segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Oráculos do século 21


As ferramentas de busca na internet viram esperança para solucionar dúvidas existenciais milenares. Internautas procuram, por exemplo, resposta até para a eterna questão sobre a existência de Deus
Antonio Cunha/Esp. CB/D.A Press


Marina Mesquita prega “parcimônia”:
Google não pode ser a única fonte

O homem busca o sentido da existência desde os primórdios. Na Antiguidade clássica, por exemplo, gregos viajavam até o Oráculo de Delfos para saber o que o futuro lhes reservava. Essa ânsia de ter uma resposta para tudo atravessou os tempos e chegou aos dias de hoje de um jeito bastante contemporâneo. Já não são deuses e deusas os responsáveis pela orientação de cada um. Agora, basta acessar a internet, “dar um Google” e ter ao alcance dos dedos infinitas — não necessariamente com a mais ínfima base na realidade — explicações sobre quem somos, de onde viemos e para onde vamos.
A filosofia na web está tão presente que o buscador Ask Jeeves, popular no Reino Unido, listou as 10 perguntas mais difíceis de responder (veja quadro). Entre elas, as clássicas “Deus existe?” e “O que é o amor?”. Há definições para todos os gostos, desde a etimológica Wikipedia, passando por comoventes respostas infantis e cômicas explicações de um site chamado perguntascretinas.com.br. A rede “sabe” tudo, tanto que, ao digitar a palavra “oráculo” no Google, um dos primeiros resultados é o próprio Google.
Dúvidas filosóficas não são, porém, as mais recorrentes no buscador. Na última semana, os tópicos mais procurados nos Estados Unidos incluíram o polêmico Banco do Vaticano, a locadora de vídeos Blockbuster (que entrou em concordata) e Aafia Siddiqui, neurocientista paquistanesa condenada por terrorismo que teria sido torturada por militares norte-americanos .Outra personalidade muito visada no Google na semana passada foi Mark Zuckerberg , um dos fundadores do Facebook.
A tarefa quase que celestial de saber o passado, o presente e o futuro obrigou diversas empresas a se adaptarem à nova realidade. A começar por aquelas que normalmente detinham o conhecimento sobre todas as coisas. A editora Barsa Planeta, que publica a enciclopédia Barsa, por exemplo, tem um portal de acesso irrestrito aos compradores da obra. “Nossa filosofia sempre foi a de manter a versão impressa dos volumes. Mas tentamos agradar a todos os públicos, desde o adolescente que se interessa por conteúdos multimídia ao senhor que valoriza o papel”, explica a diretora de marketing da Barsa Planeta, Sandra Cabral.
A Barsa foi a primeira enciclopédia brasileira, lançada em 1964, ano em que vendeu 100 mil unidades. Em 1995, as vendas caíram para 20 mil obras anuais. “Os clientes falavam que não queriam mais livros e sim um disquete com o conteúdo”, lembra Sandra. A editora agregou aos volumes da Barsa, então, um CD-ROM. Hoje, com esse dispositivo, a empresa oferece atualizações mensais de informação — feitas, é claro, pela internet. “Não chegamos a marca de 100 mil unidades anuais, mas devemos fechar 2010 com 75 mil obras vendidas”, calcula a diretora de marketing da Barsa Planeta.

“Parcimônia”

Adepta do equilíbrio entre oráculos reais e virtuais, a administradora Marina Mesquisa, 56 anos, usa os buscadores como ponto de partida para conhecer assuntos mais profundamente. “Esses dias, queria saber sobre os olmecas (povo que habitou o México há 3,2 mil anos). Busquei no Google dicas de livros e de fontes que tratavam disso”, conta Marina. A administradora também recorre à web para pesquisar preços de produtos, propriedades de plantas e emprego de locuções. A parte de gramática, contudo, é delicada. “Uso com muita parcimônia, só quando o verbete não existe no dicionário”, diz. Recentemente, Marina precisou procurar a expressão “viralise”, neologismo da comunicação viral, que se espalha pela web tal qual um vírus.
Usuário mais fanático da ferramenta de busca, o analista de investimentos José Fausto Moreira, 25 anos, consulta o “superoráculo”, pelo menos, 10 vezes ao dia. “Uso como dicionário, para procurar notícias, letras de músicas e até para chegar a sites que já conheço”, relata. Outra prática nada recomendável do rapaz é procurar no Google a causa de sintomas físicos. “Se tenho alguma dor, procuro na internet o que ela pode significar. É como um pré-atendimento: muitas vezes, nem chego a ir ao médico.”
Não há nenhuma pesquisa científica que fale sobre os prejuízos de recorrer sempre ao sabe-tudo virtual. “O problema é quando a pessoa acredita em tudo o que lê na rede. Quando alguém usa sistematicamente uma ferramenta como base para a orientação da sua vida, é bom ficar atento”, alerta o psicólogo Cristiano Nabuco, coordenador do núcleo de dependência de internet do Hospital das Clínicas de São Paulo. Além de confiar em informações imprecisas, o usuário pode prejudicar a própria saúde se acreditar unicamente nos conselhos do doutor Google.

REDE INTELIGENTE

A web semântica é uma nova área de estudos da computação que pretende aprimorar o funcionamento da internet. Uma das maneiras de se fazer isso é com pesquisas sobre linguagem natural. Por exemplo: para saber o resultado do último jogo do Flamengo, não basta digitar no Google “qual foi o resultado do jogo do Flamengo?”. É preciso dar outras pistas — como o nome do time adversário, o dia da partida, etc. A ideia é acabar com esse jeito artificial de fazer perguntas.


Grandes dilemas
O buscador Ask Jeeves (www.ask.com) listou as dúvidas mais complexas dos internautas:

» Qual é o sentido da vida?
» Deus existe?
» As loiras se divertem mais?
» Qual é a melhor forma de emagrecer?
» Tem alguém aí (no espaço)?
» Quem é a pessoa mais famosa do mundo?
» O que é o amor?
» Qual é o segredo da felicidade?
» Tony Soprano morreu? (personagem da série The Sopranos, do canal HBO)
» Por quanto tempo eu vou viver?
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Reportagem por Carolina Vicentin
Fonte: Correio Braziliense online, 29/09/2010

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