Antonio Ozaí da Silva em reflexões do quotidiano
“The only absolute knowledge attainable by man is that life is meaningless”
(Leon Tolstoi) [1]
“Juro-vos senhores que uma consciência muito perspicaz é uma doença,
uma doença autêntica, completa.
Para uso do cotidiano seria mais do que suficiente
a consciência humana comum…”
(Dostoievski) [2]
Às vezes fico a pensar, ainda que relutantemente, sobre a validade de algumas das minhas ações. Por que ler tanto, se a minha capacidade de assimilação e compartilhar o conhecimento é humanamente limitada? Por que ler em demasia, se o conhecimento humano é ilimitado e inalcançável para o tempo de uma vida? Para que ler a diversidade de gêneros literários e temas díspares, se o saber é cada vez mais especializado? Não é suficiente dominar o conteúdo a ser trabalhado? De que me servem tantas leituras se elas me afastam das pessoas que não comungam o mesmo hábito? De que me vale ser um bom leitor, se isto representa ser um “chato” distanciado do cotidiano das pessoas com quem convivo?
Por que ocupar o meu precioso tempo com os livros, se ainda assim interpretam o que escrevo como uma crítica e uma desvalorização da leitura e dos livros? Prá que escrever se as palavras são interpretadas de diversos modos e até em oposição ao afirmado? Se o leitor pinça uma frase e carrega na crítica sem a devida contextualização, sem levar em conta o argumento e as limitações do espaço? Por que se expor? Enfim, por que ler e escrever se tudo é efêmero e a vida é finita? No limite, de que adianta tudo isto se temos um encontro marcado com a morte?
Este pensamento foi reforçado ao assistir ao filme Hannah e suas irmãs.[3] Sim, os filmes também induzem à reflexão – e tenho assistido muitos, talvez mais do que o necessário. Pois bem, Woody Allen faz o papel de um hipocondríaco com suspeita de ter um tumor no cérebro. Os exames revelam que está tudo bem. Ele sai do consultório médico aos pulos de alegria. De repente, porém, ele pára e pensa: se não foi agora, será amanhã ou depois. Compreende, então, o quanto a vida é frágil. A morte foi apenas adiada!
O tempo todo, ele sabia, mas não havia parado para pensar. Agora, tem a certeza absoluta e nada parece fazer sentido! A efemeridade de tudo fica patente diante da morte que o espreita. Na verdade, evitamos tais pensamentos, pois é angustiante sabê-lo. Talvez Dostoievski tenha razão e a ignorância seja necessária para evitar sofrimentos. Quanto mais sabemos maior a tendência à angústia, ao sofrer.
Mickey leu Sócrates, Nietszche, Freud, etc., e nenhum tem a resposta para seu dilema. Aliás, não precisava lê-los para saber o que sabe. Nada responde a questão essencial: qual o sentido de viver? Ele vê homens e mulheres a correr. Iludem-se tentando impedir a inevitável decadência do corpo. “É tão triste ver pelo que as pessoas passam com seus exercícios físicos…”, pensa. Prá que se apenas adiam o inexorável?
Não obstante, não podemos esperar deitados pelo encontro fatal. A vida tem as suas premências, especialmente quando há os que dependem de nós. É preciso agir e a ação cotidiana dispensa conjecturas filosóficas e existenciais. A maioria das pessoas não fica a pensar sobre o sentido da vida ou da morte. E talvez a resposta esteja nelas, na forma como vivem a vida.
Certa feita, alguém perguntou quais eram os meus planos. Espontaneamente, respondi: Continuar vivo! Permanecer vivo é fazer as coisas que gosto – a docência, ler, escrever, assistir filmes, etc. E, inclusive, me questionar sobre tudo isto. Assim, tento manter o equilíbrio entre o necessário e o que excede, a crítica e a apologia. Sobretudo, a certeza da finitude que me faz reconhecer o humano demasiado humano que sou. Em suma, simplesmente viver. Eis o sentido da vida! E para você?
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[1] Citado no filme “Hannah e suas irmãs”.
[2] Ver: Dostoievski, Fiodor. Memórias do subsolo e outros escritos. São Paulo, Editora Paulicéia 1992, p.68.
[3] Link para download do filme: http://vagalumerosa.wordpress.com/2008/11/30/hannah-e-suas-irmas-hannah-and-her-sisters-1986/
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