sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Educar e inovar

Ben Sangari*

 
Soa no mínimo alvissareira a notícia de que o Brasil prepara uma política de Estado para a área de ciência e tecnologia. Já passava da hora. O país vem demonstrando fôlego incomum na economia, que cresce a despeito das crises internacionais. Esse crescimento, porém, para ser durável, depende de investimentos maciços em áreas estratégicas, como a educação, a ciência e a tecnologia. São elas que garantem a estabilidade do país em longo prazo, como, aliás, comprovam-no os investimentos nesses setores no passado e que permitem os avanços de hoje. Uma verdadeira política de Estado, porém, pode representar um passo ainda maior, talvez mesmo um salto para o Brasil.
Na 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, realizada em Brasília em maio, sob os auspícios do Ministério da Ciência e Tecnologia, a pauta principal era justamente a busca de consensos entre governo, empresariado, universidades, centros de pesquisa, sociedade civil organizada e cidadãos em geral para a construção, o mais democrática possível, de uma política de Estado para a ciência e a tecnologia. O resultado dos debates será um documento- síntese, mediante processo interativo com as entidades participantes. Uma vez concretizada, essa política poderá representar a implementação e a manutenção de programas que transcendam interesses políticos momentâneos. Ainda que sob coordenação do Poder Executivo, ela deverá ter participação de toda a sociedade. Ao menos foi essa a proposta da conferência, que mobilizou mais de 3 mil participantes, das mais diversas áreas.
Os desafios, obviamente, são muitos. Um deles é a inovação tecnológica para aumentar a competitividade e alavancar o desenvolvimento do país, uma das bandeiras do setor industrial nos últimos anos. O próprio ministro da Ciência e Tecnologia admitiu, recentemente, que o Brasil ainda enfrenta dificuldades para avançar nesse aspecto, entre outros fatores porque apresenta limitações de ordem histórica e cultural, uma vez que a própria ciência é recente no país. Segundo ele, o Brasil começou a formar doutores há cerca de 40 anos. Se a ciência é nova nas universidades, é ainda mais nova nas empresas. Dados do IBGE indicam que, das 500 mil indústrias em atividade no país, somente 3 mil dedicam-se regularmente à pesquisa e ao desenvolvimento.
Para se ter ideia do que isso representa em termos práticos, na última década, a China multiplicou por 10 seu número de registros no sistema internacional de patentes. O gigante asiático ostenta mais de 5% do volume mundial e ocupa o 5º lugar no ranking. A Coreia do Sul, por sua vez, ostenta crescimento de 1,5 mil registros em 2000 para 8 mil em 2009, 5,17% do total global. O Brasil, ainda que tenha quase dobrado seu número de patentes internacionais (de 270 em 2005 para 480 no ano passado), representa somente 0,32% das patentes do mundo. Sozinha, a empresa Panasonic registrou, em 2009, cinco vezes mais patentes que todo o Brasil.
Segundo relatório da escola mundial de negócios Insead, realizado em parceria com a Confederação da Indústria Indiana, que classificou 132 países em termos de inovação, o Brasil ocupa a 68ª posição. Quando comparado aos vizinhos latino-americanos, sobe para a sétima, mas ainda perde para Chile, Costa Rica e Uruguai.
Vencer esses desafios é uma tarefa para a qual o Brasil demonstra estar preparado. Há fartura de diagnósticos, massa crítica em diversos setores, ideias, propostas e, o mais importante, vontade política. Resta, agora, partir para a ação. Uma política de Estado para a ciência e a tecnologia chega em boa hora e demonstra a sintonia do governo e da sociedade brasileira em geral com as demandas mais prementes da era do conhecimento, na qual o Brasil vai gradualmente ingressando.
A iniciativa de uma política estatal, porém, precisa efetivamente sair do papel. Um bom começo está no envolvimento direto da área educacional, especialmente do ensino básico, onde tudo começa. Investir recursos humanos e financeiros nesse campo nunca é demais, se o objetivo final é um crescimento durável. Os cientistas do futuro, que moldarão o Brasil dos próximos séculos, estão entrando na escola hoje. Entre outras ações relevantes, o investimento em educação pode ser o mais promissor.
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* Físico, é presidente da Sangari Brasil e do Instituto Sangari
Fonte: Correio Braziliense online, 17/09/2010

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