metade é silêncio

Que as música que ouço aos longe seja linda,

Ainda que tristeza

Que a mulher que eu amo seja pra sempre

Amada, mesmo que distante

Porque metade de mim é partida

E a outra metade é saudade.

Que as palavras que eu falo não sejam ouvidas

Como prece e nem repetidas com fervor.

Apenas respeitadas, como a única cosia que resta

A um homem inundado de sentimentos,

Porque a metade de mim é o que ouço,

Mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora

Se transforme na calma e na paz que eu mereço.

Que essa tensão que me corrói por dentro

Seja um dia recompensada.

Porque metade de mim é o que penso

E a outra metade é um vulcão

Que o medo da solidão se afaste,

Que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável,

Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso

Que me lembro ter dado na infância.

Porque metade de mim é a lembrança do que fui,

A outra metade não sei.

Ao seja preciso mais do que uma simples alegria

Para me fazer aquietar o espírito.

E que o silêncio me fale, cada vez mais.

Porque metade de mim é abrigo,

Mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta,

Mesmo que ela não saiba.

E que ninguém a tente complicar porque

É preciso simplicidade para fazê-la florescer

Porque metade é de mim é a plateia

E a outra metade é a canção.

E que a minha loucura seja perdoada,

Porque metade de mim é amor

E a outra metade... também.

“Vou falar bem baixinho para vocês, agora: quando eu cheguei, eu estava com medo. Falar para homens... Nossa... Mas, que nada. Somos todos iguais. No RS. e no Araxás”. E foi calorosamente aplaudida.

A jovem do Araxás, cavou com a pá junto ao sicômoro da sacristia. Descobriu o tesouro com pedrarias de uma conquista que o proprietário de a muito havia esquecido.

O retiro estava findando

E o vento voltou a soprar no sicômoro. Era o minuano vindo de Pelotas, Porto Alegre, Caxias do Sul, Ipê, Veranópolis, Vila Flores, Ijuí, Tramandaí , São José do Herval, São João do Sul e Praia Grande. Não levava consigo o medo paralisante e acovardador do deserto. Nem a ameaça da língua solta. Trazia consigo o suave perfume que ele, sicômoro, conhecia muito bem. E o som de um beijo que vinha vindo devagar, devagar... até pousar lentamente em seus lábios. E o sicômoro sorriu. Era a primeira vez que ele fazia isso com tamanha felicidade.

Sílvia, estou retornando, disse ele.
________________________________

Lembre-se:

- Quem cospe para cima...

- Quando chove lá fora chuvisca no convento.

- O animal pode ser levado até a fonte, mas só ele pode beber.

- Retiro é tempo de desplugar-se, desconectar-se...

- Você é itinerante!

- O que nos une: Ser humano, eclesial, consagrado, social.

- As 4 grandes palavras de Deus: a criação, a Bíblia, a Tradição e o Ser humano.

- Atenção à lei do Eterno Retorno: tudo o que você faz ao outro, volta para você,

paradoxo!

- Isto não acontece aqui, só no Araxás.

Textos utilizados durante o Retiro

A Bíblia Pastoral
Paradoxo - Juvenal Arduini
O homem: As viagens - Carlos Drummond de Andrade
Ser Estranho – Jessé
Voa Liberdade - Jessé
Metade – Osvaldo Montenegro
_______________________________________
* Frade capuchinho. Pároco em Ijuí. Escritor. Colunista do Diário Gaúcho.

Nenhum comentário:

Postar um comentário