quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Crônica da morte reversível

Carlos Brickmann
Imagem da Internet

Conta-se que Mark Twain, um dos grandes escritores americanos, convocou uma entrevista logo depois que um grande jornal informou que ele havia morrido. Seu comentário: "Parece-me que as notícias sobre a minha morte são manifestamente exageradas".
É uma de suas frases mais difundidas. E o motivo é o mesmo: falha humana. Ou a notícia é mal interpretada ou o repórter não tem a menor idéia de com quem está falando. Certa vez, uma agência noticiosa, por engano, liberou o obituário do papa Paulo 6º, bem antes de sua morte. Um excelente apresentador de uma emissora de rádio de grande audiência recebeu o telegrama e interrompeu o programa para anunciar o falecimento. Corrigido pouco depois, lançou sua frase imortal: "Lamentamos informar que o papa ainda não morreu".
O mais grave, entretanto, é o erro por desconhecimento. Excetuando-se emergências, é razoável esperar que o repórter saiba com quem conversa. Uma vez, uma jornalista entrevistou o diretor Jayme Monjardim, filho de Maysa, uma das maiores cantoras do país. Ele se referiu à mãe, a repórter perguntou quem era, ele disse que era Maysa, ela perguntou quem era. Finalmente, coroando sua obra, pediu a ele que lhe desse o telefone de Maysa, porque gostaria de entrevistá-la. Teria sido uma iniciativa louvável, se Maysa não tivesse morrido num acidente de automóvel mais de dez anos antes.
A história se repete: numa entrevista com o ator Lúcio Mauro Filho, a repórter se referiu a seu pai, Lúcio Mauro, como se estivesse morto. Como no caso de Mark Twain, as notícias sobre a morte de Lúcio Mauro eram manifestamente exageradas. Pior foi a justificativa: o texto que a repórter lia, explicou, a induzia a erro. Ou seja, ela também não tinha a menor idéia do que estava tratando.
Os economistas banalizaram a expressão "lição de casa" e a transformaram num chavão. Mas há casos em que a lição de casa tem de ser feita: quando se vai entrevistar alguém, por exemplo. Matar os vivos é crime, ressuscitar os mortos é milagre. E jornalismo, embora seja às vezes um crime ou um milagre, a rigor não tem nada a ver com isso.
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Fonte: http://www.observatoriodaimprensa.com.br 15/02/2011

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