Duas psicólogas, um fadista, uma bailarina,
um escritor e um
advogado revelaram o que
os faz felizes e como encontram a felicidade.
Mas que felicidade é essa
de que todo o mundo fala?
Felicidade
“Se estou só, quero não estar,
Se não estou, quero estar só,
Enfim, quero sempre estar
Da maneira que não estou.
Se não estou, quero estar só,
Enfim, quero sempre estar
Da maneira que não estou.
Ser feliz é ser aquele,
E aquele não é feliz,
Porque pensa dentro dele
E não dentro do que eu quis.
E aquele não é feliz,
Porque pensa dentro dele
E não dentro do que eu quis.
A gente faz o que quer
Daquilo que não é nada,
Mas falha se o não fizer,
Fica perdido na estrada”,
Daquilo que não é nada,
Mas falha se o não fizer,
Fica perdido na estrada”,
Fernando Pessoa
A
sala encheu-se de um burburinho feliz. Nas cadeiras, no chão, por todo o
lado mentes curiosas. Na guitarra de Duarte Coxo a melodia e nos versos
de Fernando Pessoa a mensagem: Felicidade.
Duarte Coxo vive entre
duas “montanhas”: trabalha com toxicodependências e com o fado. Nas
duas vertentes da sua vida vai tentando encontrar a tal felicidade.
“Sermos felizes é sermos cada vez mais livres. A minha liberdade é um
unicórnio azul. As felicidades são os lugares onde nos podemos encontrar
com esse unicórnio”.
A música de Duarte Coxo é uma forma de ser e
fazer feliz, tal como o humor é o utensílio preferido de José Pedro
Cobra Ferreira. O advogado e humorista considera que “rir é a melhor
maneira de levar a vida a sério” e defende que “a felicidade não é um
objetivo. Acho que a felicidade é consequência de uma forma de estar na
vida”. Esta é uma forma de nos colocarmos no centro da questão e sermos
responsáveis. “É isso que marca o trajeto. Ninguém gargalha a vida, não
é? É a forma de encarar o caminho que nos faz chegar lá acima”.
A
diversidade do tema espelhada em seis opiniões, seis histórias sobre o
que é a felicidade. A mais nova oradora do painel da primeira conversa offline
do Observador, Mickaella Dantas, mostra como a felicidade pode ser um
conceito relativo. Aos 11 anos, depois de uma longa e penosa doença, foi
forçada amputar a perna – e seguiu em frente. Tornou-se bailarina
profissional. Para ela “a felicidade é cheia de infelicidades”. É bom
“errar”, “levar um tapa na cara” para andar para a frente. Da palavra
felicidade prefere concentrar-se na fé: “seja no que for e de que
forma”.
Já David Machado é um eterno feliz. “Sempre me senti
satisfeito com a vida, sempre me senti otimista e feliz”. Então começou a
questionar-se sobre o tema. Decidiu testar a sua teoria e usou a
personagem Daniel, do seu romance “Índice Médio de Felicidade”, para
saber o que o “fazia infeliz”. Ao longo da história conseguiu perceber
que o personagem, ao contrário do que ele pensava, aguentou todas as
infelicidades que ele lhe colocou no livro. E então percebeu: “Podemos
até não ser felizes, mas a possibilidade de sermos felizes é suficiente
para nós.”
Mas que fenómeno humano é este? Iolanda Galinha,
professora e investigadora, que se tem dedicado ao estudo do bem-estar
subjetivo, ou seja, felicidade. Cada vez há mais vontade em falar do
assunto e em medir a felicidade. Basicamente os fatores que mais
influenciam a felicidade são a atitude perante a vida e a “satisfação
com as relações” com os outros. E afinal quem são os países mais felizes
do mundo? Segundo a ciência, são “os países mais ricos e que vivem em
democracia há mais tempo”, explica Iolanda Galinha. Quer isto dizer que
uma “maior liberdade política, uma melhor saúde pública e segurança nas
instituições são fatores que contribuem para a felicidade”.
Se
Mickaella, Duarte ou David falaram de uma perspectiva mais individual da
felicidade, Helena Marujo fala-nos do conceito de felicidade
pública. Nos estudos que levou a cabo, a investigadora encontrou duas
curiosidades. Em primeiro explica que “os portugueses têm dificuldade em
ter felicidade hedónica, têm dificuldade em ver as pequenas coisas boas
da vida”. Em segundo lugar descobriu que “um tipo felicidade em que os
portugueses estavam acima da média: a felicidade eudemónica, ou seja,
felicidade das relações”. A vertente relacional, o estarmos próximos dos
outros acaba por trazer mais felicidade. Não nos esqueçamos que somos
seres sociais.
E para exemplificar a evidência científica que
descobriu, Helena Marujo contou a história da D. Dércia, mulher de
pescador, mãe de sete filhos, nos Açores, em Rabo de Peixe. Era sempre a
primeira a chegar às reuniões do projeto “comunidades de felicidade”.
Ela contou a Helena os problemas que tinha com o filho que estava a ser
vítima de bulling, com o irmão que estava a morrer de cancro e o
pai que estava doente. Helena Marujo perguntou-lhe: “Como é que
consegue aguentar?”. D. Dércia olhou para o mar do Açores e
respondeu-lhe: “Tenho que ser o pilar para os que estão à minha volta”.
“Mas
onde vai buscar forças?”, insistiu Helena Marujo. “Quando acho que não
estou a aguentar, imagino que tenho uma caixa, meto lá os meus problemas
todos e fecho. No outro lado, tenho outra caixa que é a caixa da
imaginação. Abro-a e imagino a vida que gostava de ter. Depois fecho
esta caixa, viro-me para a outra, a dos problemas, e digo-lhe: saia um
de cada vez.”
Seis histórias, várias versões e várias felicidades.
Para uns a felicidade encontra-se no trajeto, nas pequenas coisas do
dia-a-dia, para outros na atitude perante a vida e outros ainda naquilo
que as suas relações lhes dão. Quando se fala em felicidade o melhor
mesmo é falar em felicidades.
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Reportagem por
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