Joaquim Zailton B. Motta*
Imagem da Internet
Na tradição romântica, definir o amor era assunto reservado aos poetas. Eles podiam sonhar, rimar, subjetivar à vontade, sem nenhuma responsabilidade concreta ou respaldo científico.
Mas a neurociência revolucionou essas referências, oferecendo explicações objetivas, com precisão laboratorial, sobre o nosso mais nobre sentimento.
Isso é muito bom e até reforça o contexto sentimental, pois não se pode tolerar mais aquela pergunta muito capciosa que vez por outra se vê na mídia: você acredita no amor?
A demonstração científica de que o amor existe desabilita definitivamente essa questão ridícula e destrutiva.
Amar e ser amado são vivências emocionais, intensas e muito presentes em nossa espécie. Até uma ou duas décadas atrás, devido à subjetividade do assunto, o amor ficava distanciado da ciência.
Hoje, exames do cérebro de voluntários esclarecem detalhadamente as alterações que certas regiões sofrem quando eles contemplam imagens da pessoa amada ou têm contato físico com ela. Esses estudos mostram como as estruturas nervosas (neurônios, sinapses, neuromediadores e áreas superficiais ou profundas) se conduzem diante da experiência do amor pelo cérebro. A presença do ser amado ativa os circuitos que formam o “sistema de recompensa”, promovendo sensações de bem-estar, prazer e felicidade.
Como são agradáveis, reforçadoras, essas sensações positivas ficam associadas ao objeto de nosso amor, de modo que automaticamente os registros mentais funcionam como memórias interessantes que fazem querer continuar na presença do amado e até ansiar por ela.
Essa expectativa é especialmente intensificada quando o sentimento é reforçado pela atividade sexual. E o sexo, quanto mais desejado, consensual e espontâneo, tende a ser mais criativo e excitante, favorecendo um orgasmo muito prazeroso.
Esse vigor erótico leva à liberação de hormônios como a ocitocina e a prolactina. Eles ativam mais fortemente o sistema de recompensa e ajudam a fruir da satisfação que acalma e relaxa as tensões.
À medida que o amor é correspondido, a presença da pessoa amada oferece também um efeito calmante. Um simples abraço é capaz de aumentar a ocitocina e outros mediadores que, além de estimular o sistema de recompensa, reduzem as atividades dos setores cerebrais responsáveis pelo medo, facilitando a aproximação e o relaxamento.
Abraços afetuosos aliviam os temores e as desconfianças. Mais despreocupado, o amado tende ao otimismo, à calma, abre as defesas e baixa a guarda.
"Para a nossa evolução amorosa,
entretanto, precisamos aprender a
sentir os mesmos efeitos,
não apenas quando somos o foco,
o objeto afetivo,
mas também quando amamos,
nas oportunidades em que
funcionamos como sujeito,
fonte do amor."
Quem recebe a atenção e cuidados amorosos não se sente só, tem uma segurança emocional que implica responder ao estresse de maneiras mais saudáveis.
Nas reações estressantes, liberam-se hormônios como o cortisol, responsável pelos prejuízos crônicos que uma pessoa pode desenvolver com as respostas repetidas de insegurança e insatisfação.
O aconchego do amado pode diminuir instantaneamente o nível de cortisol no sangue.
Sentir-se amado tem um maravilhoso efeito de felicidade prazerosa e um grande resultado ansiolítico. Isso deve ser mais aplicado e cultuado.
Para a nossa evolução amorosa, entretanto, precisamos aprender a sentir os mesmos efeitos, não apenas quando somos o foco, o objeto afetivo, mas também quando amamos, nas oportunidades em que funcionamos como sujeito, fonte do amor.
Mensurar as estruturas corporais e a nossa extraordinária química funcional é essencial para se ter uma forma dimensionada e objetiva, uma avaliação científica dos afetos e seus efeitos. Essas descobertas já foram imaginadas como um risco para o amor, como se o conhecimento rigoroso pudesse inibir as manifestações abstratas dos sentimentos.
Ao contrário, a ciência tem iluminado os detalhes amorosos oferecendo mais espaço e tempo para a arte e a subjetividade.
---------------- *Médico psiquiatra, psicoterapeuta e sexólogo. Escritor, já publicou 07 livros, o mais recente em maio de 2007. Participou também de coletâneas e outras publicações. Palestrante e congressista de vários eventos nacionais e internacionais. Articulista, mantém há 07 anos a coluna Sexualidade do jornal Correio Popular.
Fonte: Correio Popular online, 04/2011
Nenhum comentário:
Postar um comentário