Meu design:
Tad Toulis, diretor de criação da Teague,
destaca o papel da mobilidade e da sustentabilidade no design
Ana Paula Paiva/Valor
Toulis:
"o design precisa vender uma visão e
fazer com que os outros acreditem que
esse olhar também considera
as ideias e necessidades
de outras pessoas"
Tad Toulis acredita que não dá para lutar contra o destino. Filho de professores do Pratt Institute, em Nova York, cresceu no campus da universidade - local a que voltaria anos depois para fazer mestrado em desenho industrial. Trabalhou como um dos principais designers na Samsung e na Motorola e hoje é diretor de criação da consultoria de design Teague, uma das mais conceituadas dos Estados Unidos, com clientes como Philips, Panasonic e Nike.
"Sempre estive exposto à minha profissão. Lembro que gostava de contemplar os trabalhos abstratos dos alunos do meu pai". Apesar disso, Toulis estudou primeiro literatura inglesa e artes plásticas na Universidade de Wesleyan, em Connecticut. "Só nos anos 90 decidi focar seriamente no design industrial". De lá para cá, não parou. A experiência que teve nas empresas de celulares foi determinante na visão de mobilidade que ele carrega hoje. Para Toulis, o conceito é ponto de partida para a criação de seus projetos. "A mobilidade é cada vez menos um assunto separado do que é a normalidade".
Na Motorola, tinha uma função especial: "buscar ideias ainda não exploradas e transformar isso em oportunidades para a empresa". Atualmente, na Teague, ele gerencia uma equipe de 15 designers e também cuida de um grupo de cinco pessoas responsáveis por pesquisa e estratégia. "Preciso inspirar a minha equipe e os meus clientes. Muitas vezes há a tentação de fazer a coisa mais segura, a única que já foi feita antes, mas essa é geralmente a saída menos necessária e menos estimulante".
Em seu currículo, ele acumula prêmios importantes como o IDEA Awards e o IF Awards. Toulis defende um conceito de criação que ele chama de "regra smart/sexy", segundo a qual os projetos precisam ter um equilíbrio de inteligência e beleza. Ele não admite um objeto "sexy" e irritante, assim como desaprova uma solução eficiente, mas "com gosto de remédio". Ao mesmo tempo em que valoriza a importância do design para "ajudar as pessoas a viverem suas próprias vidas", é contra a onda dos "designers-celebridades", que correm o risco de perder o foco da criação.
Em tempos de sustentabilidade, aposta na criatividade e na responsabilidade de cada designer para cuidar dos recursos naturais. Apesar de conhecer apenas os ícones do design brasileiro, acredita que o Brasil pode ajudar o design global a encontrar soluções sem perder o olhar aos recursos naturais. Toulis já morou em Milão, São Francisco, Nova Iorque e hoje vive em Seatle. Esta semana está no Brasil para participar do 2º MOB Design, evento organizado pela Associação Objeto Brasil, em parceria com a Apex e o Sebrae. O objetivo do encontro é promover a discussão sobre o design mundial. O tema deste ano é "O Intangível". Em entrevista ao Valor, Toulis fala, entre outros assuntos, sobre os desafios de seu trabalho em uma época de consumo exagerado e sobre a preocupação com os recursos naturais.
Valor: Como o sr. se sente ao criar algo que interfere no modo como as pessoas vivem e se relacionam com seus objetos?
Tad Toulis: Esta é a grande alegria e, claro, uma imensa responsabilidade do design, criar momentos de produtividade e prazer em torno de um problema resolvido. O designer, especialmente hoje, tem a responsabilidade de exercer o seu talento de modo intencional e disciplinado. Claro que queremos produzir coisas bonitas, mas também é importante usar a nossa habilidade para fazer escolhas construtivas. Cada vez mais o designer deve conciliar o desejo de reconhecimento de sua autoria com as necessidades do grupo e do planeta. Essa é uma ideia verdadeiramente nova e emergente. É uma mudança de direção difícil, mas estou otimista de que é possível fazer isso. Afinal, a criatividade não é rígida, é flexível.
Valor: Em sua opinião, qual é o futuro da mobilidade?
Tad Toulis: A mobilidade é cada vez menos um assunto separado da normalidade ou do que é o ' novo normal ' . Eu não faço design para a mobilidade, realizo projetos com a mobilidade em mente, como um ponto de partida, pelo menos para soluções em que a produtividade, o acesso ao conteúdo e a criação estão envolvidos. Acho que o futuro da mobilidade está na otimização e na evolução da forma como usamos as ferramentas. Há dez anos, quem poderia pensar que seríamos capazes de fazer um smartphone que caberia no bolso? No futuro, vamos fazer ainda mais com softwares mais inteligentes. Softwares capazes de fornecer apenas o que a gente quer ou precisa ver. É claro que há um grande perigo aqui, o de viver em um mundo onde a informação será sempre filtrada passivamente para nós. Mas esse é um outro assunto.
Valor: Qual é o conceito mais importante no seu trabalho hoje?
Tad Toulis: Chegar a um design ao mesmo tempo atraente e que faça sentido. Eu posso simplificar esse desafio chamando-o de ' regra smart/sexy ' . Eu não quero fazer uma coisa inteligente e feia, com gosto de remédio. Nem quero um produto sexy, mas burro e irritante. Minha proposta é oferecer uma solução que seja ao mesmo tempo inteligente e sexy. E preciso falar à cabeça e ao coração. É mais difícil, mas é muito mais compensador. Na Teague trabalhamos duro para continuar a tradição iniciada por Walter Dorwin Teague, que sabia equilibrar essas duas forças com muita elegância.
Valor: Quais os designers, arquitetos e artistas que o sr. mais admira? Como é que eles influenciaram seu trabalho?
Tad Toulis: Para admirar um profissional preciso apreciar o seu trabalho, mas também a pessoa que ele é. Gosto de Konstantin Grcic, Stefan Sagmeister, Paola Urquiola, Alberto Meda, Herzog de Meuron. Eles têm uma voz única, um trabalho autêntico e lúdico. O design hoje está cheio de celebridades. Eu acho ótimo quando a pessoa por trás de um projeto interessante faz sucesso, mas o trabalho deve estar em primeiro lugar, e isso acaba explicando algo sobre o próprio designer. É fácil celebrar aquele que diz: 'Faço isso do meu jeito'. Mas o design precisa vender uma visão e fazer com que os outros acreditem que esse olhar também considera as ideias e as necessidades de outras pessoas.
Valor: Até agora o sr. tem desenvolvido principalmente produtos de outras marcas. O sr. já pensou em ter sua própria marca?
Tad Toulis: Mais e mais as empresas de design estão percebendo que elas possuem uma capacidade muito particular de conceber e executar de um modo muito mais rápido e muito mais barato do que as empresas de manufatura tradicionais. O desafio é que tradicionalmente a maioria das empresas de design não pode executar seus projetos em grande escala. Hoje, com novos protótipos e modelos de distribuição, isso está mudando. Passa a ser importante conceber e executar em pequena ou limitada quantidade, também. Como as ferramentas se tornam mais baratas para a produção e a infraestrutura de distribuição dos produtos fica mais democrática, aumenta o nicho de pequenas soluções de design artesanal. Curiosamente, esses projetos têm um recurso local e estão muito alinhados com a ideia de sustentabilidade.
Valor: Hoje, mais e mais pessoas parecem estar interessadas em design. Isso gera um comportamento consumista de querer comprar e comprar mais ainda?
Tad Toulis: Sim. Uma das coisas que eu considero desafiadora é o fato de que, no meio de tantas mudanças no mundo, o design continuou, em geral, focado no consumo. Tem havido um crescimento de uma linha de design que tenta compensar isso por meio da venda do processo do design, mas isso representa apenas uma pequena parte do setor. É a venda da ideia e não apenas do produto. Outro desafio nessa equação é que há economias crescendo e criando novos grupos de consumidores. Quem pode dizer que esses consumidores não podem comprar o que eles querem? Como o número de consumidores cresce, é importante substituir o modelo tradicional de consumo. É preciso apoiar a liberdade de escolha para os consumidores ao mesmo tempo em que se busca maneiras de diminuir o impacto sobre os recursos compartilhados. Isso requer um redirecionamento total da indústria de design, da concepção e da educação do designer, mas acredito que tudo isso pode ser feito.
"Eu acredito que nós precisamos parar de pensar em sustentabilidade
como um conjunto de problemas separados do design em geral.
Quando separamos as coisas,
criamos uma desculpa para não enfrentar a
questão de frente."
Valor: Na sua opinião, qual seria o papel de um designer para evitar o consumismo exagerado?
Tad Toulis: Há uma classe emergente de designers que acredita que pode criar uma experiência ou um serviço com a reutilização de ideias, o que é interessante. Nos Estados Unidos, temos alguns exemplos disso, como o carro Zip. Ele é comum no serviço de aluguel de automóveis, algo muito popular no aglomerado das zonas urbanas, onde ter um carro nem sempre é prático ou necessário. Esse serviço é muito bem projetado. Há vários pontos de contato que atraem os usuários e os mantêm engajados no serviço. Se essa ideia pode prosperar no berço do capitalismo e do consumismo, então há uma boa chance da imaginação ser usada em outros lugares. O que é realmente agradável nesse caso é o fato de que a comunidade é parte do recurso e da solução. Todos precisam estar envolvidos nessa questão, já que enfrentamos os mesmos desafios globais.
Valor: É possível manter um alto nível de criatividade pensando em sustentabilidade?
Tad Toulis: Eu acho que sim. Sustentabilidade é apenas outra restrição do design e, como tal, pode ser atendida pelo design como outros desafios são superados. Eu acredito que nós precisamos parar de pensar em sustentabilidade como um conjunto de problemas separados do design em geral. Quando separamos as coisas, criamos uma desculpa para não enfrentar a questão de frente. Conceber uma forma bonita ou uma solução inteligente é realmente o piso térreo do design. Resolver problemas e necessidades dentro de um determinado conjunto de restrições é onde o design realmente vive e brilha. Dizem que a generosidade começa em casa, portanto, a maneira mais simples para o designer atuar de forma sustentável é ser honesto e fazer a si mesmo muitas perguntas, o tempo todo.
___________________________Reportagem Por Marjorie Umeda, de São Paulo
Fonte: Valor Econômico online, 27/08/2010
Nenhum comentário:
Postar um comentário