Eu me reconheço numa frase de Edgar Morin:
“Eu não pertenço a vocês”. Não sou de ninguém. Não sou confiável. Todos
se enganam comigo. Não tenho partido, não tenho sindicato, não tenho
candidato. Nunca votei no PT. Jamais votei no PP. Sempre duvidei da
modernidade do PSDB. Nunca confiei no PMDB. Voto em pessoas. Nenhuma
legenda me explica. Daí tantas ilusões em relação a mim. Às vezes, sou
de esquerda. Outras, de direita. Jamais de centro. O centro é o extremo
que se finge de moderado. Não votarei em Bolsonaro. Nem em Lula. Muito
menos em Dória, Alckmin ou qualquer um dessa escória. Para mim, PT,
PMDB, PP, DEM e PSDB deveriam desaparecer dando lugar a siglas limpas.
Meu papel é decepcionar todo mundo.
Não acredito que a condição sexual de cada uma seja cultural.
Nasce-se heterossexual, homossexual ou bissexual. Os papéis atribuídos a
cada condição é que não são naturais. Papai deve sair para trabalhar?
Mamãe deve cuidar da casa? Essa distribuição de tarefas não está nos
genes, mas na história. Eu sou uma decepção ambulante. Acho os governos
de Michel Temer, José Ivo Sartori e Nelson Marchezan Júnior medíocres.
Mas não contesto tudo o que eles propõem. Não vejo razão para uma
gratificação de chefia depois de dez anos incorporar aos ganhos do
funcionário mesmo que ele já não seja chefe. Sou tudo e nada: comunista e
neoliberal, socialdemocrata e trabalhista, anacrônico e futurista.
Anarquista.
Temo as corporações de toda ordem, sindicais e empresariais quando
elas se fecham em seus “ideais”. Acredito em delatores. Acho que todos,
inclusive Lula, têm culpa no cartório. Mas só aceito condenação com
provas. Gosto da Lava Jato embora seja evidente a sua seletividade. Sou
pela liberação das drogas – adultos têm direito de consumir o que
quiserem e o combate fracassou – e a favor de campanhas poderosas contra
o consumo de tudo o que causa dependência nociva. Sou a favor da
polarização.
Ela tira a sujeira escondida sob o tapete.
O discurso da unidade sempre tem lado, normalmente o da direita afiada.
Gosto de botar os pingos nos is: somos um país racista, homofóbico,
desigual, injusto, preconceituoso e elitista. O nosso maior problema não
é a corrupção, mas a dívida jamais paga com a escravidão, que permeia
nosso imaginário e nossa relação social. Os farroupilhas traíram os
negros. A república foi um golpe de Estado. Dilma levou uma rasteira de
uma quadrilha. Temer ficará no poder por ter o apoio da mídia e do
mercado conservadores. As privatizações de Sartori são ideológicas.
Marchezan quer ferrar funcionários acabando com o plano de carreira que
lhes garante um mínimo de dignidade. Brigar para manter nome de ditador
numa rua é pisotear a história.
Nunca estou onde me esperam. Sou infiel. O obscurantismo avança
cancelando exposições, ameaçando peças de teatro, legitimando
declarações de general golpista, autorizando tratar o que não é doença. A
saída não está no regime militar nem no marxismo secular. Cavaleiro
solitário, franco-atirador, estou em todos os lugares e em lugar algum.
Eis a minha declaração inegociável de independência. Não sou lobo da
direita nem águia da esquerda. Quintanamente passarinho.
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*Jornalista. Sociólogo. Graduou-se em História (bacharelado e licenciatura) e em
Jornalismo pela PUCRS, onde também fez Especialização em Estilos
Jornalísticos. Passou pela Faculdade de Direito da UFRGS, onde também
chegou a cursar os créditos do mestrado em Antropologia. Obteve o
Diploma de Estudos Aprofundados e o Doutorado em Sociologia na
Universidade Paris V, Sorbonne, onde também fez pós-doutorado.
Fonte: http://www.correiodopovo.com.br/blogs/juremirmachado/2017/09/10255/decepcionando-leitores/ 27/09/2017
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