MARION MINERBO*
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Eleitores do reality show escolhem
quem vai representá-los
no panteão da fama rápida
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O RECORDE de votação registrado na edição de 2010 do "BBB" revela a popularidade crescente do programa. Certamente ele atende a certas demandas da população.
A mais óbvia é o consumo ávido das imagens do longo e trabalhoso processo de "gestação" da celebridade, bem como do instante preciso em que ela vem ao mundo.
Por que o fascínio pela celebridade? Empoderada pela mídia, a celebridade pode ser protagonista de sua própria história, o que é muito difícil para o cidadão comum.
O termo empoderar é do educador Paulo Freire. Tem a ver com a capacidade de pessoas e grupos assumirem a responsabilidade pelo próprio destino, em lugar de esperar que alguém o faça por eles. O "BBB" empodera o cidadão comum. A votação maciça mostra que as pessoas estão ávidas para ser protagonistas da história.
"Talvez a descrença nos políticos
explique por que o Brasil seja
o recordista mundial em
participação no "BBB".
O programa empodera pessoas que não acreditam nas instituições políticas nem que a participação democrática altera seu destino.
Mas que acreditam que seu voto pode mudar a vida de alguém que os representa, e que, por tabela, é a sua. O "retorno" do voto é imediato.
O vencedor chega anônimo e sai com capital social, além do dinheiro, que o torna apto a construir o próprio destino.
Dentro do mais puro espírito democrático, os eleitores do "BBB" têm o direito -e fazem questão de exercê-lo- de decidir quem vai representá-los no panteão da fama rápida, valor máximo na sociedade do espetáculo. Quem merece gozar das benesses do sistema no lugar deles.
Quem vai realizar coisas que não estão ao seu alcance.
Por isso acompanham o "BBB" com notável espírito crítico. Li num site uma conversa entre fãs do "BBB10" que discutiam quem deveria sair e quem deveria vencer o jogo: "Quem deve sair é a Lia.
Achei ela muito autoritária.
Quem deve ficar é o Dourado.
Espero que ele ganhe, porque está se comportando como um "gentleman".
Pena que o cidadão comum não se sinta tão empoderado por nossas instituições políticas para o exercício da cidadania, como idealizou Paulo Freire ao criar o termo. E que tamanha energia seja canalizada para essa paródia de democracia.
Talvez a descrença nos políticos explique por que o Brasil seja o recordista mundial em participação no "BBB". O público se empenha para não eleger um picareta. O finalista tem de ser um lutador que não sacrificou sua ética para vencer no jogo, assim como o povo não a sacrifica para vencer na vida.
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* MARION MINERBO, psicanalista da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, é autora de "Neurose e Não-Neurose" (Casa do Psicólogo)
Fonte: folha online, 01/02/2011
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