Gláucio Ary Dillon Soares*
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Agora foi a vez de as Nações Unidas descobrirem o drama das quedas. É difícil acreditar, mas morrem 424 mil pessoas por ano devido a quedas no mundo. E no ano seguinte morrerão mais ainda, nos aproximando da faixa de meio milhão. Meio milhão! São mortes demais! E são evitáveis. Depois da morte nas ruas e estradas, as quedas são a forma de “acidentes” que mais mata, entra ano, sai ano.
E a prevenção? Seus bons efeitos se fazem sentir, assim como os efeitos nefastos da sua ausência ou da prevenção malfeita. Os países de baixa renda – que tendem a ser os de mais baixa cultura política e cultura cívica – são os que têm taxas mais altas. São países mal administrados. Não fazem, nem sabem fazer, programas de prevenção de quedas. Mais de 340 mil pessoas morrem nesses países, 80% do total. A combinação entre uma cultura cívica e política pouco desenvolvida, uma dieta pobre em vitamina D e falta de atividade física e exercícios é fatal.
As mortes só contam parte da história, pois o número de quedas é muito maior. Mais de 37 milhões todos os anos. Os problemas crescem muito na idade avançada, mas os jovens adultos e as crianças também contribuem com fatia considerável. Os que caem e se ferem representam custo alto para os países (e, evidentemente, para eles pessoalmente e as famílias). Onde tomam conta dos acidentados com cuidados adequados, o custo para o estado é altíssimo: cada idoso (65 anos ou mais) que cai e se machuca custa muito.
A opção que se coloca diante dos governos pobres é horrível: gastar pouco, como nós fazemos, e deixar que os acidentados, que são sobretudo idosos, permaneçam sem tratamento (ou com remendo de tratamento) e morram, ou gastar dinheiro sério, muito dinheiro, com eles. Uma organização chamada FIPS (Fall, Injury Prevention for Seniors) informa que, há uma década, houve mais de 320 mil hospitalizações somente com fraturas de bacia derivadas de quedas somente nos Estados Unidos. Quanto custa isso? Doze bilhões e meio de dólares, ou 37 mil dólares por fratura.
Não há orçamento público que aguente gastos repetitivos dessa magnitude. Talvez o maior problema seja que muitas fraturas associadas com quedas acarretam permanências muito longas nos caríssimos hospitais especializados. Saindo dos Estados Unidos, onde a medicina é absurdamente cara e contraditória, vemos que o custo por queda suficientemente séria (que leva a vítima ao hospital) é de US$ 3.611 na Austrália e de US$1.049 na Finlândia.
E a prevenção dá certo? Há dados de vários países mostrando que dá. No Canadá, medidas inteligentes dirigidas para crianças produziram redução de 20% no número de quedas de crianças com menos de 10 anos de idade, que representaram economia de US$120 milhões por ano. Quanto é isso? O que compram US$ 120 milhões? Pouco mais de 3 milhões de bolsas família e um ano de bolsa família para mais de 250 mil famílias. Tudo isso pago com as economias feitas com a prevenção de quedas de crianças no Canadá.
As hospitalizações por motivo de quedas custam, realmente, muito caro e são mais altíssimas com idosos devido à lenta recuperação que, muitas vezes, não é completa. Um estudo de americanos com 72 anos e mais mostra que um ferimento devido a uma queda custa, na média, mais de 19 mil dólares, exclusive o pagamento do médico, um dos itens mais caros.
As quedas são muito comuns entre os idosos e as consequências são pesadas. Mais uma pesquisa americana: 20% a 30% dos idosos que caem sofrem ferimentos sérios ou graves, desde hematomas até fraturas da bacia e traumatismo craniano. Evidentemente, as quedas não são problema individual: seu número, suas consequências e os seus custos as transformam em problema de saúde pública, ainda relegado ao segundo ou terceiro plano no Brasil e outros países.
Devemos ter uma preocupação especial com as fraturas da bacia. Estudo realizado na University of Maryland School of Medicine demonstrou que 29% dos idosos que fraturam a bacia morrem durante os 12 meses seguintes. Trata-se de percentagem altíssima – mais alta do que a do derrame. Devido ao número, é problema que vai além da saúde pública e entra, também, no campo da segurança pública. O envelhecimento da população no Brasil exige que desenvolvamos políticas públicas inteligentes para lidar com questão dessa magnitude.
___________________________________* Sociólogo, é pesquisador da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj)
Fonte: Correio Braziliense online, 23/09/2010
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