Frei Irineu Costella*
Dez palavras para você ser feliz: Eu. Sujeito. Silêncio. Bíblia. O olhar. Vida. Montanha. Perdão. Fiquemos com essas oito que já é de bom tamanho, menino. Vamos com Jessé, Voa Liberdade:
“Voa, voa minha liberdade.
Entra se eu servir como morada.
Deixa eu voar na sua altura.
Agarrado na cintura da eterna namorada...”
Convido vocês para irem à 1 Cor 13,1-13: É o grande mandamento. Vocês já o ouviram muitas vezes. “Se eu falar a língua dos anjos e dos homens, mas não tiver , sou como o bronze que soa ou o tímpano que retine... O amor jamais há de acabar... No presente permanecem estas três coisas: fé, esperança e amor, mas a maior delas é o amor”
Com o saca-rolhas, a vivaz beneditina, convidou-nos para conferir as qualidades do olhar contemplativo, que é mais do que olho físico. É um olhar interior. E colheu: compassivo. Compreensivo. Límpido. Gratuito. Sincero. Auxiliador. Misericordioso. Terno. Fraterno. Que procura.
Olhar que perdoa, acorda, provoca, desafia, estimula. Respeita, aceita. Acolhe. Olhar de cumplicidade. Isso é bom demais. Sim, precisamos ser cúmplices, no bom sentido – só faltaria que uma beneditina não fosse cúmplice no bom sentido. A liberdade é a eterna liberdade. É sedução. É paixão. É muito bom ser seduzido, viver apaixonado. Para completar, sobre o olhar, busquem os textos de Rubem Alves e Juvenal Arduíni.
Agora, vamos à “Metade", com Osvaldo Montenegro. É o último texto do retiro:
E que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio.
Que a morte de tudo que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que grito,
Mas a outra metade é silêncio
Que as música que ouço aos longe seja linda,
Ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre
Amada, mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
E a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo não sejam ouvidas
Como prece e nem repetidas com fervor.
Apenas respeitadas, como a única cosia que resta
A um homem inundado de sentimentos,
Porque a metade de mim é o que ouço,
Mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço.
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada.
Porque metade de mim é o que penso
E a outra metade é um vulcão
Que o medo da solidão se afaste,
Que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável,
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que me lembro ter dado na infância.
Porque metade de mim é a lembrança do que fui,
A outra metade não sei.
Ao seja preciso mais do que uma simples alegria
Para me fazer aquietar o espírito.
E que o silêncio me fale, cada vez mais.
Porque metade de mim é abrigo,
Mas a outra metade é cansaço.
Que a arte nos aponte uma resposta,
Mesmo que ela não saiba.
E que ninguém a tente complicar porque
É preciso simplicidade para fazê-la florescer
Porque metade é de mim é a plateia
E a outra metade é a canção.
E que a minha loucura seja perdoada,
Porque metade de mim é amor
E a outra metade... também.
“Vou falar bem baixinho para vocês, agora: quando eu cheguei, eu estava com medo. Falar para homens... Nossa... Mas, que nada. Somos todos iguais. No RS. e no Araxás”. E foi calorosamente aplaudida.
A jovem do Araxás, cavou com a pá junto ao sicômoro da sacristia. Descobriu o tesouro com pedrarias de uma conquista que o proprietário de a muito havia esquecido.
O retiro estava findando
E o vento voltou a soprar no sicômoro. Era o minuano vindo de Pelotas, Porto Alegre, Caxias do Sul, Ipê, Veranópolis, Vila Flores, Ijuí, Tramandaí , São José do Herval, São João do Sul e Praia Grande. Não levava consigo o medo paralisante e acovardador do deserto. Nem a ameaça da língua solta. Trazia consigo o suave perfume que ele, sicômoro, conhecia muito bem. E o som de um beijo que vinha vindo devagar, devagar... até pousar lentamente em seus lábios. E o sicômoro sorriu. Era a primeira vez que ele fazia isso com tamanha felicidade.
Sílvia, estou retornando, disse ele.
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Lembre-se:
- Quem cospe para cima...
- Quando chove lá fora chuvisca no convento.
- O animal pode ser levado até a fonte, mas só ele pode beber.
- Retiro é tempo de desplugar-se, desconectar-se...
- Você é itinerante!
- O que nos une: Ser humano, eclesial, consagrado, social.
- As 4 grandes palavras de Deus: a criação, a Bíblia, a Tradição e o Ser humano.
- Atenção à lei do Eterno Retorno: tudo o que você faz ao outro, volta para você,
paradoxo!
- Isto não acontece aqui, só no Araxás.
Textos utilizados durante o Retiro
A Bíblia Pastoral
Paradoxo - Juvenal Arduini
O homem: As viagens - Carlos Drummond de Andrade
Ser Estranho – Jessé
Voa Liberdade - Jessé
Metade – Osvaldo Montenegro
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* Frade capuchinho. Pároco em Ijuí. Escritor. Colunista do Diário Gaúcho.
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