FRANKLIN CUNHA*
O historiador italiano
Guglielmo Ferrero, escreveu, em seu livro O Poder, sobre o medo
paranoico que sofrem os ditadores. Contou que em pleno regime fascista,
certo dia foi convocado pelo prefeito de Florença, em outros encontros
risonho e gentil, agora com semblante negro e inquisitorial, que lhe
entregou uma carta de Benito Mussolini, a qual entre outras admoestações
dizia: "Lembro ao Signore Ferrero que a Revolução Francesa tratava seus
inimigos de maneira muito diferente". Ao sair do Palácio Riccardi,
Ferrero se perguntou que crime tinha cometido para que o ditador
poderoso lhe mostrasse a guilhotina como término de sua carreira.
Tudo foi originado por um texto no qual Ferrero zombava das
frustradas lutas pela liberdade, pela democracia e pelos direitos civis,
as quais acabaram por entregar a Itália às mãos de um ditador. O
referido texto foi parar num jornal de Nova York que a publicou com um
tom levemente mordaz.
Na ocasião, a Itália desmoronava por
todos os lados e, por isso, tinham sido conferidos plenos poderes a um
ditador para que ele evitasse a definitiva debacle do país.
Então, no meio dos monstros que devia matar diariamente para cumprir sua
hercúlea tarefa, o déspota deixava-se tomar pela paranoia provocada por
algumas linhas perdidas num jornal de outro continente e por um
opositor político incipiente e fraco.
Para Ferrero, os
detentores do poder aspiram conservá-lo, os amedronta a lembrança de sua
transitoriedade e que uma democracia só é legítima quando a
possibilidade de sua renúncia e substituição preventiva é algo que pode
se realizar quando os eleitos frustram as esperanças neles depositadas
por seus eleitores.
Opinião semelhante tinha Isaiah Berlin.
Dizia o filósofo britânico que a verdadeira democracia não se resume à
eleição de candidatos nos quais confiamos, mas também na possibilidade
de destituí- los no momento em que verificamos terem eles fraudado
nossas justas e legítimas expectativas. "Ser liberal", afirmava Berlin,
"não é somente aceitar opiniões divergentes, senão admitir também que
são talvez nossos adversários os portadores da razão".
Nada,
portanto, mais antiliberal e mesquinho do que retaliá-los com ações
discriminatórias, ressentidas e com falsos juízos quando eles questionam
e denunciam a precariedade legal e consensual dos detentores do poder,
principalmente quando sobre eles pesam fortes acusações de
arbitrariedades e de corrupção.
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Médico, membro da Academia Rio-Grandense de Letras franklincunha@terra.com.br
Fonte: http://flipzh.clicrbs.com.br/jornal-digital/pub/gruporbs/acessivel/materia.jsp?cd=07470878bde1b126f2cc4b0f9d9b9798
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