sábado, 18 de setembro de 2010

Sem aviso

Foto da Internet
Curiosa a tarde . Caminhando, entro num sebo e
deparo - me com um livro de Clarice Lispector 
que não conhecia : crônicas para jovens.
Comprei por menos de dez reais .
Enquanto aguardava o ônibus,
no sábado o transporte coletivo é mais lento,
li várias das crônicas. Agora, digito uma crônica curta,
para os leitores do blog.
O Título: sem aviso .
Clarice Lispector *

Tanta coisa que eu não sabia. Nunca tinham me falado, por exemplo, deste sol das três horas. Também não me tinham  avisado sobre este ritmo tão seco de viver, desta marteladaa de poeira . Que doeria, tinham-me vagamente avisado. Mas o que vem para a minha esperança do horizonte, ao chegar perto se revela abrindo asas de águia sobre mim, isso eu não sabia. Não sabia o que é ser sombreada por grandes asas abertas e ameaçadoras, um agudo bico de águia inclinado sobre mim e rindo. E quando nos álbuns de adolescentes eu respondia com orgulho que não acreditava no amor, era então que eu mais amava; isso eu tive que saber sozinha. Também não sabia no que dá mentir. Comecei a mentir por precaução, e ninguém me avisou do perigo de ser tão precavida; porque depois nunca mais a mentira decolou de mim. E tanto menti que comecei a mentir até a minha própria mentira. E isso - já atordoada eu sentia - isso era dizer a verdade. Até que decaí tanto que a mentira eu dizia crua, simples, curta: eu dizia a verdade bruta.
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*Clarice Lispector, nascida Haia Lispector (Chechelnyk, 10 de dezembro de 1920 - Rio de Janeiro, 9 de dezembro de 1977) Foi Uma escritora brasileira, nascida nd Ucrania.
Fonte: LISPECTOR, Clarice. Crônicas Parágrafo Jovens : de amor e amizade. Org . Pedro Karp Vasquez. Rocco , RJ, 2010, pg.67/68 .

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